Câmara aprova PEC e reforma tributária avança para o Senado

Votação em segundo turno ocorreu na madrugada desta sexta-feira

Foto: Zeca Ribeiro / Agência Câmara

A Câmara dos Deputados aprovou em segundo turno, na madrugada desta sexta-feira, a primeira proposta de reforma tributária em quase 30 anos no país. Foram 375 votos a favor e 113 contra, com três abstenções. Mais cedo, a votação em primeiro turno teve placar de 382 a 118, também com três abstenções. Eram necessários 308 votos a favor em cada etapa.

Antes da finalização do texto-base, os deputados também aprovaram uma emenda aglutinativa – ou seja, um texto que junta todas as alterações recentes feitas pelo relator. Quatro destaques – com os quais os parlamentares ainda pretendem mudar partes do texto – devem ser votados, em segundo turno, a partir das 10h desta sexta.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 495/19, que altera e simplifica o sistema tributário brasileiro, avança agora para o Senado Federal.

Foram mais de 12 horas de discussão e votação. O plenário da Câmara se reunia desde o início da sessão, às 11h dessa quinta, A aprovação em segundo turno só ocorreu perto da 1h40min desta sexta.

No Senado, a proposta pode ser discutida e votada durante o segundo semestre. Horas antes da aprovação em primeiro turno, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou que os debates no Senado podem se estender até o fim do ano. “Tem algumas particularidades, acho que é uma Casa que vai precisar de um pouco mais de tempo. E é até bom que se tenha esse tempo”, disse.

Minutos após a proclamação do resultado da votação em plenário, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, publicou no Twitter que “parecia impossível”, mas que “valeu lutar”. Pouco depois, o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, afirmou em redes sociais que a votação favorável da proposta que simplifica os impostos “é mais um passo importante” para a reconstrução e o desenvolvimento do país.

O principal ponto da PEC trata da criação de um único imposto sobre bens e serviços, dividido em um tributo federal e um de estados e municípios.

Veja o que muda

A mudança no sistema tributário do país prevê, neste momento, alterações nos impostos que incidem sobre o consumo.

O texto da reforma estabelece a unificação de cinco impostos existentes hoje:

• PIS, Cofins e IPI (tributos federais): por uma Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS), a ser gerida pela União;
• ICMS (tributo estadual) e ISS (tributo municipal): por um Imposto Sobre Bens e Serviço (IBS), a ser administrado pelos estados e municípios.

Os dois tributos – CBS e IBS – formarão o chamado Imposto sobre o Valor Agregado (IVA).

A proposta aprovada também prevê três alíquotas diferentes:

• Alíquota geral;
• Alíquota 60% menor (o que equivale a 40% da alíquota geral);
• Alíquota zero.

Cesta básica

A cesta básica nacional de alimentos também mantém alíquota zero. De acordo com o texto, fica instituída a Cesta Básica Nacional de Alimentos, “em observância ao direito social à alimentação, cujos produtos poderão ter redução de alíquota a zero”. Uma lei complementar vai definir os produtos destinados à alimentação humana que comporão a cesta e serão reduzidos a zero, mas já está certo que, nesse grupo, vão constar frutas, produtos hortícolas e ovos.

O relator também aumentou, de 50% para 60%, o redutor de alíquotas do IVA que incidirão sobre alguns produtos e setores com tratamento diferenciado. Transporte público, saúde, educação, cultura e produtos agropecuários fora da cesta básica nacional pagarão 60% a menos de IVA.

Além dos produtos da cesta básica nacional, a CBS não vai ser cobrada sobre medicamentos para doenças graves e sobre serviços de educação superior (Prouni). Os demais produtos pagarão a alíquota cheia de IVA.

Trânsito

Segundo a proposta, o período de transição para unificar os tributos vai durar de 2026 a 2032. A partir de 2033, os impostos atuais serão extintos em definitivo. Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator do texto, propõe o início da transição em 2026. Nessa etapa, o CBS vai ter alíquota de 0,9%, e o IBS, de 0,1%.

Apelo dos governadores atendido

Ribeiro atendeu o pedido de governadores e realizou mudanças na governança do Conselho Federativo que vai ser responsável por gerir o IBS.

O relator definiu que a composição da estrutura do conselho vai ter:
• 27 representantes de cada um dos estados e o Distrito Federal
• 14 representantes que serão eleitos, com voto em peso igual, pelos municípios;
• 13 representantes que serão eleitos, com peso do voto ponderado pelo número de habitantes, pelos municípios.

As decisões do conselho serão votadas e aprovadas se obtiverem a maioria dos votos considerando:

• A maioria absoluta dos representantes;
• Se a maioria de representantes dos estados e do Distrito Federal corresponderem a mais de 60% da população do país; e
• Se tiver maioria absoluta de representantes em relação ao conjunto dos municípios e do Distrito Federal;

Veja outros pontos da proposta:

• Imposto seletivo —A versão final do relatório modificou o Imposto Seletivo, que vai ser cobrado sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros, bebidas alcoólicas e bebidas e alimentos com excesso de açúcar. Esse imposto não vai poder ser cobrado sobre itens que paguem IVA reduzido.

A medida evita que o Imposto Seletivo incida sobre itens da agropecuária considerados prejudiciais ao meio ambiente, como agrotóxicos e defensivos agrícolas, por exemplo. A mudança havia sido pedida pela Frente Parlamentar do Agronegócio como condição para aprovar a reforma tributária.

A Zona Franca de Manaus e o Simples mantêm as regras em vigor.

• Regimes específicos de tributação – O relator manteve, ainda, regimes específicos de arrecadação para combustíveis, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde, serviços financeiros e apostas, incluindo, ainda, os seguintes setores: serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, restaurantes e aviação regional.

Esses regimes preveem tratamento diferenciado nas regras de creditamento (aproveitamento de créditos tributários) e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento (em vez do valor adicionado na cadeia).

• Cashback — A emenda constitucional deve prever a implantação de um cashback ou devolução de parte do imposto pago pelos brasileiros de baixa renda. O parecer final informou que o cashback vai ter como base a redução de desigualdade de renda, em vez da diminuição da desigualdade de raça e de gênero. A mudança atende a reinvindicações de parlamentares conservadores, que ameaçaram não votar a favor da reforma em caso de manutenção das expressões.

• Fundo de Desenvolvimento Regional — Criado para estimular o desenvolvimento de estados que não poderão mais recorrer à guerra fiscal (reduções de impostos locais) para atraírem investimentos, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional ficou mantido em R$ 40 bilhões. Diversos estados pediam aportes maiores, de R$ 75 bilhões. A nova versão do relatório, no entanto, não trouxe os critérios para a divisão dos recursos do fundo entre os estados – tema que vai ser definido após a reforma.

• Heranças – Em relação às heranças, o novo relatório isentou do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) as transmissões para entidades sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social. A progressividade (alíquotas mais altas para heranças maiores) fica mantida.