Moradores do bairro Lami, no extremo Sul de Porto Alegre, ainda permanecem com a sensação de abandono depois da enchente de maio. Mesmo após a realização de alguns serviços de conservação de vias, realizado pela prefeitura, a comunidade não acredita que o espaço seja revitalizado até o verão. Outro ponto de preocupação são as avaliações das casas e terrenos que estão sendo realizadas para a liberação do benefício de compra de imóveis.
Leonel Hoch, conhecido como Nelinho, é morador do Lami há mais de seis décadas. Ele aproveitou o domingo de tempo aberto na Capital para continuar a limpeza do terreno, onde antes da enchente, havia cinco casas. Entre os escombros e uma bandeira do Brasil – que ficou presa na sua cerca durante a enchente e que ele fez questão de deixar pendurada – o aposentado teme ser obrigado a deixar o local para uma região da qual ele não tem nenhuma afinidade. Ele acredita que sua saúde não aguentaria.
“Aqui é o paraíso, eu tenho passarinhos que comem na minha mão. Se eles dessem o dinheiro na nossa conta a gente compra aonde a gente quer, mas querem empurrar. Como é que eu vou sair daqui, morar em apartamento, não tem como. Eles querem socar as pessoas contra a vontade nos lugares, as pessoas têm raiz aqui”, diz relatando que há falta de clareza sobre o futuro das famílias afetadas.
Nelinho conta que morava com nove filhos e três netos no terreno devastado pelas águas, e mesmo com o nível da água acima de um metro, não saiu de casa. Sua família está temporariamente na casa de parentes, aguardando respostas da prefeitura sobre os próximos passos e a liberação de benefícios. “Se eu não tenho direito a receber, quem tem?”, questiona afirmando que só recebeu o valor do auxílio reconstrução, de R$ 5.100.
Um grupo de moradores conta que as vistorias estão em andamento, mas muitas dúvidas persistem na comunidade. Especialmente entre aqueles que tiveram as suas casas transformadas em ruínas.
Antônia Hoch acredita que os processos serão lentos e que ações concretas só ocorrerão após o período eleitoral. “Se alguém vier aqui e disser que vai restaurar isso aqui para o verão, tá mentindo. A gente nem chegou a se restabelecer da outra (enchente). Eu na realidade eu não vejo expectativa nenhuma. Depois de março é que a gente vai saber se acontece alguma coisa”, declara. Ela ainda lembra que o bairro está próximo de enfrentar outro episódio conhecido como a enchente de São Miguel, que ocorre no mês de setembro.
A titular da Secretaria Municipal de Habitação e Regularização Fundiária, Simone Somensi explica que as equipes técnicas começaram as avaliações das residências no Lami no dia 15, e até o final do mês de julho será concluída a primeira etapa com 3.400 laudos. Esses processos serão encaminhados para a Defesa Civil Nacional que fará a validação para a liberação do benefício do programa federal Compra Assistida, com o valor máximo de R$ 200 mil para a aquisição de imóveis.
“O Demhab (Departamento Municipal de Habitação) monta os planos de ações e faz a indicação de quem é o dono do imóvel”, diz. Ela ainda observa que os imóveis disponíveis para o programa federal serão os de mercado, que estão regularizados e fora das áreas de risco.
“Estamos orientando as pessoas conforme as regras que temos no momento. São programas habitacionais novos, e estamos começando a entender. As pessoas têm anseios para que as coisas aconteçam logo, mas é um processo complexo e vamos dar as respostas na medida do possível”, destaca.
A secretária ainda sublinha que o benefício municipal, que garante o pagamento de R$ 127 mil, é o Bônus-Moradia. Esse já está disponível para 37 famílias moradoras de casas construídas irregularmente em cima do Dique da Sarandi, na Zona Norte, e que tiveram de ser removidas para a recomposição de alguns pontos da proteção contra cheias.