Câmara aprova urgência de projeto que equipara aborto a homicídio

Medida foi aprovada de maneira simbólica e apenas PSOL e PCdoB se manifestaram contra

Prefeituras nas eleições de 2024 Prefeituras nas eleições de 2024. Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados

Em uma votação relâmpago e sem debate, a Câmara aprovou nesta quarta-feira (12) a urgência do projeto que torna a punição para algumas situações de aborto similar à pena de homicídios. O projeto ainda não tem data para ser votado no plenário.

Nenhum deputado contestou a condução incomum por parte de Lira durante a votação. O presidente da Câmara mencionou um acordo feito com as bancadas, sem detalhar do que se tratava, e declarou a matéria aprovada em apenas 23 segundos de maneira simbólica. “Em votação pelo acordo feito”, falou Lira.

O requerimento aprovado acelera a tramitação da iniciativa e faz com que ela possa ser pautada diretamente em plenário, sem precisar passar por comissões. O projeto é de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que já liderou a bancada evangélica.

A deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP) criticou a aprovação que, segundo ela, criminaliza crianças e adolescentes vítimas de estupro. Ela afirmou que mais de 60% das vítimas de violência sexual têm menos de 14 anos. “Criança não é mãe, e estuprador não é pai”, disse.

Atualmente, o aborto é permitido no Brasil em três situações: quando a mulher corre risco de morte e não há outra alternativa para salvá-la, em casos de fetos com anencefalia (ausência de cérebro ou de parte dele), e em casos de estupro. Mesmo com essas previsões legais, é comum que as pessoas que recorrem ao direito enfrentem dificuldades para acessá-lo.

Segundo o Código Penal, não há punição para quem realiza o aborto quando a gravidez é resultante de violência sexual, e o procedimento pode ser feito sem restrição de tempo. Também não são punidos os casos em que o aborto é a única forma de salvar a vida da gestante.

Fora dessas situações, a legislação vigente prevê penas tanto para as gestantes quanto para os médicos ou outras pessoas que realizam o aborto. Para as gestantes, o Código Penal prevê detenção de um a três anos. Para terceiros, a pena é de um a quatro anos se o aborto for realizado com o consentimento da gestante, e de três a 10 anos se o aborto for realizado sem o consentimento.

O novo texto proposto sugere que o aborto legal seja criminalizado acima de 22 semanas em todos os casos previstos, com pena equivalente à de homicídio simples, de seis a 20 anos de reclusão, inclusive nos casos de estupro. Atualmente, a pena média para estupradores é de seis a 10 anos.

O projeto foi apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), e é apoiado por outros 31 deputados, majoritariamente homens do PL. Segundo eles, o fato de a lei não prever “limites gestacionais ao aborto” não significa que os legisladores do Código Penal quisessem “estender a prática até o nono mês de gestação”.

O requerimento de urgência para a votação do projeto de lei foi protocolado algumas semanas após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspender uma medida do Conselho Federal de Medicina (CFM) que dificultava o acesso ao aborto legal após 22 semanas para vítimas de estupro. A resolução do CFM proibia a técnica de assistolia fetal, recomendada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) em casos de gestação superior a 22 semanas, frequentemente utilizada em casos de estupro onde a vítima, muitas vezes crianças, descobre a gravidez muito tempo após a violência sexual.

Paralelamente, o ministro Nunes Marques pediu destaque no julgamento do STF sobre a resolução do CFM, o que significa que a votação — que estava 1 a 1 no plenário virtual — será transferida para o plenário presencial da Corte, ainda sem data definida. Uma vez que todos os magistrados terão que votar novamente, o placar do julgamento será zerado. Os ministros Alexandre de Moraes (relator) e André Mendonça, que já tinham votado, terão que se manifestar novamente.

O pedido de destaque tende a atrasar o desfecho do processo, e a expectativa é de que o julgamento fique para o próximo semestre, devido à proximidade do recesso do Judiciário. Enquanto isso, permanece válida a decisão individual de Alexandre de Moraes, que suspendeu os efeitos da resolução do CFM.