Me vinha eu no coletivo rumo à cidade grande, meio cai caindo de tanto sacudir os ossos na estrada que mais parece um pala vindo da guerra do paraguai, tudo esburacado.
Do meu lado um sujeito mais sério que viúva em retrato. do outro uma semostradeira , isto é , uma dessas moças pouco discretas que gostam de exibir-se, de chamar a atenção.
Mais atrás um vivente se metendo de paleta, daqueles que entram na conversa para a qual não foram chamados, se parando de vaqueano a assuntar umas bobajadas que só vendo!Mais metido que nem piolho em costura.
Um casalzinho apaixonado de beiço grudado e língua tramada entre um tranco e outro do ônibus, nem dando pelota pros passageiros, fazia a diversão dos da volta. O amor é lindo !
Um piazote abriu o tarro no meio do caminho, queria porque queria que a mãe comprasse um pacote de Maria Mole desses guri que embarcam vendendo doçuras, fazendo uma lenga lenga tipo…” 3 bala de goma por um mirréis”, “olha a bala de hortelã por um vintém”, “é das buenas ,dessas de destrancar os pulmão e parar com a tussideira”!
Uma pinguancha alterada falava ao telefone como quem está no galpão ou na própria casa, numa xingação urca com o que entendi fosse um namorado desses milongueiros que promete e não cumpre, mais enrolado que boa noite aquele coiso que a gente bota pra matar a musquitama.
Logo ali na volta da cobra uma milicada parou o veículo, e foi um mexinflório. Mas era uma batida daquelas de costume, só pra conferir se algum “mão leve” não estava embarcado.
Coração de cobrador de ônibus é coletivo como o meio de transporte em que ele exerce a profissão. Sempre cabe mais um(a) !
Alguns educados, um que outro sério como criança mijada, algum mais grosso que dedo destroncado.
Os prestativos, os engraçadinhos, os falastrões e os galãs do transporte de massa que não podem ver um rabo de saia que já emplumam que nem galinho garnizé ciscando no terreiro.
Como sou usuária desse transporte, cenas das mais diversas passam diuturnamente pelos meus olhos e ouvidos atentos…
Lindo de ver. O cobrador feio como talho na bunda….a namorada rechonchuda e ciumenta toma conta do espaço na frente ,de pé ….troca de olhares …cumplicidade…cheios de amor pra dar….agora ela senta no lugar de um idoso e o enlevo continua….sob a trilha sonora de uma página musical do cancioneiro sertanejo no celular da querida…. o amor é lindo…cego….surdo e espaçoso no coletivo Assunção….
Faz tempo que não me encontro com um desabotinado que tem ojeriza de idoso…pensa por certo que vai permecer mumificado na juventude que ainda lhe resta. Desde:” Vamo caminhá tia” ( pras senhorinhas que ficam de pé por falta de banco, na frente) à “dizeção” de nombretes(palavras chulas), lavação de roupa suja, e barbáries impublicáveis… ” Ó essa aí qué passeá, embarca aqui e desembarca na outra, não tem o que fazê essas véia”!…
Outro dia cobrador e motorista falavam em alto e bom som de um colega… “Fulano? fulano é corno, aquele que trabalha na madruga…a mulher “boto-lhe “um par de aspas maior que a história grega”… e a gente ali, refém da ignorância, do humor do motorista que freia com gosto só para ver as pessoas se aboletarem como carga de animais vivos .
Fui testemunha ocular do vôo de uma passageira. O emburrado e mal amado condutor “sofrena e desaçulera” para eu desembarcar… saio pela porta da frente… quando me deparo com a cena, na porta de trás pendurada uma mulher trintona e por sorte seca de corpo voava como pandorga até que o cobrador se deu conta do acontecido. Não morreu porque não era a hora !
Gosto de ver a namorada do “motora”. ela viaja junto, ele tira o olho da estrada e ela fica do ladinho ronronando como gata no cio o tempo todo… isso que tem um aviso -‘ NÃO CONVERSE COM O MOTORISTA”. Que nada ! E como assuntam… hora entre dentes, resmungadinho, hora entre risos e olhares lânguidos , e o coletivo andando…
Tem um que eu conheço que fica no celular, no “vatezapí” charlando com as queridas, por certo, o tempo todo… baixa a cabeça e a direção vai solita até nas curvas… acho que já está tão acostumada que criou vida própria….
Tem um que se invoca com as mulheres, dirige como um fitipáldi mal acabado,e no inverno abre a porta do coletivo se alguém reclama do frio, só pra judiar principalmente dos mais idosos… Passa em algumas paradas com a pata grudada à 120 e dez minutos antes do horário deixando gente pra traz , e outro dia mandou uma passageira descer no terminal, por gosto pra pessoa caminhar de bengala, com dificuldade só pra não fazer a volta e deixar desembarcar mais próximo do local onde sempre desce ,rumo ao serviço. Ruim como carne de cobra, diz até que toma remédio para acalmar os nervos, nem deveria estar dirigindo, mas….tem as costas quentes por certo, enquanto isso, os usuários sofrem todo o tipo de assédio moral…
Outro malabarista do volante, quando tomava o rumo, botava um copo entre os joelhos, servia o cafèzinho e ia entre uma mordida e outra num naco de pão, sorvendo o pretinho básico e ao mesmo tempo dando opinião e se consagrando na direção.
Vi tudo e não vi nada com estes olhos que a terra há de comer um dia!
Deuzulivre !