O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Carlos Alberto de Franco França, disse nesta quinta-feira que o governo brasileiro não mudou de posição sobre a proposta de quebra de patentes de vacinas contra a Covid-19 na Organização Mundial do Comércio (OMC). França afirmou aos parlamentares que, pelo menos por enquanto, o Brasil ainda é mais favorável a uma “terceira via”, encabeçada por países como Chile e Canadá. As informações foram apuradas pelo jornal O Estado de S.Paulo.
“A posição do governo não mudou”, disse França, durante audiência na sessão na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. O ministro argumentou que o Brasil pode ter maior ganho nessa área por meio de uma terceira via. O chanceler também comentou que até então a proposta de quebra de patentes não tinha adesão de membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Pressionado, o governo de Joe Biden decidiu apoiar a suspensão de direitos de propriedade intelectual sobre as vacinas contra Covid-19, uma ideia proposta por países como Índia e África do Sul no organismo multilateral – mas que já ganhou a adesão de mais de 100 nações – e pode permitir a quebra de patente dos imunizantes. A intenção é facilitar a transferência de tecnologia e possibilitar a produção das vacinas nos países mais atrasados no processo de imunização.
“Essa é uma crise de saúde global e as circunstâncias extraordinárias da pandemia de Covid-19 exigem medidas extraordinárias. O governo (Biden) acredita fortemente nas proteções de propriedade intelectual, mas em trabalho para acabar com essa pandemia, apoia a suspensão dessas proteções para as vacinas contra Covid-19”, anunciou a representante comercial dos EUA, Katherine Tai. O chanceler brasileiro disse que se reúne com Katherine nesta sexta-feira para entender melhor a posição americana.
Nesta quinta, depois do anúncio americano, a União Europeia também sinalizou que pode mudar de posição. Para o Brasil, segundo o ministro, essa proposta de quebra de patentes apenas tende a favorecer países que já são detentores de tecnologia. Mais cedo, na mesma comissão, ele havia dito que, mesmo com a ajuda dos laboratórios, era difícil reproduzir as vacinas em outros lugares.
“O Brasil não pode se afastar dos produtores de vacinas”, disse o chanceler, indicando que essa postura pode deixar o País em uma situação delicada em relação a contratos de compra.
No mês passado, o Senado aprovou projeto que autoriza a quebra de patentes para vacinas e medicamentos relacionados ao combate à pandemia de Covid-19, por 55 votos a 19. O relator, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), alterou o texto original após críticas do governo federal e do setor empresarial. A nova versão, porém, ainda é alvo de questionamento.
Mesmo após as alterações, o vice-líder do governo no Senado Carlos Viana (PSD-MG) insistiu em alegar que o texto pode abrir caminho para o Brasil descumprir acordos internacionais e sustentou que o País pode deixar de receber 200 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19 nos próximos meses se proceder à quebra de patentes.
Nas últimas semanas, dirigentes da Fiocruz e do Butantan se manifestaram contra a quebra de patentes. Hoje, a Pfizer se posicionou da mesma forma.
Gargalo
Na avaliação de França, o maior gargalo na obtenção das vacinas contra a Covid-19 em todo o mundo é a capacidade de produção da indústria farmacêutica.
O ministro destacou a chegada, no fim de semana, de 4 milhões de doses de vacinas provenientes do consórcio internacional Covax Facility. “É o primeiro resultado satisfatório numa corrida contra o tempo”, disse.
Chegaram ao Brasil, entre sábado e domingo, mais 4 milhões de doses prontas da vacina de Oxford/AstraZeneca fornecidas por meio do consórcio Covax Facility, iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a distribuição global de imunizantes contra a Covid-19.
Para França, o envio dessas doses é fruto do trabalho do Itamaraty na busca de vacinas para os brasileiros dentro da estratégia “diplomacia da saúde” junto com a atuação das comissões de relações exteriores da Câmara e do Senado.
Antes de se pronunciar, o ministro ouviu da presidente da comissão, a senadora Katia Abreu (Progressistas-TO), que a responsabilidade dele à frente do Itamaraty é grande. A parlamentar criticou o que chamou de “desvios ideológicos”, “excessos” e “incidentes diplomáticos” que transformaram negativamente a imagem do Brasil no exterior.
A senadora também deixou clara a intenção de maior participação do Senado na atuação externa do Itamaraty. Além da questão da pandemia, o chanceler voltou a enfatizar que os outros maiores desafios do País atualmente são a recuperação econômica e as discussões sobre a área ambiental.
China
Kátia Abreu ainda destacou que, desde 2009, a China se mantém como o maior parceiro comercial do País. “Temos relação muito positiva com essa potência asiática, tanto na área comercial quanto de investimentos”, disse ela, apresentando alguns números e enfatizando que as relações cordiais devem ser mantidas com o governo e as empresas chinesas.
Ontem, o presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar o país asiático e a sugerir que a pandemia tenha sido fruto de uma guerra biológica iniciada pela China.