Caso Becker: primeiro a depor, por mais de sete horas, delegado reforça conflito “público e notório” entre vítima e réu

Julgamento vai ser retomado às 9h desta quarta-feira

Foto: JFRS/Reprodução

O primeiro dia do júri popular referente ao assassinato do ex-presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), o médico Marco Antônio Becker, contou, nesta terça-feira, com mais de sete horas de depoimento do delegado responsável pela investigação, Rodrigo Bozzetto. A sessão, suspensa por volta das 21h45min, vai ser retomada às 9h desta quarta-feira. Outras quatro testemunhas de acusação e 11 de defesa ainda devem depor antes dos quatro réus.

Bozzeto relatou que “era público e notório” o conflito entre a vítima e o ex-médico Bayard Ollé Fischer Santos, andrologista acusado de ser o mentor do crime. Na visão do policial, os outros envolvidos participaram “porque eram subordinados” a ele.

“Isso era público e notório, e eu acho que em razão de algum procedimento que não deu certo com um paciente do Dr. Bayard, o Becker [decidiu]: ‘realmente, temos que caçar o Bayard’. Já era algo, que se tornou mais latente. Então, essa linha [de investigação], eu volto a frisar isso: nós tínhamos o doutor Bayard como suspeito desde o início, mas a gente não ficou só nessa linha”, citou o delegado. Outras duas versões investigadas pela Polícia Civil esmiuçaram a vida pessoal da vítima, assim como o envolvimento de Becker com jogos de azar. Porém, ambas foram descartadas ao longo do inquérito. 

Delegado Rodrigo Bozzetto | Foto: JFRS/Reprodução

No entendimento do Ministério Público Federal, Bayard, alvo de uma investigação ética do Cremers e prestes a perder o diploma após a recomendação de Becker (então vice-presidente do Conselho), se uniu a Juraci da Silva, que devia favores a ele, para planejar o crime.  A acusação sustenta ainda que Moisés Gugel, assessor do médico, passou informações sobre a rotina da vítima, e que Michael Noroaldo Garcia Câmara, cunhado de Juraci, executou o plano.

Questionado sobre a participação desses dois últimos, o delegado Bozzetto respondeu que “todos eram subordinados: o Michael [acusado de ser o executor] e o Kiro [Anderson Roberto Farias Bones, conforme o delegado, um segundo executor do crime, mas que em razão de falta de provas o juiz não levou a júri popular], subordinados ao Juraci, e o Moisés [acusado de intermediar as conversas entre Bayard e Juraci], subordinado ao Bayard, essa era a razão. Havia uma hierarquia nas ordens”, completou.

O juiz federal que preside o julgamento, Roberto Schaan Ferreira, da 11ª Vara Federal de Porto Alegre, interviu em determinados momentos, após os promotores federais e os advogados contestarem, mutuamente, a inclusão de argumentações em meio aos questionamentos feitos ao delegado.

Juiz Federal Roberto Schaan Ferreira | Foto: JFRS/Reprodução

Durante a manhã desta terça-feira, havia sido sorteado o Conselho de Sentença, composto por sete jurados – quatro mulheres e três homens. Na chegada ao local, Juraci Oliveira da Silva chegou acompanhado de agentes de segurança, trazido da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), onde cumpre pena por tráfico de drogas. Os outros três réus permanecem em liberdade.

Ainda no começo do dia, os advogados de defesa manifestaram otimismo com o julgamento, em declarações à reportagem do Correio do Povo. O advogado Marcos Vinícius Barrios declarou que o cliente dele, Moisés Gugel, “é vítima de um erro judicial sem precedentes”, e disse confiar que “a sociedade de Porto Alegre saberá depurar a acusação injusta e absolvê-lo ao final”.

A Defensoria Pública da União divulgou uma nota oficial informando que “está pronta para exercer a defesa do réu Michael Noroaldo Garcia Câmara, estando convicta da ausência de provas contra ele no processo”.

A advogada Ana Maria Castaman representa Jura, enquanto o advogado João Olímpio de Souza defende Bayard Ollé Fischer Santos.

Após os depoimentos das testemunhas, a sessão vai prosseguir com os debates orais da acusação e das defesas, com possibilidade da réplica e da tréplica. Ao final, o juiz federal se reúne com os jurados para votação dos quesitos da sentença final.

O processo passou a tramitar na Justiça Federal, que recebeu a denúncia em 2013, após o Superior Tribunal de Justiça interpretar que o homicídio havia sido motivado pela influência que Marco Antônio Becker exercia não só junto ao Cremers, mas também diante do Conselho Federal de Medicina (CFM). 

O assassinato de Becker, que era oftalmologista, ocorreu na noite de 4 de dezembro de 2008, quando ele saía de um restaurante na rua Ramiro Barcelos, no bairro Floresta, na capital. Quatro tiros foram disparados por dois homens, em uma moto. A morte ocorreu em decorrência de uma hemorragia interna.