Sebastião Melo promoverá reforma administrativa ainda em 2024

Prefeito reeleito contou os planos para próxima gestão em entrevista ao Correio do Povo

Foto: Camila Cunha / Correio do Povo

*Diego Nuñez e Flávia Simões

A população de Porto Alegre decidiu dar continuidade ao governo de Sebastião Melo (MDB). E, com 61,53% dos válidos, o prefeito foi reeleito com folga sobre a adversária, Maria do Rosário (PT). Agora, a nova gestão do emedebista terá desafios diferentes de quatro anos atrás. Com uma base menor na Câmara de Vereadores e um leque mais amplo de partidos a serem acomodados no governo, o prefeito também precisa lidar com a urgência de melhorar os números e imagem da Educação em Porto Alegre.

Em entrevista ao Correio do Povo, Melo contou quais serão os primeiros passos e as prioridades do novo governo. Confira:

  • Como deve funcionar o escritório de transição neste contexto de reeleição?

Pensei comigo mesmo na madrugada que antecedeu a eleição: se for reeleito, não quero acomodação, porque é a tendência de um segundo governo. Quero ouvir pessoas que não são do governo. Sou o primeiro a reconhecer que têm pendências na cidade que não foram resolvidas em quatro anos e que precisam ser enfrentadas. Esse escritório terá capacidade de enfrentar e avançar naquilo que melhoramos, chegar onde não chegamos e erradicar aquilo que não deu certo. Por exemplo, a questão dos moradores em situação de rua. A política que está aí não deu certo. Precisa mudar. Tem um sombreamento entre a FASC e a Secretaria de Desenvolvimento Social, uma reforma administrativa tem que enfrentar isso. Não adianta criar estrutura para jogar para a plateia. Para criar estrutura, tem que ter dinheiro para a política pública. Não vou estar fazendo muitas estruturas, mas, por exemplo, o turismo é um fator determinante do empreendedorismo. E esse escritório tem a capacidade de mostrar o desafio para frente.

  • Uma reforma administrativa com mudanças nas pastas pode ocorrer ainda este ano?

Provavelmente, sim. Tem que ser dentro desse ano ainda. Tem a questão do Dmae, que eu também vou avaliar se eu vou mandar esse ano.

  • Sua coligação iniciou com oito partidos e chegou a 11 no segundo turno. Como administrar tantas agremiações na composição do governo?

Só tem uma maneira: diálogo e construção. Ouvi-los (os partidos) atentamente, uma, duas, três, quatro vezes. As pessoas sempre respeitam a decisão quando elas fazem parte. O prefeito não pode levar um prato pronto para vereadores e partidos, tem que construir. Se me apresentarem quadros qualificados em todas as áreas do governo, a decisão está tomada.

Agora, nenhum partido tem um secretário da Fazenda, Meio Ambiente, ou de outra área. Não pode ser assim. Para assumir cargo, está aberto a todas as secretarias, não tem nenhuma vedação, mas tem que ter qualidade técnica para isso.

Não sou mais candidato à reeleição, meu mandato termina daqui a quatro anos, mas, com certeza, o projeto que está aí vai querer ter um candidato lá na frente. Para pensar em um terceiro mandato do mesmo projeto, tem que ter mais mudanças, mais transformações. Se não acertar o tom na montagem do governo, você desarranja a vida da cidade e o projeto vai embora.

  • Alguns aliados acabaram não eleitos. Eles devem figurar dentro do governo?

A experiência do Legislativo para vir para ser secretário é importante. Para um suplente que não chegou (a ser eleito), ou ele vem para o governo, ou alguém que é titular do cargo vem para o governo e ele assume a titularidade (na Câmara). Só tem esses dois caminhos. Tudo isso nós vamos discutir e ver o que os partidos apresentam. Mas, primeiro, é o desenho da reforma administrativa, quais os espaços existentes no governo e, a partir desses espaços, quais os quadros os partidos apresentam. A base do governo não tem vereadores suficientes para aprovação na Câmara. Vamos contar com parcerias, participando ou não do governo. Muitas pautas do Novo foram incorporadas por nós neste mandato. Termina esse mandato, começa outro, 12 vereadores de oposição em uma Câmara que tem 35.

  • O Ricardo Gomes foi um vice atuante. Ele fará parte do governo?

Sou muito grato de ter ele como vice. Tinha unanimidade dentro dos partidos para ser o vice, mas tomou uma decisão política e pessoal de não concorrer de novo. Ele não vai vir para o governo, é uma decisão dele.

  • Ele teve bastante espaço no governo, principalmente na área econômica. Qual papel a futura vice, Betina Worm?

A primeira conversa que o prefeito tem que ter depois da eleição é com seu vice. Não tive esse tempo. Quando fui vice-prefeito, disse ao (José) Fortunati: “quero ser vice, não quero assumir secretaria”. Essa conversa eu vou ter com a Betina. Ela terá um papel relevante. Tem qualidade, vem da área de licitações do Exército, tem a causa animal.

Não defendo vice figurativo. Vice tem que ter função, fazer gestão, dividir responsabilidade, coordenar reuniões e tomar decisões.

Quantas vezes eu deleguei ao Ricardo missões. Quando um vice e um prefeito se desacertam é ruim para a cidade, perde a gestão, perde todo mundo. Ela terá funções relevantes, talvez não no setor econômico. Aquela desconfiança que tinha do Melo, hoje o empresariado não tem mais. Um papel que era suprido pelo Ricardo, hoje o próprio prefeito cumpre esse.

  • Qual será o papel do PL?

