Um médico socorrista do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) foi preso preventivamente na tarde de terça-feira no bairro Igara, em Canoas, suspeito de ter introduzido medicamentos de uso hospitalar para matar a esposa, a enfermeira Patrícia Rosa dos Santos, de 41 anos.
O crime ocorreu no último dia 22 de outubro e teria sido praticado por Andre Lorscheitter Baptista, Ele foi preso por agentes do Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil de Canoas, na tarde de terça-feira (29), enquanto saía de carro do apartamento em que residia.
Conforme o delegado que conduz as investigações, Arthur Hermes Reguse, o médico teria administrado quatro comprimidos de Zolpidem – medicamento utilizado para dormir – em um pote de sorvete ingerido pela vítima. Na sequência, ele teria dado à esposa uma dose de Midazolam – para que ela não sentisse dor – e, por fim, teria aplicado o Succitrat – usado para sedar pacientes – para matar Patrícia.
Além da premeditação da morte pelo uso dos medicamentos enquanto a vítima estava desacordada, Baptista também tentou criar uma cena que não chamasse a atenção dos socorristas do Samu, acionados por ele, que constataram o óbito por infarto agudo. Para aplicação das substâncias intravenosas, ele utilizou um acesso na parte de cima do pé de Patrícia, para que, quando ela tivesse os braços examinados, não houvesse perfuração.
Depois de avisados da morte da enfermeira, que não possuía nenhum tipo de comorbidade ou histórico de problemas cardíacos, familiares procuraram a Polícia Civil e, somente então, o caso passou a ser investigado. “Na situação que ele montou, eles já estavam prestes a recolher o corpo e, inclusive, um veículo da funerária já estava no local. A solicitação de ajuda daquela família chegou em um momento final, para que a situação não se transformasse em um simples óbito”. Relata o delegado Reguse.
Ao procurar a polícia, os familiares teriam dito que o homem era “estranho” e afirmaram que ele havia matado ela. Ao ouvir a situação, o local foi isolado e uma equipe do DHPP enviada para investigar o caso, assim como o Instituto-Geral de Perícias (IGP).
A frieza e ausência de sentimentos de Baptista para lidar com a morte da mulher logo levantou suspeitas. Durante os depoimentos iniciais, diversas incongruências na versão do médico chamaram a atenção dos policiais. Câmeras de segurança do prédio flagraram o momento em que ele sai com uma mochila e a leva até o carro. Dentro dela estavam os medicamentos utilizados por ele, além de uma gaze com sangue.
Inicialmente, o médico afirmou que os recipientes haviam sido levados vazios por ele, para treinar outros profissionais iniciantes. Entretanto, ao ser questionado se era responsável por administrar treinamentos, afirmou que não, mas alegou que os médicos se ajudavam. Já sobre a gaze com sangue, disse que poderia ter pego por engano, por ser “desorganizado”.
Entretanto, laudos do IGP comprovaram através do exame de DNA que o sangue era de Patrícia. Além disso, os frascos que estavam na mochila tinham dosagens exatas para uma pessoa. “Ele disse que os frascos sobraram de vários atendimentos realizados na última semana. Imagina, uma ampola usada em um paciente, com um frasco usado em outro e uma gaze com sangue. Isso não é condizente com um profissional do Samu”, ressalta Raguse.
Outro ponto que chamou a atenção foi a confirmação de que ele não teria tentado salvar a esposa, enquanto ela sofria o infarto. “Ele não fez manobras cardiorrespiratórias. Ele é um médico emergencista, a mulher está sentindo uma parada cardíaca o que, em geral, gera dor e sofrimento, a pessoa sangra, e ele não fez nenhuma manobra”, explica o delegado.
Como uma das incongruências no depoimento, há também o fato de que o médico informou não saber onde estava o celular da mulher, sendo que, por estar no sofá, era provável que o aparelho estivesse por perto. Porém, através dos familiares, a polícia foi informada que a morte de Patrícia foi comunicada pelo marido, mas pelo próprio telefone dela.
Entre pontos que ainda precisam ser esclarecidos está a motivação do crime, que continua sendo investigado pela Polícia Civil, mesmo após a prisão do médico. Os medicamentos utilizados teriam sido subtraídos por ele do Samu.
O médico que atestou a morte também foi ouvido pela, mas inicialmente como testemunha. Conforme a polícia, ele alega que após a confirmação da suposta morte natural, atestou o infarto para agilizar processos como a cremação.
Médico já havia tentado obrigar a esposa a abortar
Em um relacionamento que durava alguns anos, Patrícia e o médico tiveram um filho, hoje com dois anos. Durante a gravidez da mulher, porém, por não querer o nascimento, Baptista também teria tentado induzir um aborto na mulher, de acordo com relatos de familiares à Polícia Civil.
“Ela teria sido dopada e, a partir de então, ele teria inserido um abocath (dispositivo com agulha para administrar medicamentos) no útero da mulher, com intuito de induzir o aborto. Mas isso não aconteceu e o filho nasceu”, explica o delegado Reguse.
A situação foi confirmada por um prontuário médico do atendimento realizado em Esteio. Questionado sobre a situação, o médico alega que a vítima sofreu um sangramento e que necessitou fazer uma lavagem nela, dopada, porém, por ser “desorganizado”, esqueceu o objeto na mulher.