Os deputados estaduais que faziam parte da Comissão de Representação Externa da Assembleia Legislativa que acompanhou as investigações sobre o incêndio na Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP) rejeitaram, nesta sexta-feira, o relatório final elaborado pela deputada Luciana Genro (Psol). Durante a reunião, votaram contra o parecer os deputados Clair Kuhn (MDB), Dirceu Franciscon (PTB) e Frederico Antunes (PP).
No entendimento dos parlamentares, faltaram elementos técnicos para determinar o que provocou o sinistro na noite de 14 de julho, visto que a perícia ainda não entregou o laudo e, por consequência, os órgãos técnicos não concluíram as respectivas investigações. O deputado Jefferson Fernandes (PT), que também fazia parte da comissão, não participou da reunião.
Durante o período de trabalho, a comissão ouviu o comandante-geral do Corpo de Bombeiros, coronel Eduardo Bonfanti, o sub-chefe de Polícia, Fábio Motta Lopes, o delegado responsável pelas investigações, Daniel Ordahi, além de técnicos ligados a entidades e as viúvas dos bombeiros que perderam a vida no incêndio.
Relatório
Conforme o documento de Luciana Genro, que também presidia o grupo de trabalho, as chamas se iniciaram em razão de uma falha elétrica, e se propagaram devido à deficiência no sistema de primeira resposta ao fogo do prédio. Ainda segundo o relatório, os extintores não foram suficientes para deter o incêndio. A deputada apontou, na sequência, o fato de o sistema hidráulico da edificação estar desativado e a não existência de um plano de contingência para incêndios desse porte. Morreram na tragédia o tenente Deroci de Almeida da Costa e o sargento Lucio Ubirajara de Freitas Munhós, que faziam o combate ao fogo.
Durante a sessão da comissão, nesta sexta, a deputada destacou que o grupo não buscou determinar as causas, “já que esse é um trabalho das autoridades investigativas e não do parlamento”, mas compilar as possíveis causas baseadas em indícios mais sólidos, a partir de três cenários (lista abaixo). Ainda de acordo com a deputada, os colegas que rejeitaram o relatório não fizeram uma análise profunda e agiram motivados por questões políticas, com intuito de defender o governo.
O relatório apontou, ainda, que o prejuízo provocado pelo incêndio é incalculável, citando que o prédio era sede do Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), inaugurado 10 dias antes da Copa do Mundo do Brasil em dois dos 11 pavimentos do edifício. O complexo custou, à época, R$ 75 milhões.
O documento era dividido em cinco capítulos, distribuídos em 79 páginas, que continham 43 recomendações aos órgãos públicos tratando sobre a prevenção de incêndios e tragédias semelhantes. Dentre as indicações, Luciana Genro defendia a volta de exigência de prazo por lei para cumprimento da Lei Kiss e a aquisição de viaturas com escadas para combate a incêndios em prédios altos e equipamentos de geolocalização individual aos bombeiros militares.
Possíveis causas do incêndio, de acordo com o relatório da deputada Luciana Genro (Psol)
1. Em havendo falha elétrica, e se não for comprovada a sua origem externa (como oscilação na rede elétrica, descarga atmosférica ou sabotagem), presume-se que ela adveio ou da falta de manutenção adequada ou de falha no projeto do sistema elétrico. Ambas as situações, de origem interna, envolvem deveres de cuidado que cabem ao administrador do prédio.
2. A deficiência no sistema de primeira resposta, por sua vez, está ancorada no próprio desenrolar dos fatos. Dado o resultado final, está claro que o sistema não foi capaz de vencer o princípio de incêndio. É provável que isso tenha ocorrido, pois o padrão de primeira resposta para um edifício como o da SSP envolve a instalação de sistema hidráulico de ativação automática, os conhecidos sprinklers. Na construção do PPCI, no entanto, o sistema foi descartado, em uma decisão que não foi devidamente fundamentada, sob a alegação genérica de incompatibilidade estrutural.
3. A desativação dos sistema hidráulico de emergência foi, possivelmente, o erro final e definitivo que selou o desfecho. O sistema consistia em duas colunas hidráulicas cortando o edifício de cima a baixo. Durante um combate de incêndio, os profissionais poderiam usar tais colunas para conectar as mangueiras a uma rede pressurizada com saída em cada pavimento. O sistema, no entanto, estava desativado, e os bombeiros, que não foram notificados sobre isso, passaram a parte mais importante do combate tentando, sem sucesso, utilizá-lo.
Investigações
Após ouvir mais de 30 testemunhas, a Polícia Civil segue no aguardo do laudo do Instituto-Geral de Perícias (IGP) para concluir as investigações. De acordo com o delegado Daniel Ordahi, os depoimentos afastaram qualquer possibilidade de ação criminosa contra a edificação, mas indicaram uma falha elétrica que acabou gerando um curto circuito em uma sala no quarto andar do prédio.
Além das testemunhas, a Polícia Civil coletou dados e documentos, entre eles o Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI) do prédio.
Em paralelo à apuração da polícia, a SSP instaurou uma sindicância para levantar danos, prejuízos, causas, e a possibilidade de uma eventual infração administrativa relacionada ao incêndio. A estimativa é de que o trabalho, iniciado no dia 23 de julho seja concluído até o dia 23 de setembro. Contudo, sem a conclusão da perícia criminal, a tendência é de que o processo seja prorrogado – o que já ocorreu no mês passado, pelo mesmo motivo.