‘Não vi minuta’, diz Almir Garnier sobre documento da tentativa de golpe

Moraes (no centro) perguntou para Garnier (sentado à frente do ministro) sobre a minuta do golpe Foto: Gustavo Moreno/STF

O STF (Supremo Tribunal Federal) retoma nesta terça-feira (10) o interrogatório dos oito acusados de tentativa de golpe de Estado em 2022, entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

O primeiro interrogado do dia é o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos. Segundo ele, não houve minuta de golpe de Estado, mas somente parte de uma análise do cenário político do Brasil, com informações, por exemplo, sobre caminhoneiros e do processo eleitoral.

“Não vi minuta, vi informações em tela de computador. Não recebi um documento”, garantiu.

Ele confirmou ter se encontrado com o ex-presidente Jair Bolsonaro após a derrota nas Eleições de 2022, mas negou ter colocado as tropas à disposição para uma suposta manutenção do poder. “Nunca falei essa frase”, completou.

“O presidente [Jair Bolsonaro] tinha preocupação com pessoas que estavam insatisfeitas e estavam nos quartéis. Não se sabia para onde ia o movimento”, afirmou Garnier.

Em relação às reuniões após as eleições, Garnier explicou que a principal preocupação do então presidente e dos membros do ex-governo eram as “inúmeras pessoas que estavam, digamos assim, insatisfeitas e se posicionavam”.

Já concluíram esta fase o delator Mauro Cid e o ex-deputado federal e ex-presidente da Abin Alexandre Ramagem.

Mauro Cid

Cid relatou que Bolsonaro apostava em fraude ou pressão popular para tentar reverter resultado das eleições.

“A primeira hipótese era encontrar fraude nas eleições. A outra, por meio do povo radical, encontrar uma fórmula que permitisse reverter a situação.”

Segundo o delator, Bolsonaro recebeu a minuta de golpe e teria “enxugado” o documento original.

“O presidente Jair Bolsonaro recebeu e leu esse documento. E fez algumas alterações no documento. De certa forma, enxugou o documento, retirando as autoridades das prisões”, disse Cid, completando que apenas Moraes foi mantido nessa lista de presos.

Cid reafirmou que não foi coagido a delatar os casos. E que áudios com críticas à delação foram desabafos em meio a crise pessoal.

O advogado de Bolsonaro, Celso Sanchez Vilardi, perguntou se Mauro ouviu de Bolsonaro que, sem a comprovação de fraude nas eleições, não haveria espaço para qualquer tipo de ação institucional.

“A questão era: se não houvesse fraude, nada ia acontecer. Se houvesse fraude, ele agiria. Essa era a lógica. ‘Não foi encontrada a fraude, nada vai acontecer’, foi o que ele repetiu em diversas mensagens a diferentes interlocutores.”

Segundo Cid, essa avaliação era compartilhada desde o início com aliados e militares próximos. Mas sabia que a posição das Forças Armadas não era de golpe.

“Independente do que acontecesse nas eleições, dificilmente algo seria feito. Sem o apoio das Forças Armadas, não teria como seguir com nada”, avaliou.

Cid repetiu que nunca ouviu de Bolsonaro algo do tipo: “‘Temos que achar uma fraude’ ou ‘Precisamos forjar algo para decretar alguma coisa’”. “Não havia esse tipo de condicionante explícito da parte dele”, completou.

Ramagem

Em seguida, Moraes interrogou Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).

Ramagem negou ter participado da divulgação de documentos com críticas ao sistema eleitoral brasileiro.

Ele afirmou que o material atribuído a ele, contendo informações falsas sobre a empresa Positivo e desconfianças sobre as urnas eletrônicas, era um “documento privado” com “opiniões pessoais” que jamais foram compartilhadas oficialmente.

O conteúdo apresenta uma narrativa voltada a desacreditar o processo eleitoral brasileiro e as urnas eletrônicas.

“Tudo o que coloquei nesse documento são anotações pessoais, privadas. Não houve difusão ou encaminhamento. Era algo meu, com opiniões privadas, não oficiais. Não foi compartilhado com ninguém”, afirmou Ramagem.

Dinâmica

As audiências estão sendo realizadas presencialmente na Corte. A única exceção é o interrogatório do general Walter Braga Netto, que será feito por videoconferência, já que o militar está preso.

Estão autorizados a acompanhar os trabalhos o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e os ministros da Primeira Turma: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.

Nesta fase processual, os questionamentos seguem a seguinte ordem: primeiro fala o juiz instrutor, ministro Alexandre de Moraes; depois, o procurador-geral da República; e, por fim, as defesas dos corréus — sempre seguindo a ordem alfabética dos réus.

À frente de Moraes, há uma mesa com dois lugares, onde se sentam o réu da vez e seu advogado. Atrás, foram organizadas oito mesas individuais, separadas por cerca de um palmo, para acomodar os demais réus e seus advogados.

Nas fileiras anteriores, podem se posicionar outras bancas de advogados. Nas laterais superiores da sala, à direita e à esquerda, estão os profissionais da imprensa.

Veja a ordem dos interrogatórios dos acusados de tentativa de golpe de Estado

Os réus estarão sentados da direita para a esquerda, na seguinte ordem:

  • Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens da Presidência;
  • Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência);
  • Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha;
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal;
  • Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
  • Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
  • Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil.

A expectativa é de que o julgamento do “núcleo 1″ ocorra entre setembro e outubro deste ano.