Mercado reage com cautela ao projeto do arcabouço fiscal entregue pelo governo

O nome do relator da proposta no Congresso Nacional deverá ser anunciado nesta quarta-feira.

Foto: José Cruz/Agência Brasil

O mercado financeiro brasileiro se dividiu na avaliação do texto do arcabouço fiscal, com muitos analistas colocando cautela como a palavra que melhor representa o cenário pós apresentação no Congresso Nacional. Se houve quem considerasse um alívio o teor das medidas elaboradas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que chega para substituir o Teto de Gastos, outros ficaram apáticos com os detalhes da âncora fiscal ao considerarem que não houve muita mudança.

Na avaliação mediana, o projeto continua muito vago e não interessa às principais preocupações do mercado, o que deverá resultar em uma receptividade neutra em relação ao projeto. A preocupação se manteve no foco dado para as receitas e não nos gastos, onde as avaliações são de que não há nenhum tipo de propostas que mostre o compromisso fiscal. As reações dos indicadores econômicos ao longo desta quarta-feira, 19, serão determinantes para a aceitação das medidas.

O texto do novo arcabouço fiscal que substituirá o teto de gastos foi entregue nesta terça-feira, 18, ao Congresso Nacional, depois de quase três semanas de sua apresentação. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que o debate do projeto será feito com transparência e que espera votar o texto no plenário até 10 de maio. O nome do relator da matéria, disse, deverá ser anunciado nesta quarta-feira.

MUDANÇAS

O projeto de lei complementar terá ajustes, que esclarecem pontos não divulgados no fim de março. A principal mudança diz respeito às arrecadações extraordinárias, que não serão consideradas no cálculo do limite de crescimento real (acima da inflação) de 70% das receitas, limitado a um intervalo entre 0,6% e 2,5% acima da inflação. A inclusão pela equipe econômica foi feita para evitar que receitas atípicas não corram o risco de se tornarem gastos permanentes. As receitas a serem excluídas do cálculo são as seguintes: privatizações, concessões, permissões, royalties (exploração de recursos naturais) e dividendos das estatais.

Outra mudança no conteúdo se refere aos tipos de gastos que podem ficar de fora da nova regra fiscal. Além de excluir do arcabouço o piso da enfermagem e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), ficarão fora do limite de crescimento de gastos os acordos de precatórios (dívidas com sentença definitiva da Justiça) a serem pagos com desconto, os gastos relativos às eleições e os aumentos de capital da União a empresas estatais não financeiras e não dependentes do Tesouro Nacional.

INVESTIMENTOS

Em relação aos investimentos (obras públicas e compra de equipamentos), o governo incluiu uma trava. De 2025 a 2028, caso o governo economize mais que a banda superior da meta de superávit primário estabelecida pelo arcabouço, até R$ 25 bilhões poderão ser remanejados a investimentos. A proposta original apresentada no fim de março previa que toda a sobra poderia ser destinada a investimentos.

Isto porque o objetivo é acelerar a redução da dívida pública em momentos de elevado crescimento da economia. Esse valor de R$ 25 bilhões será corrigido ano a ano pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O piso de R$ 75 bilhões para investimentos, também corrigido anualmente pelo IPCA, está mantido.

Em relação à proposta original, também houve mudança no período do índice de inflação que corrigirá o crescimento das despesas. Ficou mantido o sistema vigente no atual teto de gastos, que considera o IPCA apurado de janeiro a junho e uma estimativa de julho a dezembro. Isso dará ao governo uma pequena vantagem em 2024, caso o IPCA caia até meados de 2023 e volte a subir antes do fim do ano.

Em relação ao crescimento das receitas, no entanto, o novo arcabouço considerará a inflação entre julho de dois anos antes e junho do ano anterior. Essa é a mesma regra que vigorou até 2021 no teto de gastos, que limitava o crescimento do gasto federal à inflação. O intervalo foi alterado com a Emenda Constitucional dos Precatórios.

INFLAÇÃO

O novo arcabouço fiscal limitará o crescimento real (acima da inflação) das despesas a 70% do crescimento real das receitas líquidas (descontadas as transferências para estados e municípios) no acumulado em 12 meses.

Outra mudança no arcabouço diz respeito à inclusão dos parâmetros da nova regra fiscal em projeto de lei complementar, que necessita de aprovação por maioria absoluta no Congresso. Originalmente, a proposta era enviar as novas regras por projeto de lei complementar e os parâmetros por projeto de lei ordinária, que requer maioria simples no Congresso (metade mais um dos parlamentares presentes).

Para os próximos quatro anos, no entanto, os parâmetros também serão enviados por meio de projeto de lei complementar. A equipe econômica deu a possibilidade de que o próximo governo estabeleça os parâmetros por projeto de lei simples. Segundo o Ministério da Fazenda, a mudança teve como objetivo demonstrar maior rigor com o cumprimento do novo arcabouço e dificultar mudanças pelo Congresso.