A audiência pública sobre o Plano Diretor de Porto Alegre, realizada neste sábado, 9, no Auditório Araújo Vianna, contemplou, no período da tarde, debates acalorados sobre temas centrais para o futuro da cidade. Entre os pontos em destaque, estiveram os planos locais específicos para bairros como Lomba do Pinheiro e Restinga, além da zona rural do município. Também ganhou espaço o debate sobre a ligação da zona Sul por meio da requalificação da ERS 118 — obra vista como estratégica para a mobilidade e o desenvolvimento, mas que, segundo participantes, precisa ganhar prioridade. A resiliência climática foi outro tema recorrente.
Cobranças se concentraram na inclusão, no texto final do plano, de previsões para estruturas públicas de saúde, educação e segurança, bem como em soluções para evitar o surgimento de ilhas de calor e tornar a Capital mais permeável, reduzindo riscos de alagamentos. Houve ainda apelos para que o documento contemple medidas de prevenção contra cheias.
O prefeito Sebastião Melo não participou dos debates do período da tarde, e sua ausência foi alvo de críticas de participantes, que cobraram sua presença para ouvir as demandas diretamente.
A diretora de Planejamento Urbano da Prefeitura, Patricia Tschoepke, respondeu a questionamentos sobre regularização fundiária em áreas do Extremo Sul e da zona Norte. “A gente vai garantir não só a regularização cartorial, mas fazer as melhorias no entorno e também possibilitar que as casas que estejam ali possam receber melhorias”, afirmou.
Já a coordenadora de Planejamento Urbano do município, Vaneska Paiva Henrique, comentou sobre o prolongamento da ERS-118: “É uma questão que a gente vem estudando. Os colegas me alertaram que existe uma série de questões ambientais que também precisam ser analisadas para que isso possa ocorrer.”
Entre os cidadãos que se manifestaram, o arquiteto Francisco Maraschin Zancan defendeu a aprovação do texto apresentado e alertou para o esvaziamento do Centro Histórico. “Cada vez mais a gente expulsa as pessoas que tentam fazer a sua vida nesta cidade, e ao mesmo tempo, ela cresce pros lados. O que Porto Alegre tem hoje são bairros desintegrados nas áreas centrais; o nosso centro histórico está sumindo”, disse.
Na visão do presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Heverton Luiz Lacerda, o plano “não está pronto para ser votado” e carece de atualização após as enchentes de 2024. Ele também cobrou a divulgação de dados técnicos que sustentem os novos parâmetros de altura e adensamento.
“O adensamento reduz áreas verdes e espaços de convivência, reduz qualidade de vida e interação social”, afirmou.
O momento mais tenso do dia ocorreu quando Maximiliano José Limbacher, do Coletivo Preserva Redenção, protestou por ter a fala interrompida por manifestações da plateia. Ele acusou o secretário de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade, Germano Bremm, que conduzia os trabalhos, de desrespeito. “Vocês (governo) têm todo o tempo pra falar e tiram a nossa fala. Isso provoca a judicialização do Plano Diretor”, disse.
Bremm respondeu que as vaias eram mútuas e “faziam parte do processo democrático”.
MPRS aponta falhas
Um estudo técnico do Ministério Público do Rio Grande do Sul aponta falhas na proposta do novo Plano Diretor. O documento cita ausência de dados que fundamentem as alterações no uso do solo, lacunas sobre impactos ambientais e deficiências em medidas de prevenção a desastres climáticos — pontos que, segundo o órgão, precisam ser corrigidos antes do envio do projeto à Câmara Municipal.
Próximos passos
Após a audiência pública realizada neste sábado no Auditório Araújo Vianna, o Plano Diretor seguirá para análise técnica e incorporação das sugestões recebidas durante as discussões. Essa etapa é fundamental para adequar o projeto às demandas da população e corrigir eventuais falhas apontadas por órgãos como o Ministério Público.
Em seguida, o texto revisado será enviado para a Câmara Municipal de Porto Alegre, onde passará por uma série de discussões e votações nas comissões temáticas e, por fim, em plenário. Durante esse processo legislativo, vereadores poderão propor emendas ao documento, e novos debates públicos podem ser convocados.
A expectativa é que o Plano Diretor atualizado seja aprovado até o final do ano, respeitando o cronograma legal para garantir a modernização das políticas urbanas e o desenvolvimento sustentável da cidade. A participação popular permanece aberta durante todas as fases, consolidando a transparência e a democracia no processo.
O que é o Plano Diretor
O Plano Diretor é o principal instrumento de planejamento urbano de Porto Alegre. Previsto no Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001), ele estabelece diretrizes para o uso e ocupação do solo, definindo regras para o crescimento da cidade, a preservação ambiental, a mobilidade, a habitação e a oferta de serviços públicos.
A cada dez anos, o documento deve passar por revisão, com participação popular em audiências públicas e consultas. A proposta em discussão atualmente define parâmetros para o adensamento populacional, altura das construções, preservação de áreas verdes, zoneamento e estratégias de desenvolvimento econômico e social.
O objetivo é orientar políticas públicas e investimentos de forma integrada, equilibrando expansão urbana, qualidade de vida e sustentabilidade. Após a fase de debates e ajustes, o texto final é enviado à Câmara Municipal, onde precisa ser aprovado para entrar em vigor.
Fonte: Cristiano Abreu/Correio do Povo