Foi um padre católico, cientista e inventor brasileiro nascido em Porto Alegre em 21 de janeiro de 1861.Teve sólida formação cultural e científica, e formou-se sacerdote em Roma. Somente na fase final de sua vida religiosa, já tendo deixado a ciência em segundo plano, sua carreira na Igreja se consolidou, sendo designado sucessivamente vigário-geral da Arquidiocese de Porto Alegre, cônego e penitenciário do Cabido Metropolitano, monsenhor e arcediago, responsável também pela paróquia do Menino Deus e finalmente pela paróquia do Rosário, em cuja igreja hoje estão depositados seus despojos.
Landell de Moura, no entanto, é mais conhecido pelo seu pioneirismo na ciência da telecomunicação, tendo desenvolvido uma série de pesquisas e experimentos que o colocam como um dos primeiros a conseguir a transmissão de som e sinais telegráficos sem fio por meio de ondas eletromagnéticas, o que daria origem ao telefone e ao rádio, senão o primeiro de todos, o que ainda é motivo de polêmicas. Vários testemunhos afirmam que ele vinha realizando testes bem sucedidos em ambas as modalidades de transmissão desde 1893 ou 1894, mas a documentação sobre esses primeiros experimentos é pobre e a data é disputada. O seu primeiro registro inconteste, documentado publicamente, é de 3 de junho de 1900, testando com sucesso aparelhos que transmitiram sem fio sons e sinais telegráficos. No Brasil ele usualmente é considerado o pioneiro em nível mundial. Nos outros países sua realização permanece largamente ignorada, embora um crescente número de fontes estrangeiras estejam aceitando sua primazia. Também deixou projetos que apontam seu pioneirismo na transmissão de imagens sem fio, sendo considerado nacionalmente um precursor da televisão e das fibras ópticas, mas também nestes campos a documentação sobrevivente não é muito clara, e internacionalmente sua contribuição nesta área específica caiu num esquecimento quase total. Demonstrou paralelamente algum interesse pela homeopatia, pela psicologia e pelo espiritismo, abordados pelo viés da ciência.
Teve muitas dificuldades técnicas e financeiras para desenvolver suas pesquisas, trabalhou a maior parte do tempo sozinho e encontrou muita resistência e incredulidade por parte de autoridades e da população, o que impediu que seu reconhecimento em vida fosse mais amplo, mas em certas esferas sua estatura científica foi devidamente apreciada e sabe-se que rejeitou oportunidades de divulgar seus inventos. Assim, a ideia popular que se formou em torno dele como um perseguido, injustiçado e sofrido cientista enfrentando um mundo insensível e obscurantista, se tem uma parte de verdade, tem também seu lado de mito romântico. A sua biografia ainda tem muitas lacunas e do seu legado científico apenas parte foi estudado, havendo muita documentação autógrafa ainda por explorar. Seja como for, no Brasil já recebeu uma série de homenagens e reconhecimentos oficiais. É cidadão honorário da cidade de São Paulo, patrono da Ciência, da Tecnologia e da Inovação do município de Porto Alegre, patrono dos radioamadores brasileiros, e em 2012, por decreto presidencial, seu nome foi inscrito no Livro dos Heróis da Pátria.
Em manuscritos seus, há uma notícia de que aos dezesseis anos teria inventado uma espécie de telefone, apenas um ano depois de Graham Bell, mas não deixou nenhuma descrição precisa do aparelho
Em 1892 teria construído o primeiro transmissor sem fio de mensagens, antes de Guglielmo Marconi fazer seus primeiros testes na Itália. Entre 1893 e 1894, segundo Fornari, seu primeiro biógrafo e seu contemporâneo,teria realizado a primeira transmissão pública de som por meio de ondas hertzianas, ocorrida entre o alto da Avenida Paulista e o Alto de Santana, cobrindo uma distância de oito quilômetros.Na ocasião ele testou um transmissor de ondas, um telégrafo sem fio e um telefone sem fio.Contudo, segundo Luiz Netto, não existe documentação sólida a respeito da data dos primeiros experimentos, o que prejudicou seu reconhecimento internacional.Testemunhos de Jayme Leal Velloso, Arthur Dias, Maria Ribeiro de Almeida e do Correio do Povo, recolhidos por Hamilton Almeida, colocam seus primeiros experimentos entre 1890 e 1896.Os experimentos se sucederiam, e em 1899 o Jornal do Commercio assinalou seu sucesso e seu pioneirismo mundial no campo da transmissão do som sem fio.
