Pautas importantes se acumulam na Câmara de Porto Alegre

No Legislativo, o processo de revisão do plano diretor é colocado como prioridade, mas pode ser adiado novamente

Foto: Gabriel Ribeiro / CMPA / Rádio Guaíba

Decisões que vão impactar no cotidiano dos porto-alegrenses estão tendo as votações adiadas na Câmara de Vereadores da Capital. O processo de revisão do plano diretor, que orienta a gestão do desenvolvimento urbano sustentável do município e reúne o interesse popular e de vários setores da sociedade, como o mercado imobiliário, está entre elas, assim como a concessão do Departamento Municipal de Águas e Esgoto (Dmae) à iniciativa privada e a extinção do benefício da licença-prêmio aos servidores públicos municipais.

A cerca de um ano das eleições nos municípios, é natural que as atividades eleitorais comecem a aparecer nos trabalhos do Legislativo. As movimentações na Casa indicam que o presidente no próximo ano será o vereador Mauro Pinheiro (PL), que já exerceu o cargo em 2015, eleito pelo PT. Ele diz que o ano de eleição “sempre tem algumas peculiaridades, mas tem que ter um certo controle para conseguir votar projetos, sendo um vereador experiente, é mais fácil conciliar isso”, finaliza.

Nos bastidores, há o incentivo de alguns parlamentares para uma dobradinha do atual presidente Hamilton Sossmeier (PTB). No entanto, o regimento não permite que a Câmara tenha repetição de presidente na mesma legislatura.

Cobranças para o envio do plano diretor

Protelando há três anos, o plano diretor de Porto Alegre deverá ser enviado em dezembro à Câmara de Vereadores. Programado para ser revisado a cada década, o plano orienta o planejamento do desenvolvimento urbano sustentável do município e, no âmbito do Legislativo, já está dividido em sete eixos temáticos para a reformulação, aguardando o envio do Executivo para o aprimoramento das discussões e a formalização dos grupos de trabalho.

O plano diretor tem impacto direto na qualidade de vida dos moradores do município e estabelece regras e diretrizes para o desenvolvimento urbano. Orienta as políticas públicas que abrangem o uso do solo, ocupação territorial, saneamento básico, habitação, mobilidade urbana e meio ambiente.

Preocupado com o atraso no envio do plano, o presidente Hamilton Sossmeier argumenta que, se não for apreciado neste ano, “a discussão vai partir para o lado ideológico e não o lado mais técnico e racional, o que a população espera”. “Foi feito um apelo para que esse projeto venha logo para ser discutido. A parte da Câmara já foi feita, aguardamos agora a prefeitura”, complementa Sossmeier.

O vereador Engenheiro Comassetto (PT), que integrará a comissão de discussão do plano diretor, sustenta que “um ano eleitoral pode trazer desafios adicionais, pois as discussões podem ser influenciadas por interesses políticos temporários, em detrimento do planejamento de longo prazo”. Ainda, para Comassetto, “é compreensível que sua revisão seja um processo complexo e demorado, uma vez que ele impacta diretamente a vida de toda a população e o território como um todo”.

Já o secretário municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), Germano Bremm, avalia o processo eleitoral do próximo ano como uma “oportunidade de produzir um debate sobre o futuro da cidade” e que, embora a revisão do plano diretor “possa eventualmente se misturar com o próprio debate eleitoral, é o debate sobre o futuro da cidade”.

Conforme Bremm, a reformulação do projeto “evoluiu da etapa de leitura da cidade” e a prefeitura trabalha para “compatibilizar a leitura comunitária cruzando com a leitura técnica” e está “entrando na etapa de propostas”. Espera, assim, que, em novembro, seja realizada a conferência para a revisão do plano e que a remessa à Câmara seja feita até o final do ano.

Concessão do Dmae está “silenciada pelo prefeito”, diz Sossmeier

Das pautas polêmicas na Casa, moldam, desde o início do ano, as ideias de conceder parte do Dmae à iniciativa privada e de extinguir o benefício da licença-prêmio aos servidores públicos municipais.

