
Fenômeno de inclusão financeira, de redução de custos e, agora, centro das atenções das grandes empresas de cartão de crédito, o Pix está sob ameaça caso seja aprovada a PEC nº 65/2023, vulgo “PEC da Autonomia do Banco Central”. “Ninguém parece ter notado que a forma escolhida, pessoa jurídica de direito privado, faz com que se perca qualquer referência sobre a natureza jurídica do BC”, observa Edna Velho, presidente da seção regional de Brasília, do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (SINAL).
Isso porque a proposta altera a natureza jurídica da hoje autarquia para uma pessoa jurídica de direito privado, sob a justificativa de lhe angariar mais recursos e conceder maior liberdade aos dirigentes em geri-los. Não há, na PEC, dispositivo prevendo, por exemplo, que nas contratações para atividades-meio, o BC atenderá à legislação atinente às contratações por empresas públicas. “Abrem-se flancos para soluções não muito republicanas”, alerta a dirigente sindical.
O Pix foi criado pelos servidores do BC, dentro da esfera da Administração Pública. Constitui uma ferramenta pública, cujos resultados o mercado privado não consegue alcançar, afinal, nenhuma empresa privada investiria em serviço gratuito. Hoje, já é realidade a terceirização de atividades-meio no serviço público, mas ainda há alguns limites impostos pelo direito administrativo: não se pode terceirizar, por exemplo, o poder de polícia, nem a política monetária.
Livre de tais amarras jurídicas, o BC poderia, em teoria, terceirizar atividades-fim, ou a assessoria na tomada de decisões. Além disso, o direito privado tornaria bem mais flexível o estabelecimento de parcerias com o mercado privado, cujo objetivo é a obtenção de lucro.
A PEC 65 prevê que os servidores do BC, atualmente no RJU, passem para o regime CLT. Edna entende que “o que deveria preocupar o cidadão e o contribuinte é que, como entidade de direito privado, os cargos do BC não teriam mais as mesmas garantias constitucionais do serviço público estatutário. E essa garantia é particularmente valiosa no Brasil, onde abusos são comuns”. Especificamente sobre o Pix, Edna questiona: “Quem garante que não ficará a cargo de indicado pelo próprio mercado financeiro?”.
Desta forma, aponta Edna, as emendas para “blindar” o Pix, prometidas pelo relator, Senador Plínio Valério, são ineficazes. Os próprios pontos nevrálgicos da PEC 65 mergulham o Pix em um cenário de risco, de modo que o presidente do BC, Gabriel Galípolo, se mostra incoerente ao afirmar, em evento voltado ao setor de criptoativos semana passada, que a manutenção da administração pública do Pix é importante para impedir conflitos de interesses e, ao mesmo tempo, defender a aprovação da PEC.