Medições recentes revelam que a cheia extrema que atingiu Porto Alegre em maio de 2024 foi intensificada por represamento em uma parte ‘estrangulada’ entre os rios Jacuí e Guaíba, próximo à Usina do Gasômetro. É a conclusão da pesquisa interdisciplinar conduzida por cientistas da UFRGS no âmbito do Programa de Gestão Portuária do Porto de Porto Alegre. A equipe é formada por especialistas em sensoriamento remoto, hidráulica e geociências integrantes de uma interação acadêmica entre a Universidade e a Portos RS, autoridade portuária do estado.
Com o uso de dados de campo e imagens do satélite franco-americano SWOT, os pesquisadores conseguiram medir níveis de inundação mais altos na Zona Norte da cidade, identificando o fator que contribuiu para o agravamento da situação naquela região. Felipe Geremia Nievinski, professor do Departamento de Geodésia do Instituto de Geociências (IGEO), orientou a pesquisa e indica a principal descoberta: a cheia extrema inclinou a superfície da água, causando um desnível de quase 3 metros entre a região do aeroporto e a extremidade sul da capital. Foi exatamente na Zona Norte que os diques falharam, onde os níveis de água eram alguns metros mais altos do que o observado em outras regiões da cidade.
Desse modo, a pior enchente já enfrentada pela cidade de Porto Alegre teve danos intensos apesar das medidas de controle implementadas desde a última grande cheia, em 1941. “A altimetria via satélite revelou que no rio Jacuí a inundação foi agravada pelo represamento em uma parte estrangulada. Já o Guaíba, mais largo, apresentou menores níveis de água”, explica o autor principal do trabalho, Leonard Silveira, egresso do Centro de Sensoriamento Remoto e Meteorologia (CEPSRM) da UFRGS e hoje professor na Universidade Federal do Pampa. A inclinação da superfície d’água foi o parâmetro que aumentou mais drasticamente, “de cerca de meio centímetro por quilômetro (0,4 cm/km) para 15 cm/km”. Os mapas de elevação da água, feitos a partir de satélites, foram validados com levantamentos hidrográficos e três estações de medição do nível d’água espalhadas pelo município, ambos usando satélites GPS/GNSS.
Segundo os pesquisadores do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) e coautores do estudo, Eduardo Puhl e Rafael Manica, “os resultados indicam que o controle de enchentes poderia ser melhorado na Região Norte da cidade, considerando que os diques foram projetados em sua maioria com uma cota de coroamento constante (igual a 6 m), enquanto o nível da água observado variou bastante entre norte e sul da cidade”. O estudo também mostrou os impactos e as reações dos acontecimentos e que as técnicas de sensoriamento remoto se mostraram valiosas para medir o nível e a inclinação da água.