Atentado reforça a necessidade de regulação das redes sociais no Brasil

Pelo menos três ministros do STF citaram a responsabilidade das redes sociais nos ataques contra a democracia e nas bombas em frente ao Supremo

Ministros do Supremo apontam redes sociais como responsáveis por grande parte dos ataques às instituições democráticas. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Francisco Wanderley Luiz, autor do atentado em frente ao STF (Supremo Tribunal Federal), era ativo nas redes sociais, principalmente Facebook e Instagram. Também mandava muitas mensagens por WhatsApp. Entre algumas frases desconexas e que, aos olhos da maioria, pareciam sem sentido, havia arroubos de raiva contra o governo, o STF e outras instituições e pessoas, como o próprio Alexandre de Moraes.

Exatamente por causa dessa atuação na web, pelo menos três ministros do Supremo reforçaram a importância de se regulamentar o setor. Fizeram a imediata ligação entre o homem-bomba e atos do 8 de Janeiro, por exemplo. Não à toa, Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito das fake news — que investiga diretamente as redes sociais e chegou a tirar o X do ar —, pegou o caso do atentado para si.

Francisco escreveu: “Tudo o que já foi feito para obtermos melhorias em nosso País e nada deu resultados!!! É hora de mudarmos os caminhos e ações!!! Onde está o grande problema? No judiciário (STF).”

Também fez ameaças diretas. “Polícia Federal, vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas de m.”, escreveu. E mais, em uma foto dele dentro do STF: “Deixaram a raposa entrar no galinheiro (chiqueiro) ou não sabem o tamanho das presas ou é burrice mesmo. Provérbios 16:18 (A soberba precede a queda).”

A discussão das responsabilidades está próxima de acontecer no Supremo. No dia 27 de novembro está marcado o julgamento de três ações que tratam sobre Marco Civil da Internet e plataformas digitais.
O que pensam Moraes, Gilmar e Barroso

Para Moraes, a ligação é direta. “As autoridades públicas, aqueles que defendem a democracia, devem decidir exatamente para que haja responsabilização, para que haja uma regulamentação das redes sociais. Não é possível mais esse envenenamento constante pelas redes sociais”, afirmou o magistrado, durante evento do Ministério Público nesta quinta-feira (14).

Por isso mesmo, o ministro definiu que o ato de quarta-feira “não é isolado de contexto”. “Se iniciou lá atrás, quando gabinete do ódio começou a destilar discurso de ódio contra instituições.” Assim, as pessoas começaram a vir a Brasília “porque foram instigadas por pessoas com altos cargos a atacar”.

“O mundo todo está regulamentando [as redes sociais]. Para que, com isso, aí sim, pacificar o país, voltar a normalidade, sem criminosos querendo, dia após dia, atentar contra a democracia”, argumentou.

O presidente do STF, Luís Carlos Barroso, também apontou as redes sociais como responsáveis por grande parte dos ataques às instituições democráticas. Lembrou que o movimento em estradas e portas de quartéis tinha sido insuflado “pela afirmação criminosamente mentirosa de que teria havido fraude nas eleições”.

“No dia 8 de janeiro de 2023, milhares de pessoas, mancomunadas via redes sociais, e com a grave cumplicidade de autoridades, invadiram e depredaram as sedes dos três Poderes da República”, continuou.

O ministro Gilmar Mendes, em discurso durante sessão no STF, rememorou diversas ocasiões em que as redes sociais foram usadas para divulgação de fake news e ataques à democracia.

“Faço esse registro histórico porque, a meu sentir, a revisitação dos fatos que antecederam aos ataques de ontem [quarta] é pressuposto para a realização de um debate racional sobre a defesa de nossas instituições, sobre a regulação das redes sociais (julgamento este que se avizinha) e sobre eventuais propostas de anistiar criminosos”, concluiu.

Regulação das redes sociais

Uma das ações que será analisada no dia 27 no STF discute se o artigo 19 do Marco Civil da Internet é constitucional ou não. Esse artigo exige que uma ordem judicial específica seja emitida antes que sites, provedores de internet e aplicativos de redes sociais sejam responsabilizados por conteúdos prejudiciais publicados por outras pessoas.

Em outra, os ministros vão analisar a responsabilidade de provedores de aplicativos ou de ferramentas de internet pelo conteúdo gerado pelos usuários e a possibilidade de remoção de conteúdos que possam ofender direitos de personalidade, incitar o ódio ou difundir notícias fraudulentas a partir de notificação extrajudicial.

Na terceira, os ministros devem decidir sobre a possibilidade de bloqueio do aplicativo de mensagens WhatsApp por decisões judiciais, analisando se a medida ofende o direito à liberdade de expressão e comunicação e o princípio da proporcionalidade. A matéria foi tema de audiência pública realizada em julho de 2017.