No início dos anos 1970, jovens da cidade de Tapes, a 100 km de Porto Alegre, formaram um grupo musical para participar da 1ª Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana. Era o auge da ditadura militar e a produção cultural do país fervilhava com novas perspectivas do que significava a arte brasileira. Ao desafiar o formalismo do inédito festival – e um regulamento cheio de brechas – com uma espécie de opereta com mais de 20 minutos, nascia ali Os Tápes, conjunto que iria renovar a música feita no estado e que, ao longo dos anos, realizou uma série de feitos a nível regional, nacional e até internacional – ao tocar com Gilberto Gil e Quinteto Violado na Europa.
O documentário “Canto da gente: um filme sobre Os Tápes” narra esta rica trajetória a partir de imagens de arquivo, entrevistas, gravações e marca a estreia do cineasta e escritor Matheus Borges (roteirista de “A colmeia”, de Gilson Vargas) no gênero documentário. A exibição do material acontece no dia 5 de julho (sábado), às 19h, na Câmara Municipal de Tapes (Rua Coronel Pacheco, 274). A entrada é franca com distribuição de senhas a partir das 18h.
O nome do documentário não é por acaso: Canto da gente, primeiro disco dos Tápes, completa 50 anos em 2025. Formado em 1971, o conjunto tornou-se figurinha carimbada em eventos organizados pelo movimento estudantil. Venceram a 2ª Califórnia da Canção Nativa com “Pedro Guará”, canção de José Cláudio Machado e Cláudio Garcia que posteriormente se tornou um clássico da música gaúcha. Com dois discos produzidos por Marcus Pereira, o mesmo que lançou Cartola e forjou o disco de estreia de Belchior (Mote e Glosa), integraram também pelo mesmo selo a coletânea Música Popular do Sul ao lado de artistas como Elis Regina e Noel Guarany, sendo assim elevados ao reconhecimento nacional.
“Sempre me encantou a ambiguidade do título, Canto da Gente. É o ato de cantar, mas também nossa posição do mundo, nosso canto. É uma afirmação da existência, a expressão própria como nosso lugar”, pontua o diretor Matheus Borges. “O filme é um documentário sobre o grupo, mas também o retrato de um lugar e de uma época. Também é um trabalho sobre a dificuldade de narrar essas histórias, sujeitas aos ciclos da cultura, de esquecimento e rememoração, algo que era central no trabalho dos Tápes, um grupo que se dedicou a recuperar diferentes formas artísticas em vias de apagamento. E agora, quarenta anos depois, eles é que são recuperados na forma desse documentário”, completa.
O grupo gravou ainda um terceiro álbum, pelo selo local Cantares, e excursionou pelo Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo e Goiás – e no exterior na Alemanha, Áustria e Argentina, no célebre Cosquín. As apresentações na Europa integraram o festival Horizonte 1979, ao lado de Gilberto Gil e Quinteto Violado.
Entre os personagens destacados no documentário, estão os integrantes Cláudio e Waldir Garcia, os irmãos Luiz Alberto e Rafael Koller, Acy Terres e Zezé Prestes. O material de arquivo, inédito para o público e em grande parte captado em 2006 pelos jornalistas Ana Júlia Tiellet, Ângelo Manjabosco e Maitê Mendonça para um trabalho do curso de jornalismo da Universidade de Ijuí, conta também com a participação do presidente das três primeiras edições da Califórnia, Henrique de Freitas Lima; e dos jornalistas Juarez Fonseca, Antonio Hohlfeldt e Danilo Ucha.
“Vimos uma ótima oportunidade de contar a trajetória dos Tápes referenciada no recente acervo digital que o grupo ganhou em 2023 [ostapesacervo.com.br] além de registros em vídeo e entrevistas, para acessar o recurso da Lei Paulo Gustavo e produzir esse filme. Mais do que recordar essa história para quem acompanhou a trajetória do grupo, buscamos contar seus feitos para as novas gerações de tapenses, acreditando também que esta produção terá alcance regional e nacional. Os Tápes de fato fizeram algo único e pioneiro que merece reconhecimento”, diz o presidente da Associação de Cultura e Desenvolvimento (ACORDE), Antônio Carlos Paganelli, realizadora do documentário.