Em Riad, capital da Arábia Saudita, o presidente Jair Bolsonaro disse nesta quarta-feira que está conversando com o ministro Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, para que a Polícia Federal colha um novo depoimento do porteiro que o associou ao assassinato da vereadora Marielle Franco em março de 2018.
“Estou conversando com o ministro da Justiça para a gente tomar, via Polícia Federal, um novo depoimento desse porteiro pela PF para esclarecer de vez esse fato, de modo que esse fantasma que querem colocar no meu colo como possível mentor da morte de Marielle seja enterrado de vez”, disse. O presidente afirmou não saber quem é o porteiro citado em reportagem da TV Globo nesta terça-feira.
Segundo a reportagem, um porteiro do condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro, disse em depoimento à Polícia Civil do Rio de Janeiro que, no dia do assassinato, um dos suspeitos se dirigiu até o conjunto de casas onde vive o presidente, horas antes do crime.
Ao porteiro, o ex-policial-militar Élcio Vieira de Queiroz teria dito que iria à casa de número 58, que pertence ao presidente.
Governador do Rio
O presidente acusou o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), de atuar em conluio com o delegado da Polícia Civil encarregado pelo caso Marielle Franco para tentar incriminá-lo. Segundo Bolsonaro, Witzel o informou sobre a investigação, que corre em segredo de Justiça, no dia 9 de outubro.
“No meu entendimento, o senhor Witzel estava conduzindo o processo com o delegado da Polícia Civil para tentar me incriminar ou pelo menos manchar o meu nome com essa falsa acusação de que eu poderia estar envolvido na morte da Marielle”, disse Bolsonaro a jornalistas na saída do hotel onde está hospedado, em Riad, na Arábia Saudita.
De acordo com o presidente, Witzel sabia há pelo menos 20 dias que ele foi citado no depoimento do porteiro do condomínio Vivendas da Barra, onde morava Ronnie Lessa, um dos dois acusados de matar a vereadora Marielle Franco (PSOL) e seu motorista Anderson Gomes, em março de 2018.
“Não sei quem é o porteiro. Eu não tive acesso (ao processo) como a Globo teve, como o Witzel teve. O processo corre em segredo. Nós sabemos que são pessoas humildes, que quando são tomados depoimentos sempre estão preocupadas com alguma coisa. No meu entender, o porteiro está sendo usado pelo delegado da Polícia Civil, que segue ordem do senhor Witzel, governador”, afirmou o presidente.
Ele também disse que vai pedir que o porteiro preste um novo depoimento à Polícia Federal. “O porteiro ou se equivocou ou não leu o que assinou. Pode o delegado (da Polícia Civil) ter escrito o que bem entendeu e o porteiro, uma pessoa humilde, né, acabou assinando embaixo”, declarou.
Bolsonaro contou que Witzel o informou sobre a investigação durante o aniversário do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Augusto Nardes, no Clube Naval do Rio de Janeiro, realizado no dia 9 de outubro.
“Ele (Witzel) chegou perto de mim e falou o seguinte: ‘O processo está no Supremo’. Eu falei: ‘Que processo?’. ‘O processo está no Supremo?’. ‘Que processo?’. ‘Ah, o processo da Marielle’. ‘O que eu tenho a ver com o caso da Marielle?’. ‘Não, o porteiro citou o teu nome’. Ou seja, Witzel sabia do processo que estava em segredo de Justiça”, declarou Bolsonaro.
O presidente disse ainda que Witzel tem uma “tara” sobre ele e seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). “O Witzel era uma pessoa desconhecida, colou no Flávio Bolsonaro e em mim para poder se eleger governador do RJ. Tomou posse e elegeu Flávio e eu como inimigos dele. Por quê? Ele quer ser candidato à Presidência em 2022. Nada contra”, disse.
“Por que ele tem essa tara em cima de mim e do Flávio? Ele quer exatamente destruir a minha reputação atacando aquilo que mais sagrado eu tenho, que é o combate à corrupção e a questão da honestidade. Então ele, no meu entender, conduz esse processo no Rio de Janeiro. Estou dando provas aqui porque ele falou comigo há quase um mês atrás sobre esse processo”, reforçou.
O envolvimento de Bolsonaro poderá levar a investigação do caso Marielle ao Supremo Tribunal Federal (STF) devido ao foro por prerrogativa de função.
Depoimento do porteiro
Segundo reportagem exibida nessa terça-feira, o porteiro afirmou à Polícia Civil que, às 17h10 de 14 de março de 2018 (horas antes do crime), um homem chamado Elcio (que seria Elcio Queiroz, o outro acusado pelo duplo homicídio) entrou no condomínio dirigindo um Renault Logan prata e afirmou que iria à casa 58, que pertence a Bolsonaro e onde morava o presidente.
De acordo com a TV, o porteiro do condomínio afirmou em depoimento que ligou para a casa 58 e o “seu Jair” atendeu e autorizou a entrada de Elcio. O então deputado, porém, estava em Brasília, conforme registros da Câmara.
Após a exibição da reportagem, Bolsonaro acusou Witzel de vazar para a Globo o inquérito sobre a morte de Marielle e Anderson, que corre em segredo de Justiça. “Por que querem me destruir? Por que essa sede de poder, seu governador Witzel?”, questionou o presidente, visivelmente nervoso, em uma transmissão ao vivo de 23 minutos, gravada durante a madrugada na Arábia Saudita e exibida em suas redes sociais. “O senhor (Witzel) quer destruir a minha família para chegar à presidência da República.”
Em nota divulgada em suas redes sociais, Witzel lamentou a manifestação feita na terça-feira pelo presidente, que classificou como “intempestiva”, e disse que foi atacado injustamente. “Jamais houve qualquer tipo de interferência política nas investigações conduzidas pelo Ministério Público e a cargo da Polícia Civil”, disse o governador.