Advogados que movimentaram R$ 50 milhões em fraudes contra aposentados são alvo de operação no RS

Advogados são suspeitos de participação em esquema que movimentou R$ 50 milhões | Foto: Polícia Civil / CP

Um grupo de 14 pessoas, sendo nove advogados, foi alvo da Polícia Civil nesta quinta-feira. Os suspeitos teriam fraudado procurações judiciais para contratar empréstimos em nome de clientes e lesar instituições financeiras. A ofensiva, batizada de Operação Malus Doctor, é da 2º DP de Porto Alegre.

De acordo com a apuração policial, o esquema movimentou R$ 50 milhões. A maior parte das vítimas são idosos e pessoas aposentadas que buscavam os advogados na esperança de renegociar juros de empréstimos junto a instituições financeiras.

As diligências somaram 35 mandados de busca e apreensão, que foram executados na Capital, em Glorinha, na Região Metropolitana, e em Xangri-lá, no Litoral Norte. Além disso, todos os investigados tiveram o exercício da advocacia suspenso.

Os crimes apurados são estelionato, falsidade ideológica, falsificação de documento particular, uso de documento falso, fraude processual, patrocínio infiel, apropriação indébita e associação criminosa.

Conforme o delegado Vinícius Nahan, titular da 2º DP, os suspeitos ajuizaram mais de 145 mil ações judiciais potencialmente fraudulentas, sendo 112 mil no Rio Grande do Sul e cerca de 30 mil em São Paulo.

O principal investigado, um advogado tido como líder do grupo, é apontado pelo delegado Nahan como responsável por aproximadamente 47% de todas as ações movidas contra instituições bancárias no Tribunal de Justiça do RS. Ele seria o quinto maior litigante da entidade.

Ainda de acordo com o titular da 2º DP, parte dos investigados representam um escritório e abordam pessoas em situação de vulnerabilidade com promessas de revisar judicialmente cobranças abusivas em empréstimos consignados. Eles cobram honorários de 30% sobre os valores “recuperados”.

Em posse de documentos dos clientes, o advogado tido como líder do esquema ajuizava ações revisionais contra instituições financeiras. Depois, os clientes recebiam valores em suas contas e, por acreditar que isso decorria das ações, acabaram repassando parte da quantia ao escritório do suspeito.

Acontece que os depósitos eram oriundos de novos empréstimos, contratados sem o consentimento dos titulares. “Quando percebiam os descontos indevidos em seus benefícios previdenciários, as vítimas constatavam a fraude, porém, já não conseguiam mais contato com a empresa”, explica o delegado Vinícius Nahan.

Ações judiciais em nome de mortos e fatiamento processual

Durante as investigações, a polícia identificou diversos casos que ilustram a sistemática fraudulenta adotada pelo grupo criminoso. Em um dos episódios, foi constatado o ajuizamento de ações judiciais sem o consentimento das pessoas em nome de quem os processos foram movidos.

Uma das vítimas, por exemplo, afirmou em juízo que desconhecia a existência de mais de 30 ações protocoladas em seu nome por um dos advogados investigados.

Outro caso revelou o ajuizamento de ações em nome de pessoas já falecidas. Em uma dessas situações, a procuração apresentada nos autos continha uma assinatura da suposta outorgante meses após a morte.

Houve ainda situações em que os valores obtidos por meio de alvarás judiciais, após o cumprimento de sentença, não foram repassados aos beneficiários. Em vez disso, os recursos foram depositados diretamente em contas vinculadas ao escritório do advogado responsável pelas ações, sem qualquer prestação de contas ou retorno financeiro às vítimas.

Também foi constatado o uso sistemático de estratégias processuais que visavam o chamado “fatiamento de demandas”. Ou seja, eram ajuizadas múltiplas ações envolvendo as mesmas partes, mas tratando de contratos distintos, com a distribuição dos processos por meio de vários advogados ou em comarcas distantes do local onde as vítimas moravam.

Em um dos exemplos analisados, o juízo responsável apontou que todos os pedidos poderiam ter sido reunidos em uma única demanda, e chegou a advertir que a fragmentação intencional dos processos tinha como objetivo principal a maximização de honorários advocatícios.