O vice-prefeito de Canoas, Nedy Marques (Avante), prestou depoimento por mais de duas horas e meia, nesta quinta-feira, à comissão processante da Câmara de Vereadores de Canoas. O colegiado analisa o processo de impeachment ao qual ele responde por ter, supostamente, negligenciado a manutenção do equilíbrio financeiro do contrato de gestão do Hospital Universitário (HU), que entrou em crise e precisou de intervenção judicial, no ano passado.
Em nota enviada à reportagem da Rádio Guaíba, o político disse que “o processo não nasceu das demandas do povo”, mas sim “motivado por uma perseguição do prefeito [de Canoas], Jairo Jorge [PSD], contra aqueles que não compactuam com seu modus operandi”.
Nedy sustenta que esteve presente em todas as etapas do processo e procurou esclarecer cada detalhe, respondendo a todas as perguntas para provar inocência e honrar o mandato. “A questão central de que me acusam teve origem em um contrato irregular e muito suspeito, anteriormente firmado pelo prefeito Jairo Jorge com a empresa gestora do HU, a Funam, que fazia um péssimo trabalho e queria extorquir ainda mais a prefeitura e o dinheiro público, pedindo um aditamento do contrato em vigor. Eu não aceitei”, argumenta, na nota.
O vice-prefeito de Canoas alega que julgou uma irresponsabilidade, depois do afastamento de Jairo Jorge, assinar um aditivo para o qual, segundo ele, inicialmente não havia comprovação de necessidade, e que isso o expunha ao risco de ser punido por improbidade administrativa. “Para garantir a legalidade do tal aditivo era imprescindível receber autorização da Justiça e o parecer favorável do Ministério Público (MP). Também era importante fazer uma auditoria para saber o real o custo para a operação do HU. Como a empresa passou a realizar um péssimo trabalho para forçar o aditivo, ingressamos na Justiça pedindo a intervenção no hospital, para evitar prejuízos no atendimento de saúde à população, o que foi concedido pelo Poder Judiciário após parecer favorável do MP. Somente com a comprovação dos valores necessários, a autorização [judicial] e o parecer do MP, firmamos o aditivo até que uma licitação ficasse pronta”, complementou.
Nedy também alega que, em nenhum momento, houve falta de recursos da prefeitura para o pleno funcionamento do hospital. “A obediência à lei não provocou prejuízos à população. Independentemente de aditivo ou não, a prefeitura sempre repassou todos os recursos necessários para a gestão do HU e não deixamos dívida alguma com o hospital, como afirma o atual prefeito”, escreveu.
Próximos passos do processo de impeachment
Concluído os depoimentos, Nedy vai ter prazo de cinco dias úteis, a contar desta sexta, para consultar o processo e apresentar a defesa por escrito. Após o prazo, em 3 de julho, o relator da Comissão Processante, vereador Eracildo Guilherme Link (MDB), deve emitir o parecer final, pela procedência ou improcedência da acusação.
O vereador Juares Hoy (PTB), membro da Comissão Processante, antecipou à Rádio Guaíba que, caso o parecer final seja favorável à cassação, vai apresentar um relatório paralelo pedindo a absolvição do vice-prefeito. “Em virtude de tudo que ouvi hoje de testemunhas, ex-secretário da Fazenda, interventores, ex-diretores, todos foram unânimes dizendo que [o Hospital Universitário] melhorou a partir da intervenção do vice-prefeito Dr. Nedy. Então, nessas condições, tenho que jogar com a verdade, e a verdade foi essa, transparente. Nesse sentido, apresentarei o relatório se o vereador relator apresentar parecer contrário [à absolvição], pois ele também escutou [os depoimentos] e todos temos absoluta convicção de que ele vai apresentar o relatório pelo arquivamento”, afirmou Hoy.
Questionado sobre um parecer prévio sobre o resultado da cassação de Nedy, o presidente da Comissão Processante, vereador Emílio Neto (PT), disse que ainda está estudando e analisando a documentação. “Embora seja o presidente hoje, como vereador eu também vou votar, então eu também vou me ater muito na defesa apresentada junto com as provas, e tentar trabalhar uma ideia de percepção sobre a denúncia frente à defesa, são cinco mil folhas, então eu preciso analisar e ler a defesa, mas o relatório só pode ser em dois sentidos: o arquivamento ou que a denúncia deve prosperar. Deve levar uns 10 dias ainda para termos algum encaminhamento neste sentido”, declarou, também em entrevista à Radio Guaíba.
Com o relatório final apresentado, e o paralelo também, caso haja, os documentos serão encaminhados ao presidente da Câmara, vereador Cristiano Ferreira Moraes (PV), solicitando a convocação de sessão para julgamento. Nela, o processo vai ser lido integralmente e, na sequência, os vereadores terão 15 minutos cada para as manifestações.
Na sequência, Nedy, ou um procurador que o represente, terão o prazo mínimo de duas horas para apresentar a defesa. Concluída a manifestação, começa a votação para decidir se o vice-prefeito é ou não culpado pelas infrações citadas na denúncia. Para que Nedy tenha o mandato cassado, é preciso que 14 dos 21 vereadores votem a favor do impeachment. Concluído o julgamento, o presidente da Câmara oficializa o resultado.
Se houver condenação, o presidente da comissão expede o decreto legislativo da cassação do mandato do vice. Caso Nedy seja absolvido, o presidente da Câmara comunica o resultado à Justiça Eleitoral.
A Comissão Processante soma 48 dias de tramitação. O prazo máximo é de 90 para que a denúncia não seja arquivada.
Entenda a razão do processo
O pedido de impeachment contra Nedy partiu de uma eleitora, e se baseia em termos de um decreto-lei de 1967, que trata sobre “omitir-se ou negligenciar na defesa de bens, rendas, direitos ou interesses do Município”. Ela sustenta que o vice-prefeito negligenciou o dever de manutenção do equilíbrio financeiro do contrato de gestão do HU, que entrou em crise e precisou de intervenção judicial, no ano passado.
A Câmara de Canoas aprovou a abertura do processo de cassação, em 25 de abril, por 18 votos a favor e dois contra. Em 17 de maio, o advogado do vice-prefeito, Rodrigo Schmitt, entregou a documentação com a defesa prévia. Nas 45 páginas, o defensor também elencou 10 testemunhas para serem inquiridas durante o processo.
O político esteve como prefeito em exercício durante afastamento de Jairo Jorge, de março de 2022 a março de 2023. Nedy e Jairo romperam relações e, nos últimos meses, passaram a trocar acusações. Em caso de novo afastamento do prefeito, que ainda responde a processos judiciais, Nedy reassume – desde que não perca o mandato antes.