Entenda como o aumento da Selic pode impactar o bolso dos brasileiros

Copom decidiu aumentar a taxa de juros em um ponto percentual, na quinta alta consecutiva

Crédito: Freepik

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central anunciou o aumento de 1 ponto percentual na taxa Selic, que salta para 14,25% ao ano. Essa é a quinta alta consecutiva da taxa, que chegou ao maior patamar desde agosto de 2016. A justificativa do Copom para a elevação foram as incertezas econômicas e o risco inflacionário. A inflação está acima da meta e acumulou 5,06% nos últimos 12 meses. Com o aumento dos juros, a expectativa é da desmotivação do consumo, o que pode frear a alta dos preços.

Para entender o que muda no bolso do consumidor, o R7 conversou com alguns especialistas. Segundo economistas, os impactos giram em torno do crédito, pois a Selic regula a média de juros aplicada nessas transações. Logo, quanto mais alta a taxa, mais restrito é o acesso ao crédito.

Evolução da Selic Luce Costa/Arte R7

PODER DE COMPRA

O economista Hugo Garbe explica que a intenção do Banco Central é justamente segurar os preços por meio do encarecimento do crédito, o que desmotiva a população a comprar. Então, quando a Selic sobe, os juros dos empréstimos, financiamentos e cartões de crédito também aumentam. Com isso, o consumidor acaba por reavaliar seus gastos e adiar compras maiores, como carros e imóveis, segundo o especialista.

Além disso, Garbe ressalta que as empresas podem pisar no freio em investimentos e contratações a partir da desaceleração do consumo devido ao crédito caro. Isso traria consequências para o mercado de trabalho e pode gerar desemprego, o que também diminui o rendimento das famílias, principalmente se a inflação demora a baixar

“Se a inflação demorar a cair, o rendimento real das famílias pode continuar pressionado, tornando o cenário ainda mais difícil para quem já sente no dia a dia o peso do aumento de preços”, diz.

Porém, para que a estratégia seja eficaz para conter a inflação, é preciso entender a origem dela, segundo Garbe. Ele explica que, se o aumento dos preços for impulsionado pelo consumo interno, a Selic deve frear a alta. Se for causado por fatores externos, como a alta do petróleo ou problemas na oferta de alimentos, os juros não podem ser suficientes sozinhos.

INADIMPLENTE 

Garbe avalia que a situação pode se complicar para os brasileiros endividados. Ele afirma que as pessoas que precisam renegociar débitos podem encontrar condições menos favoráveis, pois os bancos ajustam as taxas para cima.

“Dívidas com juros variáveis, como as do cartão de crédito e do cheque especial, podem se tornar ainda mais pesadas. Isso pode levar a um aumento da inadimplência e um crédito ainda mais restrito para os consumidores”, afirma.

O economista Gean Duarte explica que muitos contratos de empréstimo e negociação estão atrelados à Selic, logo, acompanham a alta dos juros. Isso deve prejudicar a recuperação financeira de quem já está no vermelho, segundo ele.

SERVIÇOS

O economista da FGV (Fundação Getulio Vargas) Matheus Dias afirma que o setor de serviços deve encarecer, pois o financiamento de custos com estrutura, equipamentos e insumos fica mais alto, o que impacta no valor final para o consumidor.

Dias explica que o setor é mais inflexível na redução de preços e tende a desacelerar bem menos que outros segmentos da economia, como o dos alimentos. Apesar disso, ele afirma que existe a possibilidade de um cenário contrário, em que o valor do serviço cai para acompanhar a baixa no consumo.

“Você vai aumentar o preço de um serviço que está com a demanda reduzida. Se você não consegue equilibrar as vendas desse serviço, acaba tendo um descasamento entre oferta e demanda, e o preço tende a cair”, diz.

IMPACTOS

Garbe afirma que para quem tem financiamento em aberto ou precisa pegar crédito, o impacto é instantâneo, já que os bancos ajustam rapidamente as taxas. Entretanto, o efeito no controle da inflação deve ser mais lento.

“Como a Selic influencia a economia reduzindo o consumo e o investimento, leva alguns meses até que os preços realmente comecem a desacelerar”, explica.

Dias afirma que os impactos reais para a inflação devem chegar entre 6 e 9 meses, principalmente no preço dos alimentos, pois o aumento da taxa impacta primeiro as etapas de produção.

“Pode ser que a taxa mais elevada faça com que a tomada de crédito por parte de investidores do agro dificulte o financiamento de maquinarias e insumos. Tudo isso pode afetar os preços dos alimentos, mas não é um efeito que acontece de imediato”, analisa.

Para Garbe, essas medidas, que trazem o cenário de crédito mais caro e consumo enfraquecido, podem ter impactos sociais e políticos importantes. Além disso, se os juros altos persistirem, o crescimento econômico pode ser prejudicado, e a confiança dos investidores pode ser abalada caso o equilíbrio fiscal não seja mantido, explica o especialista.

“No fim das contas, o aumento da Selic é uma tentativa de controlar a inflação, mas ele vem com um preço: desaceleração econômica, crédito mais caro e impacto direto na vida dos consumidores. Resta saber se o governo conseguirá equilibrar essa equação sem comprometer o crescimento do país”, avalia.

(*) com R7