MP vai recorrer a instâncias superiores para buscar reverter decisão que anulou julgamento do Caso Kiss

Com o desfecho desta quarta-feira, Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo de Jesus do Santos e Luciano Bonilha Leão poderão esperar, em liberdade, por um novo julgamento

Foto: Fabiano do Amaral/Correio do Povo

O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) vai recorrer da decisão, tomada pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que decidiu, nesta quarta-feira, anular o júri que considerou Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo de Jesus do Santos e Luciano Bonilha Leão culpados pela tragédia da Boate Kiss, que matou 242 pessoas e feriu mais de 630, em Santa Maria, em janeiro de 2013.

O subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais do MPRS, Júlio César de Melo, lamentou a decisão, e classificou o desfecho desta tarde como um duro golpe para as famílias das vítimas. Ainda conforme o subprocurador, o órgão analisa se vai recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF).

“Nós temos as instâncias superiores, estamos analisando ainda quais os melhores recursos à disposição. Nós estamos saindo agora da sessão de julgamento destes recursos (apresentados pelas defesas dos quatro réus) e a partir disso vamos nos reunir e analisar, confiantes de que vamos reverter. E esse é o trabalho que o Ministério Público tem feito ao longo deste nove anos, o de buscar a justiça. E se nós temos de buscá-la nos tribunais superiores, assim o faremos”, ressaltou.

Para a promotora Lucia Helena Callegari, que atuou no julgamento realizado em dezembro do ano passado, a decisão da 1ª Câmara Criminal do TJRS causou surpresas e “buscou mais a forma do que a validade dos atos” que integraram o julgamento.

Já o presidente da Associação das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss, Gabriel Rovadoschi, disse que as famílias se sentem desumanizadas pelo resultado. “A nossa humanidade foi profundamente ferida pela decisão. Não falo pelo mérito do julgamento, pelos critérios que foram tomados, mas de um sentimento nosso, de uma completa desumanização porque enquanto os condenados gozam de vida ao longo destes nove anos que se passaram, tanto eu, quanto os outros, tivemos que lidar com a vida sem um fechamento de sentido para isso. Uma vida sem este fechamento de sentido é viver na angústia (…) Temos que inventar uma vida que faça sentido, pois o jurídico, até agora, não conseguiu nos dar uma resposta digna”, lamentou.

Sessão

Por dois votos a um, a 1ª Câmara Criminal do TJRS decidiu anular o julgamento do processo que apurou as responsabilidades do Caso Kiss. Enquanto o presidente da sessão e relator, desembargador Manuel Martinez Lucas, desclassificou as nulidades apresentadas pelas defesas, os desembargadores José Conrado Kurtz (revisor) e Jayme Weingartner Neto entenderam pela anulação do processo. A nulidade mais destacada nos votos da dupla envolveu a formação do Conselho de Sentença.

Em coletiva de imprensa, realizada após a decisão, o 2º vice-presidente e presidente do Conselho de Comunicação Social do TJRS, desembargador Antônio Vinicius Amaro da Silveira, enalteceu a qualidade técnica dos votos proferidos.

“O que demonstra que a Corte enfrentou a questão. O resultado é inusitado, já que cada um tem o seu entendimento sobre o tema e isso será levado adiante, quiçá por novos recursos”, destacou. Amaro da Silveira também ressaltou que não houve erros no julgamento realizado em dezembro do ano passado, mas divergências de conceitos jurídicos.

Nesta quarta-feira, foram julgados exclusivamente os recursos apresentados pelas defesas de Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo de Jesus do Santos e Luciano Bonilha Leão. Os advogado identificaram nulidades no processo criminal e no júri popular. Além da anulação do julgamento, as defesas pediam a revisão das penas aplicadas aos réus, que foram sentenciados entre 22 anos e meio e 18 anos de reclusão em regime fechado.
Com a decisão, os réus, presos desde o final de 2022, poderão aguardar em liberdade.