Caso Kiss: primeiro dia de julgamento é marcado pelo depoimento de duas sobreviventes da tragédia

Em ambos os relatos, vítimas destacaram que estrutura da boate dificultou a saída das pessoas do local

Foto: Ricardo Giusti/CP

O primeiro dia do julgamento sobre o incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, que vitimou 242 pessoas e deixou feridas outras 636 foi marcado pelos depoimentos de duas sobreviventes. Nesta quarta-feira, foram ouvidas pelo Júri Kátia Siqueira e Kellen Leite Ferreira.

A primeira a depor foi Kátia, que na noite do incêndio estava trabalhando na casa noturna, uma vez que ela prestava serviços quando solicitada. Em depoimento emocionante, com duração de quase cinco horas, ela disse que era comum o uso de artefatos e que a boate só tinha uma saída, mas estava bloqueada por barras metálicas. Ela também destacou que não haviam extintores no local, tampouco bombeiros, quando o fogo começou.

Ainda durante sua fala, Kátia, que teve 40% do seu corpo queimado e acordou 21 dias após o incêndio em um hospital de Porto Alegre, destacou que parte da iluminação da boate caiu e o público gritava “fogo e briga” e que não tinha recebido qualquer tipo de treinamento contra incêndio.

O depoimento da primeira vítima foi encerrado pelo juiz Orlando Faccini Neto, que antes precisou advertir os advogados de defesa para fazerem perguntas pertinentes à testemunha, por volta das 19h15 e determinou um intervalo até às 20h.

Na retomada, foi a vez de Kellen Leite Ferreira iniciar sua fala ao Júri. Na época com 19 anos de idade, ela relembrou que a fila para entrada na boate era grande e não tinha movimento de pessoas saindo da festa. A vítima também reafirmou ser corriqueira a superlotação na casa noturna.

Em relato emocionante, Kellen ao responder um questionamento do juiz Faccini. disse que a última vez que correu na vida foi para tentar se salvar – uma vez que o sinistro fez com que ela perdesse um pé e tivesse 18% do corpo queimado. Por conta das sequelas, ela ficou 78 dias internada no Hospital de Clínicas, em Porto Alegre, e teve que realizar inúmeras cirurgias.

No dia do incêndio, Kellen lembrou que estava na festa com um grupo de sete amigos, sendo que três acabaram perdendo a vida. Durante o relato, a vítima também revelou que nenhum dos quatro réus (Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos  e Luciano Bonilha Leão) sequer enviou uma mensagem com um pedido de desculpas. Na sequência, ela complementou ao mencionar que teve que ingressar na Justiça e esperar três anos para conseguir uma prótese para poder andar.

Após quase duas horas sendo escutada, o juiz Orlando Faccini concedeu mais um intervalo, desta vez curto, de aproximadamente dez minutos. Quando a sessão foi retomada, foi a vez dos advogados de defesa dos quatro réus questionarem a vítima. No entanto, nenhum deles quis fazer perguntas e o primeiro dia de júri do caso Kiss se encerrou às 22h10min.

A retomada do julgamento – o maior da história do Rio Grande do Sul e que tem previsão inicial de quinze dias de duração – está marcada para as 9h desta quinta.

Pela manhã, a programação de oitivas seguem com duas vítimas: Emanuel Almeida Pastl e Jéssica Montardo Rosado. Já no primeiro horário da tarde, em função de uma concordância entre todas as partes, será a vez da primeira testemunha de acusação Miguel Ângelo Teixeira Pedroso, que foi arrolado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul.

Após, seguem os depoimentos previstos de mais três sobreviventes: Lucas Cauduro Peranzoni, Érico Paulus Garcia e Gustavo Cauduro Cadore

Julgamento

Ao todo, serão ouvidas 14 sobreviventes, 19 testemunhas (cinco testemunhas de acusação arroladas pelo MP, cinco testemunhas arroladas pela defesa de Elissandro Spohr, cinco testemunhas arroladas pela defesa de Mauro Londero Hoffmann e quatro testemunhas arroladas pela defesa de Marcelo de Jesus dos Santos). Entre elas o promotor Ricardo Lozza e o ex-prefeito de SM, Cezar Schirmer, além dos quatro réus.

Passado os depoimentos das testemunhas e réus, começam os debates. Na ocasião, acusação e defesas terão oportunidade de apresentarem suas teses e argumentos aos jurados. O tempo total dessa fase do julgamento será de 9 horas, assim distribuídas: 2 horas e meia para MP/Assistente de Acusação (dividem o tempo), 2 horas e meia para as defesas dos réus (dividem o tempo – resultará em 37’ 5’’ minutos para cada), 2 horas de réplica para o MP/Assistente de Acusação (dividem o tempo) e 2 horas de tréplica (dividem o tempo – 30 minutos para cada defesa).

Júri

O conselho de sentença foi escolhido na manhã desta quarta. Dos sete jurados sorteados que vão decidir o futuro dos réus, três não participaram de nenhum júri na vida.