Ministro da CGU que vai analisar 234 sigilos de Bolsonaro critica segredo inicial sobre posse de Lula

Carteira de vacinação do ex-presidente e o inquérito que mira o general Eduardo Pazuello aparecem entre as futuras análises do órgão

Ministro Vinícius de Carvalho. Foto: Elza Fiúza/ABr

O ministro Vinícius de Carvalho, da Controladoria-Geral da União (CGU), criticou nesta sexta-feira a imposição inicial de sigilo, feita pelo Ministério das Relações Exteriores, em relação aos participantes da cerimônia de posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em Brasília. “A questão da lista da posse se encaixa. Se eu peço a lista de convidados da posse, antes de acontecer, talvez não seria o caso de publicizar antes do evento. Depois que o evento aconteceu, uma semana depois, as pessoas já voltaram para suas casas, não faz sentido essa lista ser classificada (da forma) como foi”, completou.

Depois de ter tornado sigilosas as informações sobre a festa da posse de Lula, o Itamaraty voltou atrás e liberou, nessa quinta-feira, a lista com os convidados para o evento, realizado em 1º de janeiro. A relação dos nomes da cerimônia, organizada pela primeira-dama Rosângela da Silva, não tinha sido divulgada sob o argumento de que as informações ofereciam risco à segurança da família presidencial.

Questionado pelo R7 se há razoabilidade no argumento utilizado pelo Itamaraty, o ministro da CGU destacou que há uma certa cultura adotada pelo funcionalismo em relação aos pedidos de informação e os alcances da Lei de Acesso à Informação (LAI). “Acho que esse caso revela um pouco da questão da dependência de trajetória, do passado. Essa informação foi classificada como reservada em relação à posse do presidente Bolsonaro e ficou. Quando chegou o pedido de informação (da posse de Lula), a pessoa que cuida em primeira instância e toma decisões, às vezes e talvez sem consultar se está tendo alguma reorientação ou esse tipo de coisa, falou ‘bom, foi assim e é assim’. E tomou a mesma decisão que foi tomada na posse de Bolsonaro”, destacou.

“Acho que muita gente dentro do governo ficou sabendo pela imprensa. Obviamente, teve um questionamento, até dentro do próprio Itamaraty, fizeram a reavaliação, dimensionaram a questão e perceberam que esse argumento, baseado em dados pessoais ou segurança, não faria sentido para um evento que já passou e aí abriram”, acrescentou Carvalho.

A justificativa do governo Lula havia sido alvo de críticas justamente porque Lula sempre reprovou a postura do ex-presidente Jair Bolsonaro de decretar sigilo em assuntos pessoais ou que envolviam a família. De acordo com o embaixador Fernando Igreja, foram convidados todos os países que mantêm relação formal diplomática com o Brasil. O coquetel organizado teve 3,5 mil convidados, entre políticos, autoridades, chefes de Estado e delegações de fora do país. Os gastos com a recepção, segundo o Palácio do Planalto, foram de quase R$ 628 mil.

Carteira de vacinação de Bolsonaro
A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a CGU vai examinar 234 casos concretos de negativa de pedido de informação. Desse total, 111 apresentaram como justificativa o fato de envolverem segurança nacional; 35 alegaram questões envolvendo a segurança do presidente da República ou de familiares; 49 abrangiam informações consideradas pessoais; e 16 eram relativos à proteção das atividades de inteligência. Ainda segundo a CGU, 23 pedidos foram negados por outras razões. Entre os pedidos de informação que terão a negativa revista, há dados como a carteira de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o inquérito que mira o ex-ministro da Saúde e general do Exército Eduardo Pazuello. Segundo o ministro, as respostas devem sair em até 75 dias.

O ministro evitou falar de casos concretos, quando questionado, mas equipe dele enumerou exemplos de negativas de pedidos sob análise. Elas envolvem entradas e saídas de pessoas em prédios públicos; o assassinato da vereadora do PSol Marielle Franco; gastos do ex-presidente Bolsonaro com motociatas; pagamentos de cachês de artistas feitos pela Caixa; casos de empréstimos consignados feitos por beneficiários do Auxílio Brasil; registros de armas de fogo; listas de passageiros em voos da Força Aérea; e compras publicas envolvendo Exército e Forças Armadas.

O ministro lembrou que servidor público que não cumpre a lei de acesso à informação “é passível de responsabilização”, mas que a CGU vai ter todo o cuidado para evitar injustiças ao fazer a análise das motivações de negativas de acesso à informação. “O que avaliamos é o argumento que foi dado”, disse.

Entenda melhor

A medida decorre de determinação de Lula para que sejam revistas as regras de sigilo de documentos da administração pública federal. “A partir do despacho do presidente da República foi determinado que fizéssemos revisão e reanálise de casos envolvendo sigilo com base em fundamentos questionáveis, no sentido de banalizar o sigilo e prejudicar a política de transparência pública”, disse Vinicius de Carvalho, ao apresentar um balanço inicial dos resultados obtidos até o momento.

A determinação pela transparência de gastos federais já resultou na divulgação, em 12 de janeiro, de gastos com o cartão corporativo dos ex-presidentes da República entre 2003 e 2022. As informações liberadas abrangem os mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), Dilma Rousseff (2011-2016), Michel Temer (2016-2018) e Jair Bolsonaro (2019-2022).

Durante a gestão de Bolsonaro, foram feitos 511.994 pedidos via LAI. Desses, 64.571 foram negados total ou parcialmente. A CGU, órgão de última instância, analisou 2.510 e manteve a negativa total para 1.335. Na administração pública, existem 302 unidades que respondem à LAI.