Caso Becker: quinto dia de júri popular começa com debates entre defesas e acusação

Quatro réus prestaram depoimento entre 16h40min e 22h45min desta sexta

Foto: Fabiano do Amaral/CP

O quinto dia do júri popular relativo ao assassinato do médico oftalmologista Marco Antônio Becker, ocorrido em 2008 na zona Norte de Porto Alegre – à época em que ele era vice-presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremers) -, começa às 9h deste sábado, com os debates entre as defesas dos quatro réus e o Ministério Público Federal (MPF), que atua na acusação.

Nesta sexta, foram tomados os depoimentos das últimas cinco testemunhas de defesa (outras quatro, além de cinco de acusação, falaram em dias anteriores) e dos quatro réus, que se manifestaram entre 16h40min e 22h45min. O juiz federal Roberto Schaan Ferreira, da 11ª Vara Federal de Porto Alegre, preside os trabalhos, com a participação de sete jurados – três homens e quatro mulheres.

O médico Bayard Ollé Fisher Santos, acusado de ser o mandante do crime, falou por cerca de uma hora e vinte minutos. O ex-andrologista mencionou os livros que publicou e as palestras que ministrou, dizendo que até hoje recebe convites. O réu afirmou ter estudado Direito para compreender os aspectos jurídicos do caso, incluindo a forma como os advogados pretendiam atuar.

Sem responder às perguntas do MPF, Bayard disse que hoje vive como aposentado, recebendo mensalmente R$ 7 mil. Questionado pelo juiz se havia participado do crime, o réu negou, taxativamente. “É um absurdo, uma injustiça muito grande”, declarou, reforçando em seguida: “Não sei quanto tempo vou durar, mas não quero morrer com essa peste. Eu vivi salvando vidas. Eu era médico de interior. O que vinha tinha que enfrentar. Segui o meu juramento – que era salvar vidas, não matar.”

O ex-médico contou ter sido colega de turma de Becker, e negou qualquer inimizade. Na sequência, sugeriu que pode estar sendo usado para esconder a real motivação do crime. “Becker era tido como defensor da ética médica. Tem estátua sua no Cremers. Se aparecessem os verdadeiros autores [do crime], ficaria muito ruim dentro dessa condição. Eu seria a pessoa mais compatível para que fosse mantida uma imagem”, comentou.

Sobre a relação que tinha com o traficante Juraci da Silva, o Jura, também acusado de planejar o crime, Bayard disse que era somente de “médico e paciente”. E relatou que o último procedimento de saúde no traficante – uma cirurgia de prótese peniana – se realizou em 4 de novembro de 2008, um mês antes de Becker ser assassinado. O médico disse que, à época, ficou sabendo, pela secretária que trabalhava para ele, que Juraci havia apresentado “reações adversas” ao tratamento.

Segundo a depor entre os réus, o traficante usou tempo similar, de uma hora e vinte minutos. Acusado de ter ordenado o assassinato e enviado os executores ao local, Jura também não respondeu aos questionamentos da acusação.

As primeiras perguntas foram de natureza pessoal. Ele afirmou que começou a cumprir pena em 2003 e que fugiu em 2008, sendo recapturado no início de 2010. Comentou que, durante o período em que cumpriu pena na prisão federal de Campo Grande, estudou e concluiu o Ensino Médio. Jura também confirmou ter sido condenado por homicídio e tráfico e que, atualmente, cumpre prisão preventiva.

Em relação ao caso Becker, Juraci negou participação no crime e assegurou que não conhecia a vítima. Além disso, admitiu ter tido contato com Bayard em datas próximas ao crime, mas apenas para tratar do procedimento médico. Questionado pelo advogado sobre que sentimento nutre pelo ex-andrologista, após as sequelas da cirurgia, ele afirmou que, por todo o sofrimento que passou, “se pudesse tinha matado o Dr. Bayard (e não Becker)”. O traficante salientou que não precisava do dinheiro do ex-médico, negou ser matador de aluguel, e disse que as mensagens que trocava com Moises Gugel, acusado de planejar o crime, eram sobre carros e o aparelho peniano que usava.

Os interrogatórios entraram pelo turno da noite. Denunciado por ser o mediador das informações sobre a vítima entre os mandantes, Gugel falou por cerca de duas horas e vinte minutos. Ele afirmou contar hoje com uma remuneração mensal de R$ 3 mil, e que a participação dele no crime é “uma mentira total”. Sobre a relação com o Bayard, declarou que era apenas profissional. Sobre Juraci, afirmou que teve alguns encontros com o traficante, e que ambos falavam de assuntos variados.

Último a ser interrogado, Michael Noroaldo Garcia Câmara – acusado de ser o condutor da moto usada no assassinato – também só respondeu às perguntas do juiz, dos advogados e dos jurados, falando por cerca de vinte minutos.

A fase de debates, que começa neste sábado, abre a possibilidade de réplica e tréplica. Por isso, ainda não há prazo para que a sentença final seja conhecida.

Tese

No entendimento do MPF, o andrologista Bayard Ollé Fischer Santos, alvo de uma investigação ética do Cremers e prestes a perder o diploma, se uniu a Juraci da Silva, que devia favores a ele, para planejar o crime. Já o réu Michael Noroaldo Garcia Câmara, para a acusação, executou o assassinato, e Moisés Gugel, ex-assessor de Bayard, intermediou as conversas entre o médico e Juraci.

Morto a tiros na zona Norte de Porto Alegre, Marco Antônio Becker não participou diretamente, em nenhuma esfera, dos julgamentos envolvendo a cassação de Bayard nos conselhos profissionais, embora tenha recomendado a medida. À época do crime, além de vice-presidente do Cremers, ele compunha o Conselho Federal de Medicina (CFM).