
Com o impacto do tarifaço promovido pelos Estados Unidos contra o calçado brasileiro desde agosto, a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) refez as projeções de crescimento do setor para 2025 e 2026. A projeção de produção para 2025, que era estimado entre 1,4% e 2,2% no início do ano, passou para uma faixa entre -1,1% e +1,4%. Já para 2026, a projeção aponta para um intervalo entre -0,5% e +2,1%. Com as estimativas, a indústria calçadista deve produzir entre 919,2 milhões e 942,5 milhões de pares no ano corrente e entre 914,6 milhões e 962,3 milhões de pares em 2026.
Mesmo que ainda registre números positivos, a economia nacional vem desaquecendo nos últimos três meses. Segundo doutor em Economia e consultor setorial Marcos Lélis, em maio, o crescimento acumulado do PIB era de 4%, sendo que no último registro, em agosto, esse incremento passou para 3,27%. Conforme projeção do FMI, para este ano, o PIB brasileiro deve crescer 2,2%. Já, para 2026, o incremento deve ser menor, de 1,8%. O que vem segurando a economia brasileira ao longo de 2025, principalmente no primeiro semestre, é o mercado interno.
Com uma taxa de desemprego de 5,6% (IBGE) e o crescimento da renda real média (R$ 3.380), o mercado doméstico segue consumindo, mesmo que em menores volumes. O que limita o incremento maior do consumo doméstico, segundo Lélis, é o endividamento das famílias, hoje em 78,8%. Ainda, conforme o Banco Central, 27,6% da renda do brasileiro é consumida por dívidas, sendo quase 10% da renda comprometida para pagamentos de juros. Para diminuir o endividamento, segundo o economista, é preciso abrir espaços para a redução dos juros, hoje em 13,89% (de longo prazo), o que, acredita, deve acontecer a partir de 2026.
Com uma produção que caiu 2,3% no período de janeiro a agosto, no comparativo com o mesmo período do ano passado, a atividade se vê sem um impulso do mercado doméstico e dificuldades nas exportações, prejudicadas pelo tarifaço aplicado pelos Estados Unidos; a crise de reservas na Argentina; e a concorrência do calçado chinês em mercados cativos para o produto brasileiro. Para o terceiro trimestre, a economista e coordenadora de Inteligência de Mercado da Abicalçados, Priscila Linck projeta um decréscimo de 4% na produção. Para o último trimestre de 2025, o setor deve ter um crescimento de 2,7%. Com isso, o ano deve encerrar com estabilidade em relação a 2024, com crescimento de 0,2% (mediana entre as bandas pessimista e negativa). Com a estimativa, a atividade deve produzir pouco mais de 930 milhões de pares em 2025.
EXPORTAÇÕES
Em setembro, as exportações de calçados, em volume, cresceram 18% em relação ao mesmo mês de 2024. Com uma queda significativa dos embarques para os Estados Unidos, de 23,5%, foram destaques no mês nove destinos como Paraguai (+109%), Colômbia (+107%) e Peru (+97%). O preço médio do calçado exportado em setembro caiu 11,5%, o que é explicado pela alteração de pauta dos produtos embarcados, em detrimento dos produtos de couro. Já no acumulado de 2025, entre janeiro e setembro, no comparativo com o mesmo período do ano passado, as exportações, em volume, cresceram 7%, com estabilidade na receita gerada.
Assim como a produção, o tarifaço dos Estados Unidos acabou culminando em uma revisão das projeções para exportações em 2025 e 2026. Conforme a Abicalçados, para 2025 a estimativa, que era de uma banda de crescimento entre 1,2% e 4,1% no início do ano, ficou entre 0,2% e 3,1% na última projeção. Já para 2026, caso mantido o tarifaço dos Estados Unidos, os efeitos devem ser maiores, refletindo o cancelamento de pedidos dos últimos meses. A projeção da entidade é de que no próximo ano as exportações brasileiras caiam entre 9,8% e 16,3%. “Ou seja, o crescimento projetado para 2026 está muito mais ancorado na dinâmica do consumo interno do que nas exportações”, explica Priscila.
Com a queda nas exportações esperadas para o próximo ano, é projetado que 91% do calçado produzido no Brasil fique no mercado doméstico e apenas 9% seja exportado em 2026, pior coeficiente de exportação da série histórica, iniciada em 1998.