Representantes de órgãos públicos federais, estaduais, cooperativas e setor produtivo, incluindo as empresas Salton, Aurora e Garibaldi, assinaram, na tarde desta quarta-feira, no Plenarinho da Assembleia Legislativa, o Pacto pela Adoção de Boas Práticas Trabalhistas na Vitivinicultura do Rio Grande do Sul. O acordo visa combater situações de flagrante de trabalho análogo à escravidão, como o registrado em fevereiro, envolvendo mais de 200 contratados em Bento Gonçalves, na Serra. O documento contém 14 cláusulas a fim de promover o trabalho decente e o aperfeiçoamento das relações e condições de trabalho no setor. O prazo de vigência do Pacto, de dois anos a partir desta quarta-feira, pode ser prorrogado.
O protocolo de intenções prevê a distribuição de orientações e informações que promovam um ambiente de trabalho saudável e seguro. Contudo, o documento não impõe obrigações legais ou responsabilidades às entidades que aderirem aos termos do acordo, prevendo apenas um compromisso conjunto de atuação, com foco na adoção e na divulgação das melhores práticas trabalhistas na vitivinicultura.
Uma das cláusulas salienta que os representados pelas entidades signatárias serão orientados a verificar as condições de trabalho dos empregados, independentemente da forma de contratação. Devem ser afastadas medidas que sinalizem trabalho forçado, jornada exaustiva, condição degradante, restrição, por qualquer meio, de locomoção em razão de dívida contraída com empregador ou preposto, no momento da contratação ou no curso do contrato de trabalho, ou retenção no local de trabalho em razão de cerceamento do uso de qualquer meio de transporte.
O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, que participou da assinatura, em Porto Alegre, defendeu a necessidade de movimentação conjunta para que a relação entre empregador e empregado melhore. “É inaceitável que o cidadão seja explorado, de forma tão degradante que chegue ao trabalho análogo à escravidão. O pacto pode ser incorporado na legislação federal, estadual, municipal, mas o mais importante é ele ser incorporado pela sociedade, um novo padrão ético de comportamento”.
No documento, o Ministério do Trabalho e Emprego se compromete a participar dos processos de formação e aperfeiçoamento das equipes internas das cooperativas filiadas à Fecovinho e dos associados e integrantes das demais entidades. O Ministério Público do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) vão acompanhar as ações previstas no documento e fomentar o desenvolvimento de políticas públicas, do diálogo e da articulação social.
Conforme o secretário do Trabalho do RS, Gilmar Sossela, o documento assinado reconhece o erro mas mostra que “mais que um selo, é uma chancela de que sim, nós tivemos alguns problemas, reconhecemos, mas queremos olhar para a frente e jamais [repetir] um momento como esse”.
Marinho ainda destacou que o problema não está na contratação de empresas terceirizadas, mas na necessidade de que o contratante observe a empresa, a saúde da empresa, se ela pode executar o trabalho com qualidade, tranquilidade, respeitando os trabalhadores e garantindo condições decentes de pouso e alimentação, por exemplo.
“Eu tenho certeza que, se cada grande empresa, ao subcontratar, olhar esse contrato e a responsabilidade social, com a mesma dedicação e energia que coloca na qualidade do seu produto, vai evitar que aconteça o trabalho degradante. Temos diversas formas de sanções, mas nós não queremos essa espada na cabeça de ninguém. O que queremos é a responsabilidade de assumir que as pessoas tenham um trabalho decente que possa respeitar, acima de tudo, cada cidadão”, completou o ministro.
Em coletiva de imprensa, ele destacou que o documento, por enquanto voltado à vitivinicultura, pode servir de exemplo a outros setores da economia, que serão chamados a adotar condutas semelhantes.
Antes da solenidade no Plenarinho, o ministro do Trabalho e Emprego recebeu um relatório do deputado estadual pelo PSol, Matheus Gomes, sobre a “Avaliação das condições de funcionamento do sistema estadual de combate à escravidão e às suas formas análogas a partir da operação na Serra Gaúcha”.
O documento, com mais de 200 páginas, compila dados mostrando que o governo gaúcho deixou de cumprir 34 dos 38 pontos do Plano Estadual de Combate ao Trabalho Escravo, criado em 2013, e cita como exemplo a inexistência de recursos destinados para esse fim no orçamento estadual. O secretário Gilmar Sossella afirmou que tomará conhecimento do conteúdo do relatório a fim de articular soluções.
O documento também reúne 66 propostas de ação que podem ser adotadas pelas esferas municipal, estadual e federal.