A pauta que diz respeito ao Dmae está “silenciada pelo prefeito”, segundo Sossmeier. Na mesma linha do projeto do plano diretor, o presidente acredita que, se for entregue à Câmara no próximo ano, a proposta será “muito emblemática em questões ideológicas” e conta que, antes do recesso parlamentar, o prefeito havia sinalizado com o envio do texto, mas “após o período de recesso, não ventilou sobre o tema em nenhum momento”.

O desenho do projeto prevê que parte da autarquia municipal seja repassada para a iniciativa privada, que ficaria responsável pela coleta e tratamento de esgoto, distribuição de água e gestão comercial, pelo período de 30 anos. Sob o guarda-chuva da administração pública, permaneceriam a coleta e o tratamento de água.

“Acredito que pode seguir ainda esse ano, mas depende da atualização de alguns pontos do estudo técnico”, fala Ricardo Gomes (PL), vice-prefeito, que coordenou grupo de trabalho que propôs os termos da concessão. Ele afirma que o governo está “em linha finais com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social)”, responsável pelo detalhamento do modelo de concessão.

Roberto Robaina (PSol), líder da oposição no Legislativo, afirma que será traçada uma estratégia da oposição quando o projeto for enviado.

Extinção da licença-prêmio fora da priorização

Já com as discussões iniciadas no plenário, o texto que visa extinguir a licença-prêmio saiu da pauta de votações e, até o momento, o prefeito não pediu o retorno à ordem do dia para apreciação. Uma emenda, do vereador João Bosco Vaz (PDT), visa transformar a licença-prêmio em uma licença para capacitação dos servidores. Da vereadora Cláudia Araújo, outra emenda pretende que os períodos do benefício adquiridos e não usufruídos sejam convertidos em pecúnia.

Pela atual regra do município, após cinco anos de serviço com assiduidade, os funcionários públicos têm o direito de se afastarem das funções por três meses, como uma espécie de bônus.

Robaina diz que monitora o projeto da licença-prêmio, que “está desde o dia 9 de agosto dormindo na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) à espera de designação de relator”. Antes do recesso parlamentar, o líder afirmou que a “não votação” desses projetos, incluindo a concessão do Dmae, era uma vitória para a oposição.

Reflexo das CPIs e excesso de moções

“Eu acredito que o clima não muda, vai ser esse desgaste até o final do ano”, prevê Sossmeier, pontuando que as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) que investigam supostas compras irregulares na Secretaria Municipal de Educação (Smed) vão “esquentando o clima” conforme as novidades surgem na rotina da Câmara.

Todas as segundas e quintas-feiras, no período da manhã, as reuniões das comissões, com o mesmo objeto de apuração, ocorrem no plenário. Desde o seu início, o enredo é conflituoso e estende as movimentações na Casa para fora das reuniões.

Outro ponto, os excessos de proposições que abrangem homenagens, moções, frentes parlamentares e denominações, podem receber novas regras. Partindo do vereador João Bosco Vaz, dois projetos pretendem limitar a criação de frentes e de moções para duas por ano para cada vereador.

Segundo Bosco, “a Câmara tem se debruçado por votar, desde o início do ano, moções de apoio ou de repúdio” e diz ter tomado uma posição de “não votar moção nem para um lado, nem para o outro”. Sobre a proposta de demarcar as frentes parlamentares, acredita que “o vereador não consegue dar conta do plenário, da comissão permanente e de uma ou duas frentes parlamentares”.

A pauta que limita a criação de frentes parlamentares, no entanto, teve o prazo expirado na CCJ, nas mãos do relator Márcio Bins Ely (PDT), sendo repassada ao vereador Tiago Albrecht (Novo).

Ex-presidente da comissão, Márcio comenta que “geralmente, a CCJ, por uma questão de alinhamento de metodologia e procedimento, não designa a relatoria para vereadores do mesmo partido para haver isenção”. Apesar do projeto ser do parceiro de sigla, é contrário ao mérito, por acreditar que deve ser uma decisão da Mesa Diretora da Casa e que as frentes são mais uma forma de trabalho dos parlamentares.