Com os bons resultados obtidos, em 9 de março de 1901 Landell de Moura conseguiu obter a primeira patente brasileira para um “aparelho destinado à transmissão fonética à distância, com fio ou sem fio, através do espaço, da terra e do elemento aquoso”. Diante disso, a Igreja reconheceu o seu mérito e autorizou que iniciasse em 14 de junho uma excursão científica, que passou pela Itália, França e Estados Unidos. Neste país instalou um laboratório na cidade de Nova Iorque, onde permaneceria quatro anos. Ele pretendia patentear os inventos também nos Estados Unidos, mas o Departamento de Patentes exigiu a apresentação de protótipos funcionais para conceder os registros. Como ele havia levado apenas os projetos, teve de construir três aparelhos, o que prolongou sua estadia. O jornal New York Herald publicou em 1902 uma reportagem sobre as experiências desenvolvidas na transmissão de sons sem uso de aparelhos com fio, inclusive por cientistas americanos, alemães, ingleses dentre outros, destacando o padre Landell com uma fotografia e uma entrevista.Ressalta o jornal: “Por entre os cientistas, o brasileiro Padre Landell de Moura é muito pouco conhecido. Poucos deles tem dado atenção aos seus títulos para ser o pioneiro nesse ramo de investigações elétricas. Mas antes de Brighton e Ruhmer, o Padre Landell, após anos de experimentação, conseguiu obter uma patente brasileira para sua invenção, que ele chamou de Gouradphone”.
Em 1904 obteve enfim três patentes norte-americanas: número 771.917, de 11 de outubro, para um “transmissor de ondas”, e em de 22 de novembro as de números 775.337 e 775.846, para um “telefone sem fio” e para um “telégrafo sem fio”, que poderiam funcionar através da luz ou de ondas de rádio, com ou sem fio.No mesmo ano desenvolveu um projeto para transmissão de imagens à distância, cuja tecnologia o tornaria também um pioneiro da televisão, do teletipo e do controle remoto.
Em 1907 escreveu um memorial descrevendo os efeitos eletro-luminescentes de um indeterminado campo energético que envolveria os seres vivos, registrando-os em filme fotográfico, fenômeno conhecido hoje como efeito Kirlian, mas não se sabe se ele tinha conhecimento de experiências anteriores de Fernando Sanford neste campo. Ao mesmo tempo, descreveu os efeitos da eletricidade sobre o corpo humano.
Em sua volta ao Rio Grande do Sul em 1913 trabalhou no aperfeiçoamento do seu sistema de transmissão de imagens, dando-lhe o nome de “televisão”. Com a fundação da Faculdade de Medicina Homeopática em 1914, assumiu uma cátedra, junto com seu irmão João, que era farmacêutico e médico. Na inauguração da escola, em 2 de março, o padre Landell proferiu um discurso sobre a lei dos similares, que constitui o princípio básico da homeopatia. No entanto, no mesmo ano uma crise interna provocou a cisão da instituição em duas novas escolas superiores, a Faculdade de Ciências Médicas e Escola Médico-Cirúrgica, e em nenhuma delas a homeopatia foi incluída.
Em 1928, doente foi recolhido ao hospital da Beneficência Portuguesa, um amigo perguntou-lhe por que motivo nunca havia feito propaganda de seus inventos e de suas patentes, e a resposta foi que “não podia e não devia aparecer como inventor. E continuou que anos antes, havia sido aconselhado a deixar a batina, para dedicar-se só à ciência, respondera que não por que respeitava seu voto, e que seu sacerdócio fora a maior aspiração de seus pais. Resolveu renunciar às glórias que as suas invenções lhe puderam conquistar”.
Faleceu no dia 30 de junho de 1928, vitimado pela tuberculose, agravada pelo tabagismo, sendo um fumante inveterado, sendo sepultado na Gruta de Nossa Senhora de Lourdes do Cemitério São Miguel e Almas.
O padre deixou também uma breve descrição sobre as propriedades de seus aparelhos:
“O aparelho Telauxiofono é última palavra, sobre telefonia com fio, não só pelo vigor e inteligibilidade com que transmite a palavra, mas também porque, com ele, se obtêm todos os efeitos do telefone alto-parlatore e do teatrofono. Com esta notável diferença, que se tratando da teatrofonia, é suficiente um só transmissor, por maior que seja o número dos concertantes. Além disso, com o Telauxiofono, o problema da telefonia ilimitada tornar-se-á uma realidade prática e econômica. O Caleofono, como o precedente, trabalha também com fio, e é original porque, em vez de tocar a campainha para chamar, faz ouvir o som articulado ou instrumental. É muito apropriado para escritórios. O Anematofono, com o qual, sem fio, obtêm-se todos os efeitos da telefonia comum, porém com muito mais nitidez e segurança, visto funcionar ainda mesmo com vento e mau tempo. É admirável este aparelho, pelas leis inteiramente novas que revela. O Teletiton, espécie de telegrafia fonética com o qual, sem fio, duas pessoas podem-se comunicar, sem que sejam ouvidas por outra. Creio que com este sistema poder-se-á transmitir por meio da energia elétrica a grandes distâncias e com muita economia, sem que seja preciso usar-se de fio ou cabo condutor. O Edifono finalmente serve para dulcificar e depurar as vibrações parasitas da voz fonografada, reproduzindo-a ao natural. Este aparelho tornar-se-á o amigo inseparável dos músicos compositores e dos oradores.”
