Simers relata cenário de superlotação em emergências de Porto Alegre

O Hospital São Lucas da PUCRS operava, nesta manhã, com o triplo da capacidade, enquanto outras instituições de saúde, o dobro. Cinco grupos do Sindicato vistoriaram mais de 10 emergências, de hospitais e PAs, nesta sexta-feira

Foto: Ricardo Giusti / Correio do Povo

As emergências de hospitais e pronto atendimentos de Porto Alegre seguem em estado crítico por conta da superlotação. De acordo com o dashboard da taxa de ocupação da prefeitura em hospitais de alta e média complexidade, a emergência de adultos do Hospital São Lucas da PUCRS registrava na manhã desta sexta-feira, 23, 380% de ocupação, com 38 leitos ocupados e apenas 10 operacionais. A Santa Casa e o Clínicas registravam o dobro da capacidade, enquanto o Conceição operava com 41% acima, com ocupação de 72 leitos e 51 operacionais. Entre os pronto atendimentos, a unidade Moacyr Scliar, nesta manhã, operava mais de três vezes acima da capacidade, com 329% de ocupação. A Bom Jesus registrou taxa de ocupação de 254%. A Lomba do Pinheiro, lotação de 167%, e a Cruzeiro do Sul, 119%.

Diante de um cenário de crise por conta das superlotações e do decreto de emergência em saúde emitido pela prefeitura e Governo do Estado, o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) realizou nesta sexta-feira, dia 23, vistorias a emergências para verificar as condições de trabalho das equipes médicas e o cenário de atendimento à população. Ainda, apurar a falta de medicamentos, equipamentos médicos, produtos descartáveis como seringa e cateteres, falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), como máscaras, luvas, aventais, além de avaliação das questões segurança e de situações de violência.

“O que podemos falar nesse primeiro momento é que a gente nota um cenário de superlotação. Estamos produzindo um relatório, elaboramos todas as evidências que encontramos aqui e mais tarde serão disponibilizadas”, afirmou o vice-presidente da entidade e coordenador da ação, Felipe Vasconcelos, após realizar visita na unidade de pronto atendimento Cruzeiro do Sul, que atende à zona Sul de Porto Alegre. Houve uma conversa com o vice-presidente com médicos e gestores das unidades e, após, vistoria nas emergências adulto e pediátrica.

Entre pontos específicos que chamou a atenção, o vice-presidente destacou a presença de alguns pacientes que precisavam de leitos em UTI, mas estão na emergência. Ainda, foram registradas ausências de alguns medicamentos apontados por médicos do local. Vasconcelos não registrou ausência de EPIs no local. Após o encerramento das vistorias, o Simers produzirá um relatório do que foi encontrado para envio à prefeitura de Porto Alegre e ao governo do Estado, pedindo providências.

A situação observada pela reportagem também demonstra o atual cenário de saúde pública no local. Logo na entrada do PA da Cruzeiro do Sul, era possível perceber a presença de pelo menos três pombos, que voavam pelo espaço e despejavam dejetos. Na unidade Bom Jesus, em um dos corredores, foram contabilizados pelo menos 10 leitos com crianças e idosos, com acompanhantes, em condições críticas de saúde. Havia, também, pacientes almoçando no local.

Pacientes relatam demora nos atendimentos

Diego Rafael Andrades Pereira, morador do bairro Bom Jesus, acompanhou sua esposa, Dina Marques, que está com pedra na vesícula para atendimento na unidade do bairro. Nesta manhã, o casal chegou às 7h, e Dina foi atendida apenas quatro horas depois. Ele relata que, nos outros dias, ela costumava ficar entre 6h e 8h aguardando atendimento. “É sempre lotado”, diz Diego, que trabalha com construção civil e perdeu um dia de serviço por conta da situação. Para ele, “falta melhorar no atendimento” na unidade.

Um outro paciente, que apresentava sintomas de gripe e está impossibilitado de trabalhar por conta do seu estado de saúde, perguntou à recepcionista da unidade quando seria atendido, e recebeu apenas a resposta de que “já iriam chamar”. “É só o que eles falam. Tem que aguardar pela boa vontade deles. Quando tu vai lá, olha os médicos e estão todos no telefone. E o pessoal sofrendo aqui”, relata Diego.

Em coletiva de imprensa, o vice-presidente afirmou que essa é uma das maiores vistorias já realizadas pelo Sindicato para avaliar as condições de trabalho e de atendimento à população. Ele acrescentou que as vistorias devem seguir para preservar a saúde da população a pela defesa dos médicos. “Vamos fazer apontamentos do que foi encontrado e solicitar para os gestores que sejam resolvidos esses apontamentos”, diz.

Na vistoria realizada pelo Simers, cinco grupos técnicos se direcionaram às unidades, cada um composto por um diretor e assessores político e jurídico. Dos hospitais, foram vistoriados o Conceição, Cristo Redentor, Santa Casa, HPS, Clínicas, Vila Nova, São Lucas da PUC e Ernesto Dornelles. Dos pronto atendimentos, foram contemplados na visita a Moacyr Scliar, Lomba do Pinheiro, Cruzeiro do Sul e Bom Jesus, além da Unidade de Saúde Restinga.

Associação Médica reforça cenário crítico

O presidente da Associação Médica do Rio Grande do Sul (AMRIGS), Gerson Junqueira Jr, salientou a gravidade do cenário de saúde pública no estado e a necessidade de recursos junto ao Ministério da Saúde para contratação de profissionais, aquisição de insumos e a reorganização da rede hospitalar para lidar com a crise.

“O Rio Grande do Sul enfrenta, neste momento, um cenário crítico na saúde pública. As emergências, tanto na rede pública quanto na privada, estão superlotadas, com ocupações que ultrapassam os 300% em algumas unidades. A situação revela uma pressão insustentável sobre o sistema de saúde, especialmente diante do aumento expressivo de internações por síndromes respiratórias agudas graves (SRAG)”, diz.

Ele também destaca como “fator agravante” a baixa cobertura vacinal. “Até 15 de maio, apenas 28,5% dos grupos prioritários – como crianças, gestantes e idosos – haviam se vacinado contra a gripe no RS. Esse índice está muito abaixo da meta de 90% estabelecida pelas autoridades de saúde. A vacinação é fundamental, protege o indivíduo e contribui para frear a circulação de vírus, aliviando a pressão sobre os hospitais”, diz a nota.

A reportagem entrou em contato com a Secretaria Municipal da Saúde e aguarda posicionamento sobre a situação de superlotação.