
Os ministros da 1ª Turma do STF refutaram, nesta quinta-feira (11), as proposições apresentadas pelo ministro Luiz Fux em seu voto de mais de 12 horas, proferido na quarta-feira (10).
As críticas não ficaram restritas à ministra Cármen Lúcia, que iniciou sua fala ironizando a extensão do voto escrito de Fux: 396 páginas. “Escrevi 396 páginas, mas não vou ler, não se preocupem”, afirmou.
A ministra prosseguiu com um breve histórico da democracia brasileira, ressaltando os desafios enfrentados ao longo do período. “Não foram apenas de rosas esses anos. Tivemos dois impeachments de presidentes da República, estudantes foram às ruas, caminhoneiros foram às ruas.”
Comentários de colegas
Em um momento de descontração, o ministro Flávio Dino pediu autorização para fazer observações, o que foi concedido por Cármen. “Todos! Desde que rápido. Nós mulheres ficamos caladas, temos o direito de falar”, respondeu a ministra em tom bem-humorado. “Está no regimento”, completou.
A cena chamou atenção porque Fux havia afirmado, na terça-feira (9), que não concederia apartes aos colegas durante sua manifestação.
Rapidez no julgamento
Cármen Lúcia também respondeu, ainda que de forma indireta, às críticas de Fux sobre a celeridade do processo.
“Muito se fala: ‘foi rápido demais esse julgamento’. (…) Algo de tamanha gravidade, que atinge o coração da República, precisava de prioridade. Por isso os julgamentos estão acontecendo. Não dá para comparar o mundo de agora com o de antes”, disse.
A ministra reforçou que, dois anos e oito meses após os fatos, a ação penal chega a julgamento dentro dos prazos legais, em cumprimento ao papel constitucional da Corte.
“A democracia brasileira não se abalou. Os prédios foram reconstruídos. A hora é de julgamento. O Estado Democrático brasileiro se aperfeiçoa, porque o Brasil é um país, e somente com a democracia um país vale a pena”, declarou.
Mensalão
Cármen Lúcia também destacou as diferenças entre este julgamento e o do Mensalão, citado por Fux. “Um processo com 39 réus… o alongamento do prazo era esse mesmo. Não dá para ficar comparando com o que era antes”, afirmou.
Voto eletrônico
Outro momento de descontração ocorreu quando a ministra voltou a comentar sobre seu voto escrito. Ela ressaltou que levou o documento impresso, mas não o leria integralmente. Dino então a interrompeu, em tom de brincadeira: “Mas o voto é eletrônico no Brasil.”
Julgamento no STF
Na análise das preliminares, Cármen confirmou a competência do Supremo para julgar o caso, em sentido contrário ao entendimento de Fux, que defendeu a nulidade do processo. “Sempre entendi que a competência é do Supremo Tribunal Federal. Não há nada de novo pra mim.”
A ministra classificou como “casuísmo gravíssimo” a possibilidade de mudança de competência, o que poderia levar alguns réus a serem julgados em instâncias diferentes.
Alexandre de Moraes
Outro ministro que se contrapôs ao voto de Fux foi o relator, Alexandre de Moraes. No início de sua fala, ele reafirmou que o 8 de Janeiro “não foi um passeio no parque”.
“Não foi um domingo no parque, um passeio na Disney. Não foi combustão espontânea, não foram baderneiros descoordenados. Foi uma organização criminosa e, obviamente, se nós pegarmos um fato isolado – a reunião dos kids pretos –, ‘eles não podem se reunir’? A questão é o desencadeamento de tudo.”
Exibição de vídeo
Como havia feito na apresentação do relatório, Moraes exibiu nos telões do plenário um vídeo do ex-presidente Jair Bolsonaro, gravado durante manifestação na Avenida Paulista (SP), em que ele pede o arquivamento das ações e a saída do ministro da Corte.
“Se isso não é grave ameaça…”, indagou Moraes.
Ele reforçou que as decisões do STF valem para todos os tribunais e, consequentemente, para todos os magistrados. “Algum de nós permitiria, falaria que é liberdade de expressão, se o prefeito insuflar o povo contra o juiz da comarca? Qual recado queremos deixar para o Poder Judiciário brasileiro?”
“Cid presidente”
Enquanto eram exibidas imagens dos atos antidemocráticos, Moraes ironizou, destacando que o papel central era de Jair Bolsonaro.
“Aqui não está Mauro Cid, presidente. Não está Braga Netto, não está Garnier, presidente. Não está Ramagem. Aqui não estão os demais réus. Aqui está o líder da organização criminosa, que insuflava.”
Outra imagem exibida mostrou a destruição de um relógio histórico por um dos vândalos, que vestia uma camisa com a estampa de Bolsonaro. Em seguida, Moraes voltou a brincar com Cármen: “Obrigado e prometo que não falo mais nada.”
Flávio Dino
Dino também fez comentários durante o voto do ministro Cristiano Zanin, presidente da Turma e último a apresentar suas considerações.
Citanto uma conversa particular entre os colegas de colegiado, Dino utilizou a metáfora do “boi fatiado”:
“A falácia segundo a qual você divide o boi em bifes e pergunta a cada pedaço: ‘você é um boi?’. Pede para um bife mugir, e ele nada. A conclusão, falseada, é que nunca existiu um boi”, questionou.
Fonte: R7