A gente compôs, na eleição passada, em dois momentos: com os partidos que vieram do primeiro turno e com os partidos que vieram do segundo. Nesta eleição, majoritariamente, os partidos vieram do primeiro turno. Temos que ter um equilíbrio. Quando compõe um governo e um partido fica muito insatisfeito e outros contentes, sinal que compôs mal. Quando compõe um governo que todo mundo fica um pouco insatisfeito, é que fez uma boa composição, porque sempre os partidos vão querer mais.

Mas eu não vou aumentar o governo.

O PL terá um papel importante. O mesmo tamanho que o MDB tiver no governo, o PL vai ter. Então, não vai ter isso de “o partido do prefeito vai ter um tamanho muito maior”. Essa conversa eu vou ter com a vice, vou ter com a bancada do PL, vou ter sob a liderança do presidente (municipal do partido, Luciano) Zucco. Tem partidos que querem permanecer com os quadros que estão. Acho que, na medida do possível, vamos rodar as cadeiras. É importante para acabar com a acomodação. Se é um bom secretário daquela área, se foi bom lá, pode ser bom em outro lugar.

  • A educação será um dos grandes desafios e o senhor disse que não pode errar. Uma das promessas é zerar o déficit de vagas nas creches. O que pretende fazer de diferente dos últimos quatro anos para cumprir?

Temos uma parceria com a Unesco e estou descontente. Ou ela vem para o jogo, ou vou romper esse convênio. Repassamos R$ 30 milhões para fazer cinco creches e isso não saiu do papel. Esse tema vou enfrentar nesses dois meses. Se tivesse capacidade instalada no privado em todas as áreas da cidade, prefiro comprar a vaga do que fazer nova escola. O problema é que não posso pegar uma mãe que mora no Sarandi e dizer que a creche do filho vai ser no Centro. Vamos ter que fazer esse mapeamento da demanda manifesta, aquela que a mãe procurou a Smed. Já colhemos 5 mil (crianças) de 0 a 5 (anos). Claro que essa demanda vai aumentar: 3,5 mil hoje pode ser 3,8 mil. Fizemos um acordo com a Defensoria (Pública) que deu muito certo, uma filtragem para colocar na lista os que mais precisam. Nosso compromisso está dado. Se a demanda manifesta aumentar enormemente, bom, tenho o compromisso de colocar no mínimo 3 mil, 4 mil para dentro.

  • Junto ao prefeito, é o secretário da Educação que deve comandar esse processo. Há um perfil que se busca?

Qualquer secretário do nosso governo tem que ter uma característica que é nossa, de ouvir, respeitar quem pensa diferente e construir, na divergência, as convergências. Vou procurar ainda este ano a rede (de ensino) para conversar com as diretoras olho a olho sobre o que podemos fazer para melhorar a educação. Não só critica o governo, me dá sugestão.

  • Planeja uma outra forma de escolha dos diretores escolares. Qual será?

Eu quero discutir. A decisão não está tomada. O Ministério Público manda uma lista tríplice para o governador escolher. Se promover uma discussão dentro de um colégio e apresentar uma lista tríplice, o governo tem a opção de escolher um dos três. É democrático.

  • Quem definiria essa lista?

Quem foi eleito. Tenho 99 escolas, eu tenho 99 eleições. Em cada eleição, tem os três mais votados e vem uma lista tríplice.

  • Pretende realizar parcerias público-privadas (PPPs) em escolas. Como será o modelo?

Não trata nada de pedagogia, isso é papel das direções escolares. Hoje, se quebrar uma chave em uma porta, tem que ter três orçamentos, pede para o chaveiro 18 documentos. Vale para a pia, para a goteira. Pega esse mesmo dinheiro, licita e diz que a regra do jogo é esta, tem que construir escola nova e tem que manter as que estão aí. Mas, a pedagogia não sai da mão dos diretores da escola, é somente a questão de infraestrutura.

  • Como recuperar a imagem da Secretaria da Educação?

A primeira questão que tem que ficar clara é que o prefeito nunca foi investigado. Segundo, a democracia nos estabeleceu, na lei infraconstitucional, competência. O Ministério Público é o dono da ação penal, o juiz julga. Tudo que o delegado me pediu, eu mandei entregar.

Se alguém fez besteira, seja ex-secretária, seja servidor público, seja privado, que devolva o dinheiro e que vá para a cadeia.

Não tem lei para caráter. A corrupção, você tem que combater sempre, mas ela é uma doença. Ela não vai acabar. Temos que combater e ter cada vez instrumentos mais fortes para proibi-la.

  • O senhor prometeu um governo de parcerias e concessões. O governo de Estado tem dificuldade para fiscalizar serviços concedidos. Acredita ter capacidade regulatória para promover mais PPPs e concessões?

O mundo inteiro tem concessão de serviço público. A diferença é que as agências regulatórias do mundo inteiro são agências que funcionam. Concessão de serviço público tem três coisas fundamentais: um edital bem feito, o contrato que nasce do edital e uma agência reguladora que funcione. Eu espero que o governador Eduardo Leite reformule a Agergs. Ele está dizendo que vai fazer e que faça mesmo, porque independente de parceirizar o Dmae, a lei federal, pelo Marco Regulatório (do Saneamento), nos obriga a aderir a uma agência reguladora eu já determinei que vai ser a Agergs.

Eu jamais faria uma concessão sem um pente fino para que todas as pessoas que precisam de tarifa social tenham que ser atendidas. Não vou fazer uma concessão deixando gente de fora.

E o dinheiro que vem de lá (da concessão) é drenagem urbana na veia.

  • O senhor saiu mais forte das urnas. Quais os planos?

Continuar sendo prefeito. Prefeito, prefeito, prefeito. E entregar uma cidade melhor no final de 2028.