Agentes socioeducadores estão em desacordo com a suspensão das atividades em uma unidade da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (Fase), marcada para fechar as portas no dia 31 de outubro. Comunicada aos quadros da instituição em agosto, a decisão vem sendo criticada pelos servidores, que apontam falta de diálogo e pedem mais transparência à gestão.
Localizado na Vila Cruzeiro, na zona Sul, o Centro de Atendimento Socioeducativo Regional de Porto Alegre 1 (Case Poa 1) está em funcionamento há quase 25 anos, direcionado para a internação de adolescentes com perfil menos agressivo e também aos egressos em primeira passagem. Os funcionários contam que, a partir dessa proposta, a unidade prioriza a aplicação de métodos pedagógicos, ao invés daqueles de caráter punitivista e de contenção.
“Cada unidade tem um programa [de socioeducação], sendo que o dessa é menos tensionado. Nos últimos meses, foi a única casa que não registrou motins e nem agressões aos funcionários. Lá os adolescentes ficam menos enclausurados, por isso ficamos sem entender os motivos do fechamento. Nos preocupa a gestão decidir fechar um local onde a socioeducação tem se desenvolvido com tamanha qualidade e dedicação”, afirmou Edgar Costa, diretor do Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e Fundações do RS (Semapi).
O fim do Poa 1 também não agradou os internos, explicou Costa, que estariam com receio de serem transferidos para outras unidades. “Não há diálogo com os adolescentes e nem acompanhamento. Esse processo está sendo feito da maneira mais traumática possível para eles”, declarou.
A diretoria da Fase, em nota chancelada pela 3º Vara da Infância e da Juventude, destaca que a redução no número de internos é um dos motivos para o encerramento do programa. Consta no documento também que motins, somados ao afastamento de servidores, tornaram necessário o envio de socioeducadores do Poa 1 para outros unidades. Por fim, o texto menciona defasagens na estrutura arquitetônica do prédio, enfatizando que essas foram alvo de apurações sobre irregularidades.
“Fechar uma unidade por conta do baixo número de internos, a grosso modo, até poderia fazer sentido. No entanto, a Fase está sem um diretor de recursos humanos, que seria a pessoa qualificada para avaliar isso”, disse Costa. De acordo com ele, a instituição está há três meses sem um responsável no cargo.
Ainda conforme o diretor do Semapi, a redução no número de adolescentes apreendidos é uma orientação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que prioriza a internação de jovens que cometeram delitos graves. Porém, segundo ele, a diminuição da população de internos em Porto Alegre ocorreu de forma mais acentuada graças ao entendimento da titular do 3ª Juizado da Infância e Juventude, Karla Aveline. “Há uma revisão dos delitos para internação que reduziu o número de internos em todo o Brasil. Em Porto Alegre, isso ocorreu de forma geometricamente ampliada, em comparação ao restante do país e ao interior”, relatou.
Em uma das ocasiões em que expôs seu posicionamento, em 2021, a juíza citou o poema ‘Vida Loka’, de Sérgio Vaz, ao recusar uma acusação por tráfico de drogas contra um adolescente. “Esses vidas mansas estão esvaziando as cadeias e desempregando os Datenas. A Vida não é mesmo loka?“, diz um trecho da poesia. Ainda no mesmo ano, em uma entrevista, ela reconhece que estava ‘tensionando’ a Fase ‘sistematicamente em todos os âmbitos da socioeducação’. O espaço está aberto para manifestações da juíza.
Contatada pela reportagem, a Fase informou que está realizando um mapeamento sobre o funcionamento das unidades. A instituição destacou que, quando o levantamento for concluído, detalhará publicamente os encaminhamentos.
Leia a nota da Fase:
A Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) informa que está realizando um mapeamento sobre o funcionamento das suas unidades.
O levantamento leva em conta a rotina, população atual, vagas disponíveis, corpo de servidores, entre outros.
Quando concluído, a Fase detalhará publicamente os encaminhamentos.