Em 1984 a Fundação de Ciência e Tecnologia, de Porto Alegre, reconstruiu o Transmissor de Ondas patenteado em 1904 nos Estados Unidos. Os testes tiveram sucesso na transmissão em uma larga faixa de frequência e em distâncias de até 50 metros. Os técnicos supõem que na época do padre a distância poderia ter sido bem maior, devido à ausência da interferência eletromagnética que hoje existe. O aparelho distorceu severamente a voz, tornando-a muitas vezes incompreensível, mas sua efetividade na transmissão de som foi comprovada. O aparelho foi demonstrado publicamente em 1984.
“O aparelho foi apresentado em público, pela primeira vez, nas solenidades de encerramento da Semana da Pátria. No dia 7 de setembro de 1984, em frente ao Monumento do Expedicionário, na capital gaúcha, o governador do Rio Grande do Sul, Jair Soares, pronunciou, pelo fone do aparelho, duas palavras que foram ouvidas nitidamente por centenas de pessoas: ‘Porto Alegre’. Aquele momento festivo cristalizou de maneira incontestável a funcionalidade do invento do Padre Landell”.(Almeida)
Landell de Moura demonstrou possuir conhecimentos sobre uma ampla variedade de temas científicos, mas suas referências são escassamente conhecidas. Enfronhou-se com a Homeopatia, quando esta corrente terapêutica experimentava uma onda de popularidade no Brasil, resultando na criação de duas instituições superiores de ensino, uma no Rio de Janeiro e outra em Porto Alegre. Landell foi convidado em 1914 a lecionar na recém-fundada Faculdade de Medicina Homeopática do Rio Grande do Sul, onde daria aulas de Psicologia Experimental e Antropologia, mas provou ser um conhecedor da Homeopatia propriamente dita na palestra inaugural da escola, onde discorreu eruditamente sobre as duas formas de curar, sintetizadas nos axiomas hipocráticos contraria contrarius curantur (a cura se faz pelos contrários, que é a base da alopatia) e similia similibus curantur (a cura se faz pelos semelhantes, que é a base da medicina homeopática). Entretanto, com a crise interna da Faculdade quase imediatamente após sua fundação, que desencadeou a formação de duas novas escolas, Landell jamais chegou a dar suas aulas.
Landell de Moura desenvolveu pesquisas sobre o registro de um campo energético sutil que circunda os seres vivos, que ele denominou de “perianto” e que outros nomeiam “aura”.Este campo energético foi detectado em meados de 1939 por Semyon Davidovich Kirlian, batizando o chamado efeito Kirlian, que parece ser de fato o mero registro de descargas de corona causadas pela ionização de fluidos em proximidade de um condutor eletricamente carregado.
Nos anos recentes diversos artigos e outras publicações internacionais já lhe fazem referência aceitando seu pioneirismo absoluto na transmissão de som sem fio através das ondas de rádio, é reconhecido como tal em inúmeros websites populares de vários países , mas fora do Brasil em geral continua bastante desconhecido ou subestimado.
O estudo do seu legado é dificultado por vários fatores. Não sobreviveu nenhum dos seus aparelhos, e a documentação original que resta, embora volumosa, compondo 230 documentos entre livros de notas científicas, esquemas técnicos, cartas e outros papéis, com um total de 4.470 páginas, depositada em seu grosso no Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul (IHGRGS), nem sempre é clara o bastante para permitir um perfeito entendimento de suas intenções, métodos, materiais e procedimentos técnicos usados, e mesmo de seus resultados. Além disso, esta documentação é de difícil acesso. A maior parte dela se encontra escrita em uma intrincada mistura de latim, português e inglês, pouco foi transcrito e explorado, e parte da coleção original encontrada após sua morte pode ter sido perdida.Guerra Lima também afirmou que “sob pretexto de que é uma instituição privada, o IHGRGS] não permite acesso aos originais nem a cópias fieis dos trabalhos do cientista. O IHGRGS produziu um CD com as patentes e algumas histórias sobre o Padre Landell que não são a expressão do seu trabalho, mas sim o entendimento de alguns dos seus funcionários”.Desta forma, apenas uma fração do seu pensamento e suas pesquisas são conhecidos. Dos seus objetos pessoais também pouco chegou aos dias de hoje: uma batina, uma mesa de trabalho, um confessionário e alguns outros itens.
Fonte: IHGRGS