Os alagamentos constantes em bairros da zona Norte de Porto Alegre e na região das Ilhas do Guaíba finalmente poderão ter soluções que não as medidas paliativas que se vê após os estragos causados por temporais mais severos. Um relatório do Banco Mundial, desenvolvido em parceria com o Escritório de Resiliência da prefeitura e com suporte da Fundação Rockefeller e lideranças comunitárias, apresentado na manhã de ontem, terá o objetivo de servir de ponto de partida para ações conjuntas de curto a médio prazo para o problema. “Convivendo com as inundações: um estudo para construir resiliência com as comunidades de Porto Alegre” foi desenvolvido tendo como foco a enchente de outubro de 2015 e abrangeu 1,5 mil domicílios.
A pesquisa foi realizada entre 2017 e 2018 e considerou duas áreas do Orçamento Participativo, a região das ilhas – das Flores, da Pintada, do Pavão e Grande dos Marinheiros -, e do 4o Distrito – formado pelos bairros Humaitá, Navegantes, Farrapos, São Geraldo e Floresta. Ao todo, o estudo, conduzido por uma equipe multidisciplinar, levou em conta sete categorias: vida familiar, saúde, moradia, bens e meios de subsistência, acesso a itens básicos, aspectos sentimentais e qualidade de vida. Na condução do levantamento, foram realizadas pesquisas domiciliares, rodas de conversa nas comunidades, entrevistas com atores chaves e voo de helicóptero, para poder visualizar focos de lixo, por exemplo. O relatório teve como hipótese de partida que os impactos sociais do desastre geralmente vão além do que mostram os registros oficiais.
Na apresentação da pesquisa, a consultora do Banco Mundial, Pauline Cazaubon, mostrou que um quinto dos domicílios da região do 4o Distrito declarou que, após a inundação de 2015, pelo menos um membro da família contraiu algum problema de saúde. A maior deles era psicossocial, mas questões físicas, principalmente transmissíveis pela água, também se mostraram bastante presentes. Um terço deles também disse que, no momento da pesquisa, a deficiência persistia. A danificação das moradias foi apontada por um quarto dos entrevistados nos bairros e dois terços dos moradores das ilhas do Guaíba, que tiveram ainda perda total das residências. As famílias de menor renda foram relativamente mais atingidas.
O especialista em gestão de risco de desastres do Banco Mundial, Frederico Pedroso, explicou que as soluções apresentadas por vezes podem ser medidas simples, como qualificação das rotas de fuga. O relatório, de acordo com ele, contempla recomendações estruturantes, como investimento em macrodrenagem e melhoria nas casas de bomba, e não-estruturantes, como maior interação com a Defesa Civil, melhor capacitação das comunidades e sistema de alerta precoce através do monitoramento do Guaíba. O estudo não apresenta indicativos de quanto seria necessário investir para cada solução, mas tem o intuito de servir como um produto para prefeitura e comunidade, por meio do Orçamento Participativo (OP), além de uma forma de o Banco Central observar onde poderia contribuir na forma de financiamento. A partir de agora, será constituído o Grupo de Ação Contra Inundações e Alagamentos (Gaia) que deverá se debruçar sobre o documento.
O coordenador do Projeto Porto Alegre Resiliente, Rodrigo Corradi, afirmou que a meta, a partir de agora, é iniciar a gestão do Gaia, que, com o relatório, tem em mãos uma rota de atuação para ações efetivas a curto e médio prazo. De acordo com ele, apesar de não ter investimentos definidos, muitas das soluções contempladas no estudo já vêm sendo feitas, como a micro e a macrodrenagem do 4o Distrito. Outras, ainda segundo Corradi, dependem mais de questões de articulação do que de recursos propriamente. A região das Ilhas, por sua vez, vive um momento de mudança de paradigma da cidade, porque pela primeira vez será contemplada na revisão do Plano Diretor, e vários dos elementos da pesquisa servirão de substrato para sua elaboração. “Esse trabalho se estendeu para analisar não somente o grande ato, que é a enchente que tivemos em 2015, mas como é o procedimento da prefeitura para lidar com isso, como a sociedade responde a isso e essa curva histórica de como essas comunidades se encaixaram nesses espaços”, explicou.