O primeiro dia do julgamento dos acusados por um ataque contra judeus, no bairro Cidade Baixa, contou com os depoimentos das três vítimas, ouvidas no salão de grandes júris, localizado no 2º andar do Foro Central I, em Porto Alegre. Os réus são apontados como integrantes de um grupo neonazista, responsável pelo crime, em 2005.
Primeiro a falar, Rodrigo Fontella Matheus depôs por videoconferência. Ele relatou que conversava com amigos na calçada, na esquina entre as ruas Lima e Silva e República, quando ocorreu o ataque. “O que aconteceu foi um atentado antissemita, racista, para tentar nos matar”, afirmou.
Segundo ele, o agressor era um jovem com a cabeça raspada, vestido de roupa preta. Fontella relatou que os amigos foram atacados em frente ao bar Pinguim e que, além do quipá – peça de vestuário utilizada pelos judeus na região da cabeça -, ele segurava nas mãos uma caixa de matzá, alimento composto por pão ázimo sem fermentação, típico da culinária judaica.
Rodrigo disse que não lembra das agressões e que só acordou no hospital. Ele levou quatro golpes de faca, além de socos e pontapés. “Simplesmente fomos atacados”, declarou a vítima que, em razão dos ferimentos, passou por cirurgias e ficou com sequelas, além de ainda sofrer de estresse pós-traumático.
O homem, que atualmente mora no exterior, disse que só não morreu em função do ataque porque seguranças do bar o ajudaram. Ele relatou lembrar vagamente do agressor, que considera ser parecido com um dos réus.
2ª vítima
Segundo a depor, Edson Nieves Santanna Júnior também falou por videoconferência, já que também reside fora do Rio Grande do Sul. No dia do crime, ele disse que conversava em frente ao bar Pinguim, com as outras duas vítimas, o amigo Alan e Rodrigo, que havia acabado de conhecer.
A vítima contou ter ouvido Alan gritar ‘Tem skin!’ e, ao se virar para olhar, levou a primeira facada na barriga. Ao andar em direção ao bar, ele conta que voltou a ser ferido, com outra facada no antebraço.
Embora religioso, diferente das outras duas vítimas, no momento do crime ele não usava o quipá. “Não vi que estávamos sendo cercados, minha atenção estava para a conversa. Eram mais de dez pessoas”, destacou.
Socorrido pelo irmão e a namorada dele, que viram o crime de dentro do bar, Edson relatou ter levado a primeira facada do réu Laureano Vieira Toscani, já condenado, em 2018, por tentativa de homicídio triplamente qualificado. O segundo golpe com a faca, segundo a vítima, veio de Israel Andriotti da Silva, um dos réus do júri iniciado nesta terça.
“Se eu tivesse a opção de não estar aqui hoje eu não estaria, não quero passar por isso de novo, recordar. Fiz terapia com psicólogo, psiquiatra, tomei remédios. Rezo todos os dias, sou grato pela oportunidade de estar vivo. Nenhum médico acreditava que não pegou [a facada] em nenhum órgão. Isso fortaleceu a minha fé”, enfatizou Edson.
3ª vítima
Alan Floyd Gipsztejn, terceira vítima a falar, prestou depoimento pessoalmente, sem a presença de pessoas no plenário.
O júri também ouviu, como testemunha, um médico que presenciou o crime, junto com mais dois amigos, em frente ao bar, enquanto aguardava uma mesa. “Parecia uma cena de filme de terror. Tinha um grupo de pessoas uniformizadas, atacando um cara [vítima Rodrigo], chutando muito. Outro grupo fazia barreira, ameaçando quem tentasse ajudar. Eles não paravam”, contou.
Até as 20h desta terça-feira, a fase da oitiva das testemunhas ainda não havia sido encerrada.