Quatro PMs implantaram arma em local de crime, revela inquérito militar sobre morte de lutador na capital

Ao todo, cinco PMs responderão pelos crimes relativos à morte de Mauro Chaulet, em 6 de maio, no bairro Floresta

Foto: Arthur Stoffel/Rádio Guaíba

Quatro policiais militares implantaram uma arma de fogo no local do crime que envolveu o lutador de MMA Mauro Chaulet, morto a tiros, por agentes da corporação, em seis de maio deste ano, na zona Norte de Porto Alegre. Ao todo, cinco PMs responderão pelo ocorrido.

Conforme as conclusões do inquérito policial militar (IPM) sobre a ocorrência, na noite do crime, quatro PMs, de folga, junto com as companheiras, se reuniam em uma festa de aniversário no Auma Bar, no bairro Floresta. Uma pessoa, não identificada, importunou uma das namoradas dos militares, o que deu início a uma briga.

Mauro Chaulet, que havia chegado ao bar junto da namorada, Raquel de Maia Almeida, percebeu a confusão e tentou desarmar um dos envolvidos sem saber que se tratava de um policial. A arma, então, disparou, atingindo a virilha do militar e, de raspão, a companheira de um dos PMs. Ainda conforme os detalhes do IPM, o atleta conseguiu tomar a arma e se deslocou ao estacionamento. Conforme a namorada de Chaulet, a ideia era entregar o armamento a um PM identificado. Quando o atleta saía com o carro, um segurança do bar e dos PMs de folga, amigo do que havia sido alvejado, exigiram a devolução da arma. O lutador, então, deixou o armamento, sendo liberado.

Paralelamente, o 9°BPM, via radiocomunicador, notificou as viaturas de um colega havia sido baleado e tido a arma levada por um civil não identificado. Uma guarnição, com dois policiais do batalhão, chegou ao bar e, sem saber que a arma já havia sido entregue, exigiu a parada do carro do atleta, indicado pelos seguranças do estabelecimento. Chaulet desobedeceu essa ordem e acabou tendo o carro alvejado. Os disparos atingiram o lutador, que morreu na hora, e a companheira dele, que recebeu atendimento médico.

O IPM detalha que, no momento em que o veículo do atleta colide com uma árvore, duas viaturas fazem a abordagem, uma dos PMs que atiraram e outra de reforço, do 9°BPM. Após o chamamento do Samu, mas antes da chegada da ambulância, um outro PM, que também frequentava o bar mas não era amigo dos quatro militares envolvidos na confusão, acessa o veículo acidentado e, em união com os demais, implanta a arma que Chaulet já havia devolvido.

O comandante do Comando de Policiamento da Capital, Luciano Moritz Bueno, detalha: “em seguida, acessou o local do crime outro policial militar, que estava de folga, e também estava no estabelecimento, mas não integrando o grupo junto com os demais, sendo pertencente a uma terceira unidade Operacional da Brigada. Esse militar, em comunhão de esforços com o policial que recebeu a arma de fogo das mãos do Mauro [Chaulet] e com dois policiais militares responsáveis pelos disparos, coloca essa arma de fogo no local do crime. Fato comprovado pelas imagens, que demonstraram o exato momento dessa ação”.

Conforme Moritz Bueno, não se identificou, no IPM, a presença de nenhum civil no local. “Os PMs [de folga] só adentraram e circularam pela cena do crime porque foram reconhecidos pelas guarnições como colegas“, acrescenta. O comandante explica, contudo, que os PMs que atuavam na ocorrência não tinham proximidade com os demais, à paisana. Segundo Moritz Bueno, os militares investigados pertencem a três batalhões diferentes.

Com base no apurado pelo IPM, os cinco policiais militares responderão pelos seguintes crimes:

  • O PM que efetuou os disparos contra o carro de Chaulet vai responder por homicídio com dolo eventual e por fraude processual, ao colocar a arma de fogo no local do crime. O dolo eventual [quando se assume o risco de matar] se baseia no fato de o militar ter sido notificado, via rádio, que o lutador ainda seguia com a arma
  • O segundo PM que integrava a guarnição que efetuou os disparos vai responder por tentativa de homicídio com dolo eventual e por fraude processual, ao colocar a arma de fogo no local do crime
  • O PM de folga que recebeu a arma de Chaulet, na saída do bar, vai responder por fraude processual ao colocar a arma de fogo no local do crime e por prevaricação, por não ter adotado o procedimento correto ao reaver a arma, liberando o lutador sem o registro formal da ocorrência
  • O PM de folga que chegou, depois da confusão, ao local do crime, também vai responder por fraude processual, ao implantar a arma
  • Um quinto PM, em horário de trabalho na noite da ocorrência, vai responder por falsidade ideológica por ter inserido informações falsas em documento policial

Os PMs responderão por transgressões de disciplina de natureza grave, sendo que, para dois soldados, que não possuem estabilidade – pelo fato de terem menos de cinco anos de corporação -, serão instaurados dois procedimentos administrativos disciplinares que podem resultar em demissão. Para outros dois, já estáveis, serão instaurados dois conselhos de disciplina para verificar a capacidade de permanecerem em serviço. O IPM também sugere a instauração de um conselho de disciplina para um quinto soldado. Moritz não detalhou quais militares envolvidos no crime responderão a cada procedimento. 

Os dois PMs da viatura de onde partiram os disparos foram afastados da corporação. Conforme o comandante, os procedimentos só devem ser concluídos em 60 dias. Nenhum dos PMs está preso ou teve pedido de prisão preventiva emitido.

Foram ouvidas, ao todo, 26 testemunhas dos fatos e analisados documentos e 12 horas de filmagens. Também foram solicitadas cinco perícias, sendo uma ainda não concluída: a que deve determinar a quantidade de disparos feitos em direção ao veículo.