O Palácio do Planalto decidiu ignorar decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) e manter sob sigilo os gastos com cartão corporativo da Presidência. Desde 1967, um decreto militar ampara a decisão de não divulgar as despesas da Presidência. Há exatos trinta dias, no entanto, o STF derrubou o artigo 86 do decreto-lei 200/67, segundo o qual a movimentação dos créditos destinados à realização de despesas reservadas ou confidenciais do presidente ou de ministro deveria ser feita sigilosamente. As informações são da Agência Estado (AE).
O governo foi notificado em novembro sobre a mudança, mas não alterou o seu procedimento. Um mês após a decisão do Supremo, provocada por uma ação do partido Cidadania (ex-PPS), a Secretaria-Geral da Presidência (SGP) continua mantendo os gastos presidenciais em sigilo e disse que não pretende torná-los públicos. Segundo dados do Portal da Transparência do Governo Federal, a Presidência desembolsou, na gestão de Jair Bolsonaro, R$ 14,5 milhões com cartões corporativos.
Para justificar a preservação do sigilo, o governo informou que lança mão de outra legislação, a Lei de Acesso à Informação (LAI), de 19 de novembro de 2011. “Sobre o assunto, cabe esclarecer que a legislação utilizada pela Presidência da República para classificar as despesas com grau de sigilo é distinta daquela que foi objeto da decisão do STF”, disse, em nota, a assessoria de comunicação do Palácio do Planalto.
Na interpretação do Executivo, mesmo que o Supremo tenha decidido pela derrubada do artigo que permitia o sigilo, outra lei, a da Transparência, possibilita que a Presidência mantenha os gastos dos cartões corporativos sem serem revelados. A nota cita, ainda, o artigo 24 da LAI, segundo o qual a informação em poder dos órgãos e entidades públicas, “observado o seu teor, e em razão de sua imprescindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada”.
As informações passíveis de pôr em risco a segurança do presidente, do vice-presidente e dos respectivos cônjuges e filhos serão carimbadas como reservadas, de acordo com o Planalto, ficando sob sigilo até o término do mandato em exercício ou do último mandato, em caso de reeleição.
“Feitas as considerações acima, esta Secretaria compreende que a decisão do STF não modifica os procedimentos atualmente adotados, em face da legislação de fundamentação ser norma específica distinta do Decreto-Lei nº 200, de 1967”, afirmou a SGP.
A reportagem solicitou, por meio da LAI, que o governo fornecesse o detalhamento das despesas com cartão corporativo neste ano – incluindo valor, local da compra e especificação do produto adquirido com dinheiro público -, mas não obteve os dados. Quem acessa o portal do governo também não consegue as informações e se depara com a referência ao sigilo das despesas presidenciais.