Utilizado no RS, nitrato de amônio é risco para o campo e transporte

Armazenamento irregular de nitrato de amônio é apontado como causa da explosão que matou dezenas no porto de Beirute, no Líbano

Terminal de Porto Alegre já recebeu 18 mil toneladas de nitrato de amônio em 2020 | Foto: Itamar Aguiar/Palácio Piratini
Terminal de Porto Alegre já recebeu 18 mil toneladas de nitrato de amônio em 2020 | Foto: Itamar Aguiar/Palácio Piratini

O composto químico apontado como causa da explosão no porto de Beirute, no Líbano, é bastante utilizado no Brasil. O nitrato de amônio é base de fertilizantes, explosivos e gases anestésicos. A produção se concentra em duas fábricas de Cubatão, no litoral de São Paulo. Além disso, o país importa o dobro da produção nacional para suprir a demanda.

No Rio Grande do Sul, o nitrato de amônio circula pelos portos de Rio Grande e Porto Alegre. A carga, normalmente, vem da Estônia. Apenas neste ano, a Capital já recebeu 18 mil toneladas do produto, que é descarregado e pesado para, em seguida, rumar de caminhão para uma indústria misturadora em Canoas. O diretor de Portos Interiores da Superintendência dos Portos, Bruno Almeida, garante que não há armazenagem do composto nos terminais gaúchos. “Esse produto não fica armazenado nos postos. Tem um controle pelo Exército Brasileiro”, pontua.

Nitrato de amônio no campo

O nitrato de amônio é aproveitado como fertilizante no campo. As vantagens na produção e no custo ocultam o risco de armazenamento inadequado da carga. O consultor da Academia Brasileira para Prevenção de Explosões (ABPEx) Haroldo Martins Júnior (foto) alerta para o perigo em propriedades rurais. “Pode ter uma lavoura aí no interior do Rio Grande do Sul, um agricultor que está plantando, que está usando nitrato de amônio. Sem ter ideia do que é o nitrato, ele está usando. Eles chamam de nitrato de amônio de grau fertilizante”, expôs. “Mas esse aí não tem perigo? Tem, tem igualzinho. O mesmo nitrato de amônio que é usado como fertilizantes, com pequenas diferenças, é usado como matéria-prima para explosivos”, completou Martins Júnior.

Haroldo Martins Júnior explica que houve uma flexibilização nas regras de uso do composto no governo de Jair Bolsonaro. “O Exército sabe o que o nitrato de amônio pode fazer”, sustentou. “Eles aliviaram muito a norma com relação aos grandes consumidores, que são o agronegócio. Isso foi uma coisa que decepcionou demais a gente e deixou o risco maior ainda”, lamentou o consultor da ABPEx.

Riscos no transporte

Nitrato de amônio é transportado no RS e utilizado na lavoura | Foto: Divulgação/Firsthuman
Foto: Divulgação/Firsthuman

O consultor especialista em prevenção de explosões lista algumas regras para evitar tragédias como a de Beirute. São, ao todo, dez normas. Mas três delas são consideradas as mais importantes por Haroldo Martins Júnior: não contaminar, não superaquecer e não confinar a carga de nitrato de amônio. “O que aconteceu ontem no porto de Beirute foi, justamente, o desrespeito dessas regras aí”, detalhou o representante da ABPEx.

Sobre os riscos no transporte, Haroldo Martins Júnior lembra que portos e caminhões devem obedecer as políticas de prevenção. “Via de regra, o porto é um centro de passagem. E aí só transfere o risco. Tira do porto e bota nas carretas, não muda muita coisa”, destacou.

O diretor de Portos Interiores do Rio Grande do Sul, Bruno Almeida, reforça a mensagem de tranquilidade para a comunidade de Porto Alegre. “[As cargas] Não ficam armazenadas, em nenhum momento, nos armazéns ao lado da avenida Castelo Branco. Não teríamos um perigo conforme as imagens que correram o mundo”, observou.

Tragédias como a de Beirute não são inéditas. Já houve ocorrências semelhantes nos Estados Unidos, na China e na França. Em 2013, a explosão de um armazém fez com que a fumaça tóxica do nitrato de amônio tomasse a cidade de São Francisco do Sul em Santa Catarina.