Após protesto contra venda de praça, Melo pede retirada de projeto da pauta da Câmara

Desafetação de 60 metros quadrados da Praça da Família Imigrante, em Porto Alegre, causou indignação da comunidade

Foto: Guilherme Almeida/Correio do Povo

Moradores do Centro Histórico de Porto Alegre protestaram, nesta segunda-feira, contra um projeto de lei complementar da Prefeitura que desafeta – ou seja, vende propriedade pública para outro ente – a Praça da Família Imigrante, na rua Riachuelo, quase esquina com a Caldas Júnior. O prefeito Sebastião Melo protocolou o texto em 30 de junho, e a votação era prevista para esta segunda-feira na Câmara Municipal, o que espantou comerciantes e frequentadores. Os manifestantes alegaram falta de diálogo sobre o assunto. Após o protesto, Melo pediu a retirada da proposição da pauta de votações.

O projeto aliena a praça à empresa Machado Paiva Participações Ltda., proprietária do Edifício Tuyuty, localizado na esquina das duas vias e utilizado pelo Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição Imobiliária de Porto Alegre. Os moradores e a prefeita da praça, a comerciante Marcia Quatrin Peripolli, dizem que o cartório prevê cortar árvores e descaracterizar a paisagem existente. Hoje, a praça, cercada, conta com um portão, aberto de segunda a sábado, das 8h às 19h. De acordo com os moradores, o edifício Marília, que fica no outro lado da praça, custeou o cercamento.

“Este processo afeta principalmente na biodiversidade. Nosso espaço já é pequeno, e a ideia é que haja uma construção de mais de 100 metros quadrados, fazendo da praça um canteiro de obras. Queremos um diálogo com esta nova empresa e o cartório que está vindo para cá”, comenta Marcia. Ela conta que, no início da proposta, em 2021, se mostrou favorável ao projeto porque a Machado Paiva havia prometido fazer melhorias na praça e manter o diálogo com os moradores, o que não aconteceu.

“Mandei e-mail no ano seguinte a um funcionário do cartório falando das nossas ideias de parceria, mas nunca tivemos um retorno. Pensamos, então, que o prédio não tinha sido comprado. Na sexta-feira, para nossa surpresa, vimos que a venda deste pedaço da praça estava para a votação hoje. Nos assustamos, porque, depois que tiverem a posse, vão poder fazer o que quiserem. Não digo que agiram de má-fé, só estamos esperando o diálogo”, acrescentou Marcia. A Prefeitura, no projeto de lei, busca desafetar uma área de 60,9 metros quadrados, avaliada em R$ 154 mil.

Representante do cartório, Régis Borges esteve presente no protesto e disse ser a favor da conservação. Ele deu uma versão diferente do ocorrido. “Fomos surpreendidos, porque era um trabalho que vínhamos fazendo com os moradores. Chamamos o síndico do Marília e foi repassada uma carta a todos eles, além de termos conversado com os habitantes do entorno. Porém, o processo foi demorando, porque se trata de um edifício histórico. Nossa ideia não é e nunca foi retirar a praça daqui”, afirmou ele.

Conforme Borges, o cartório necessita de um “pequeno espaço, equivalente a 10% da praça, para exigências do plano de incêndio”, para a construção de uma escada de emergência, além da ampliação de uma área no canto norte do edifício, no lado contrário do portão, para a ampliação da área de atendimento do local. Segundo Marcia, o movimento viralizou de forma espontânea, atraindo a atenção de vereadores como Jonas Reis e Abigail Pereira, além de deputados estaduais.

Ela própria contou que somente soube do interesse do cartório por meio de outra prefeita de praça da área central. “Comecei a cuidar, irrigar, colocamos uma banda para tocar aqui, fizemos meditações guiadas, aulão de ioga, então queremos ganhar tempo agora e somente dialogar com o pessoal do cartório. Somos a favor de colocar este prédio em funcionamento. Porém, queremos entender o que está acontecendo”, disse.

Em nota, a Prefeitura disse que Melo vai conversar com Marcia e “ouvir a comunidade para avaliar o projeto”. Acrescentou ainda que a proposta em si busca “qualificar” a praça, e que o projeto recebeu parecer favorável da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus). O Executivo também confirmou que a praça vai ser adotada pelo Registro de Imóveis, que vai assumir a “preservação, revitalização e manutenção permanente do espaço, proporcionando melhor utilização pelos cidadãos”. A receita com a venda de parte do terreno deve ser revertida ao Fundo Municipal para Restauração, Reforma e Manutenção do Patrimônio Imobiliário do Município de Porto Alegre, encerra a Prefeitura.