Brumadinho: Justiça aceita denúncia após federalização do caso

Rompimento da barragem completa quatro anos nesta quarta

Foto: Divulgação Corpo de Bombeiros de Minas Gerais

Dezesseis pessoas ligadas à mineradora Vale e à consultoria alemã Tüv Süd se tornaram novamente rés e responderão na Justiça Federal por crimes relacionados com a tragédia ocorrida na cidade de Brumadinho (MG) em janeiro de 2019. Em decisão tomada nesta terça-feira, a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da 2ª Vara Criminal Federal, aceitou a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF). Os denunciados são os mesmos que respondiam ao processo na esfera estadual, invalidado recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Considerada uma das maiores tragédias ambientais e trabalhistas do Brasil, o rompimento da barragem da Vale completa quatro anos nesta quinta. A estrutura que se rompeu operou respaldada por auditorias da Tüv Süd, que assinou a declaração de estabilidade. No acidente, 270 pessoas morreram, a maioria funcionários em atividade nas estruturas da mineradora. Os corpos de três vítimas seguem desaparecidos e sendo procurados pelo Corpo de Bombeiros.

Entre os denunciados está o então presidente da Vale, Fábio Schvartsman, e mais 10 funcionários da mineradora. Mais cinco denunciados exerciam cargos na Tüv Süd. Eles vão responder por diversos crimes ambientais e por homicídio doloso qualificado, levando em conta que as vítimas não tiveram possibilidade de se defender da morte. Caso sejam condenados, apenas para o crime de homicídio, as penas podem variar entre 12 e 30 anos de prisão. As duas empresas também foram denunciadas pelos crimes ambientais e podem ser penalizadas com diversas sanções.

Apresentada na segunda pelo MPF, a denúncia é basicamente a mesma que havia sido formulada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e que resultou no processo que vinha tramitando na Justiça mineira desde fevereiro de 2020. No entanto, no mês passado, o STF encerrou uma longa discussão jurídica e concluiu que o caso é de competência federal. A decisão, da Segunda Turma, contou com os votos dos ministros Nunes Marques, André Mendonça e Gilmar Mendes, que formaram maioria, derrotando a posição do ministro Edson Fachin. Assim, os 16 denunciados deixaram de ser réus perante a Justiça estadual.

Esfera federal

Na semana passada, a presidente do STF, ministra Rosa Weber, determinou o início imediato do andamento do processo penal na esfera federal atendendo um pedido dos familiares de uma vítima, que manifestaram temor pela prescrição dos crimes. Dessa forma, a Justiça mineira encaminhou os autos para a Justiça Federal. No entanto, o processo volta praticamente à estaca zero. Os réus terão que ser novamente citados e serão abertos novos prazos para apresentarem defesa.

Além disso, o MPMG não pode mais atuar. Ao assumir a responsabilidade do caso, o MPF pode apresentar uma nova denúncia, mas divulgou um comunicado anunciando a ratificação da denúncia do MPMG. Ela aponta que um conluio entre a Vale e a Tüv Süd resultou na emissão de declarações de condição de estabilidade falsas que tinham como objetivo servir de escudo para manter as atividades da mineradora.

A denúncia ainda pode ser alterada. “Na petição, o MPF destacou que se reserva o direito de aditar a denúncia, a qualquer momento, para, se for o caso, acrescentar ou substituir denunciados ou fatos delituosos”, cita o comunicado divulgado.

Outro lado

Procurada pela Agência Brasil, a Vale encaminhou nota afirmando que sempre pautou as atividades da empresa com base em premissas de segurança e que segue comprometida com a reparação e compensação dos danos às vítimas. O advogado David Rechulski, que representa a mineradora, disse que o recebimento da denúncia ocorre um dia após a apresentação pelo MPF com objetivo de evitar a prescrição dos crimes. “Não causa surpresa que uma denúncia de 477 folhas, capeando mais de 80 volumes, num total de mais de 24 mil páginas, tenha sido recebida em menos de 24 horas”.

Já a Tüv Süd informou que não pretendia se manifestar. A Agência Brasil também contatou o escritório Bottini e Tamasauskas Advogados, responsável pela defesa de Fábio Schvartsman, mas até o momento não houve retorno.

Receio

A Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos (Avabrum) teme que o caso tenha, na Justiça Federal, o mesmo tratamento do processo envolvendo a tragédia em Mariana (MG) ocorrido em novembro de 2015. No episódio, o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco deixou 19 mortos, destruiu comunidades e causou impactos socioeconômicos e ambientais em dezenas de municípios da bacia do Rio Doce. Passados sete anos, não houve condenações e apenas sete dos 22 denunciados seguem figurando como réus, mas não respondem mais por homicídio, apenas por crime ambiental.