A Procuradoria-Geral da República afirmou ser “absolutamente comum” que membros do Ministério Público conversem com juízes sem a presença da defesa. O entendimento consta em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF) no processo movido pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cobra a suspeição de Sergio Moro após a divulgação de mensagens atribuídas ao ex-juiz e membros da Lava Jato.
“Em nosso sistema, a lei não exige que uma parte só tenha contato com o julgador na presença da outra. É absolutamente comum que membros da Advocacia e do Ministério Público conversem com o julgador sem a presença da outra parte”, argumenta a PGR.
O entendimento é de que as mensagens não podem ser consideradas provas válidas por não terem passado por uma perícia técnica e por terem sido obtidas de forma ilícita. Apesar disso, a Procuradoria salienta que, mesmo na hipótese de serem reais, as conversas não ferem a legislação, nem podem ser utilizadas para inocentar Lula no processo do triplex do Guarujá (SP).
Neste caso, o petista recebeu pena de nove anos e seis meses de prisão. O caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), a terceira instância jurídica, que reduziu a pena para oito anos, dez meses e vinte dias de reclusão. Foi a primeira condenação de Lula na Lava Jato.
A Lava Jato é a maior operação já deflagrada no País contra a corrupção. A investigação desmantelou cartel de empreiteiras que se instalou em diretorias estratégicas da Petrobras entre 2004 e 2014. A operação atingiu 68 fases até aqui, pelas mãos de Moro e depois, dos juízes Gabriela Hardt e Luiz Antônio Bonat, que assumiram a Lava Jato na 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba.
Ao longo de mais de cinco anos de ação da Lava Jato em Curitiba já chega a R$ 4,069 bilhões o total de valores recuperados por meio de acordos de delação premiada, acordos de leniência, termo de ajustamento de conduta (TAC) e renúncias voluntárias de réus ou condenados, já efetivamente restituídos ao erário público.
Até aqui, a Lava Jato já levou a condenações somando 2.249 anos de prisão a acusados de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Contato ‘legítimo e recomendável’
De acordo com a Procuradoria, em casos de investigações sigilosas, os contatos se restringem a apenas ao Ministério Público e ao juiz. “É muito comum, legítimo e recomendável que haja contatos frequentes entre os membros do Ministério Público e do Poder Judiciário. Essa é, aliás, em especial, a realidade de grandes investigações”, alega.
A PGR também entende que as mensagens não devem ser levadas em consideração pelo Supremo devido à ausência de perícia. A Procuradoria acusa que “houve edição de parte das mensagens” e aponta, como prova, manifestações de defesa de Deltan Dallagnol e da força-tarefa da Lava Jato. O site The Intercept Brasil, que divulgou as mensagens, nega veementemente que o conteúdo tenha sido modificado.
Em outro ponto, a PGR reitera que as mensagens foram obtidas de forma ilícita por um grupo de hackers que miraram não apenas Moro e Dallagnol, mas diversas autoridades em uma “ação criminosa de gravidade sem precedentes na história do País”.
Reação
Ainda conforme o Estadão, o criminalista Cristiano Zanin Martins, defensor do ex-presidente Lula, disse que a manifestação da Procuradoria Geral da República busca “causar tumulto processual e impedir a conclusão do julgamento do habeas corpus que trata da parcialidade do ex-juiz Sergio Moro e da consequente nulidade dos processos instruídos e julgados pelo então magistrado”.
“A manifestação é extemporânea, já que pretende tratar das mensagens da ‘Vaza Jato’ citadas em petição que apresentamos há 6 meses. Além disso, a manifestação não conseguiu afastar a prova pré-constituída da parcialidade com que Moro conduziu os processos contra Lula, reforçadas pelas mensagens checadas e divulgadas pelo portal The Intercept e por diversos outros veículos de imprensa e que estão na posse do próprio Supremo Tribunal Federal, além da 10ª. Vara Federal de Brasília”.