Morador que agrediu porteiro de condomínio em Porto Alegre será indiciado por racismo, diz Polícia

Inquérito será concluído após a oitiva de testemunha; caso ocorreu no dia 21 de fevereiro

Um homem de 35 anos vai responder por injúria racial, lesão e ameaça, após agredir o porteiro do condomínio onde morava, na rua Álvaro Alvim, no bairro Rio Branco, em Porto Alegre. A informação foi divulgada pela Polícia Civil, em coletiva nesta sexta-feira. O inquérito será concluído após a oitiva de um motoboy, que presenciou os fatos.

O caso ocorreu no dia 21 de fevereiro. A vítima, um homem negro de 53 anos, teria sido agredida pelo suspeito, branco, por não permitir a entrada de um motoboy no prédio, porque ele não sabia o apartamento correto para a entrega de um lanche.

A companheira do agressor ligou para o telefone da portaria e foi informada que o entregador havia ido embora, com o pedido. Segundo o porteiro, na mesma ligação, o morador teria feito ataques de cunho racista, como ‘macaco’ e ‘negro de bosta’.

O morador então foi até a portaria e agrediu o funcionário com socos no rosto, antes de ser contido por um vizinho e pelo síndico. A cena durou cinco minutos e foi registrada por câmeras de segurança.

Após a chegada da Brigada Militar e o acionamento do Samu, o porteiro foi levado para atendimento médico no HPS e depois fez exame de lesões corporais no DML. Ele teve lesões na face, principalmente na região dos olhos, está afastado do trabalho e recebe auxílio psicológico. A polícia informou ainda que a vítima sofre de glaucoma, e ficou com sequelas.

Na versão do porteiro, os policiais militares não teriam dado atenção às denúncias sobre racismo e a ocorrência acabou sendo registrada apenas como lesão corporal. Em nota, a instituição alegou que ‘em momento algum’, a vítima informou os soldados sobre xingamentos racistas. O comunicado também reafirma o repúdio da BM a atos de violência, discriminação e racismo.

Conforme a Polícia Civil, o suspeito deixou o condomínio no último sábado. Ele admitiu as agressões, mas negou ter cometido crime de racismo.

O caso é investigado pela titular da DP de Combate à Intolerância, Tatiana Bastos. Ela destacou que a vítima foi ouvida na segunda-feira, mesmo dia em que realizou exame de corpo de delito no IGP, cujo laudo ainda não foi acostado aos autos. Três testemunhas presentes no local dos fatos foram ouvidas na terça feira e o agressor foi interrogado nesta manhã. Uma quarta testemunha, o motoboy, prestará esclarecimentos nos próximos dias.

A delegada conta que vítima e agressor tiveram ao menos outras duas brigas, em 2021 e 2022. Em ambos os casos o porteiro teria sido alvo de racismo.

Na última ocorrência, apesar das supostas ofensas racistas terem ocorrido via ligação, testemunhas relatam que o morador exigia que o porteiro o chamasse de “senhor” e insistindo, sob ameaças, que ele fosse demitido. A delegada explica que a conduta pode ser tipificada como racismo.

“Não é raro que as pessoas não se percebam como vítimas de racismo. Elas acabam se acostumando, até por uma questão de sobrevivência, e por vezes nem notam. Foi o caso do porteiro. As testemunhas confirmam que o agressor tinha ‘ar de superioridade’ e demonstrou menosprezo pela vítima, por conta da cor da pele”, afirmou Tatiana.

O diretor do Departamento Estadual de Proteção a Grupos Vulneráveis (DPGV), delegado Christian Nedel, enfatizou que o departamento trabalha com temáticas sensíveis e destacou o papel da DP de Combate à Intolerância. “A Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância tem um papel fundamental na preservação dos direitos humanos das pessoas que estão em situação de hipossuficiência e vulnerabilidade. Aqui, neste caso específico, de vítimas de crimes raciais e crimes de intolerância”.