
Em 15 de julho de 2025, o Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR) abriu uma investigação abrangente contra o Brasil ao amparo da Seção 301 do Trade Act de 1974. O inquérito cobre seis frentes simultâneas e ficará aberto a comentários públicos até 18 de agosto, com audiência marcada para 3 de setembro em Washington. A investigação é mais um capítulo do que se tornou o segundo mandato de Donald Trump à frente da Casa Branca: a mistura de temas comerciais com outros objetivos geopolíticos, políticos e econômicos dos EUA.
Vai desde moldar o governo brasileiro – seja quem for o governante – a agir de acordo com os interesses de Washington – como a liberdade irrestrita para os negócios das Big Techs – até a uma retomada da Doutrina Monroe – sob a roupagem do século XXI – de “América para os americanos”.
Em outras palavras, a retirada de qualquer aliança de países da América Latina com a China ou outro país que reivindique, no cenário global, ao menos mudanças pontuais no sistema de governança global – mesmo que a demanda seja mais participação de poder decisório, como reivindica os BRICS, não uma afronta contra a liderança dos EUA. Aos latinos-americanos, somente seriam permitidos realizar comércio, em dólar, com países de outras regiões do planeta.
No caso da investigação anunciada pelo USTR, chamou a atenção, sem mencioná-lo, o PIX como um dos tópicos abordados, o serviço de pagamento eletrônico criado e desenvolvido pelo Banco Central do Brasil. A alegação do USTR é que o PIX, juntamente com os recentes entendimentos jurídicos sobre a regulamentação do uso e responsabilidades das plataformas de redes sociais no Brasil, pode prejudicar a competitividade de empresas americanas” que atuam nos setores de comércio digital e pagamentos eletrônicos “por exemplo, retaliando-as por não censurarem o discurso político ou restringindo sua capacidade de fornecer serviços no país”.
INTERESSES GLOBAIS
A imprensa especula que a mistura dos temas “PIX” e “Big Techs” estejam nos múltiplos interesses que as grandes empresas de tecnologia têm globalmente. Não apenas em redes sociais, mas criar um universo de serviços que vão desde publicidade até serviços bancários e de pagamentos,. Quantos de nós deixamos de passar no débito e saca o celular do bolso para pagar via PIX?
Além disso, esta parte da investigação é uma defesa dos interesses das empresas de bandeiras de cartão de crédito, que nos últimos anos têm desenvolvidos novos métodos de pagamentos com o uso de blockchain, a infraestrutura das criptomoedas. E um sistema de pagamento instantâneo como o PIX, que busca a internacionalização, também seria uma ameaça ao desenvolvimento de negócios de empresas desse segmento.
Neste caso, é importante sempre ter em mente uma das imagens da posse de Trump em janeiro deste ano: a maior parte dos bilionários donos e comandantes dessas empresas estavam presentes, muitos deles declarando apoio a Trump durante a campanha eleitoral e remodelando diretrizes de funcionamento de acordo com a plataforma do presidente então recém-eleito.
E Trump vai utilizar as tarifas como forma de persuasão para que o ambiente irrestrito das redes sociais continue vigorando, como foi em seus primórdios. O Brasil não foi o primeiro a sofrer essas consequências: Trump ameaçou há algumas semanas elevar as tarifas de importações do Canadá devido a uma lei de taxação sobre as Big Techs, prontamente retirada pelo governo canadense para que as tarifas não entrassem em vigor.
Resta saber se o Brasil vai recuar dos recentes entendimentos jurídicos sobre as redes sociais e de paralisar o desenvolvimento do PIX, permitindo a entrada de players americanos. O que não será fácil, já que as negociações com os EUA são responsabilidade do Poder Executivo, as ordens judiciais são do Judiciário e o PIX é um programa de Estado desenvolvido pelo Banco Central do Brasil – além de, no caso do PIX, ter uma ampla aceitação popular.