Julgamento de Flordelis ouve última testemunha

Interrogatórios individuais devem começar neste sábado

Foto: Bruno Dantas / TJ-RJ / Divulgação

O julgamento da ex-deputada Flordelis dos Santos de Souza, apontada como mandante da morte do marido, pastor Anderson do Carmo, entra na reta final neste fim de semana. Na noite desta sexta-feira, a última testemunha começou a ser ouvida.

É o 24º depoimento colhido desde segunda-feira: 13 foram indicações da acusação e 11 das defesas dos réus. A previsão inicial era de ouvir 30 testemunhas, mas algumas foram posteriormente dispensadas. Amanhã, devem se iniciar os interrogatórios individuais de cada um dos cinco réus.

Flordelis e mais quatro suspeitos de envolvimento no caso são julgados pelo Tribunal de Júri de Niterói, conforme decisão tomada em setembro do ano passado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). Apenas crimes dolosos contra a vida podem ser submetidos ao Tribunal de Júri, que é composto por sete indivíduos selecionados mediante sorteio entre cidadãos previamente alistados e sob juramento.

Cantora gospel e pastora, Flordelis se elegeu deputada federal em 2019 pelo Partido Social Democrático (PSD) com grande apoio dos fiéis, tornando-se a mulher mais votada no estado do Rio de Janeiro. Após a conclusão da investigações em torno da morte de Anderson, ela teve o mandato cassado. As investigações também implicaram parte da família, composta ao todo por mais de 50 filhos, dos quais três biológicos e os demais adotivos ou classificados como afetivos.

Anderson morreu baleado na noite de 16 de junho de 2019, logo após chegar na casa da família no bairro de Pendotiba, em Niterói (RJ). Em um primeiro momento, Flordelis sustentou se tratar de uma tentativa de assalto. No entanto, o inquérito policial concluído em agosto de 2020 indicou ter ocorrido um homicídio e apontou a então parlamentar como mandante. De acordo com a Políica, a disputa por poder e pelo controle financeiro na família motivou o crime.

Devido à imunidade parlamentar, a deputada se manteve em liberdade no curso das investigações, até a cassação. Por outro lado, foram presos o filho biológico de Flordelis Flávio dos Santos, acusado de ser o autor dos disparos, e o filho adotivo Lucas dos Santos, suposto responsável pela compra da arma. Posteriormente, com a conclusão do inquérito, foram presos os outros dois filhos biológicos dela – Adriano dos Santos e Simone dos Santos -, três filhos adotivos – Marzy Teixeira, André Luiz de Oliveira e Carlos Ubiraci Silva – e a neta Rayane dos Santos. Eles foram acusados de envolvimento no crime ou de tentarem atrapalhar a investigação.

Com a repercussão das conclusões do inquérito policial, Flordelis acabou expulsa do PSD e teve a cassação aprovada na Câmara dos Deputados em agosto de 2021 por 437 votos contra sete. Sem foro privilegiado, recebeu voz de prisão dois dias depois.

No julgamento em curso, cabe ao Tribunal de Júri dar a sentença de Flordelis, André Luiz de Oliveira, Marzy Teixeira, Simone dos Santos e Rayane dos Santos. Os trabalhos são presididos pela juíza Nearis Arce. Outros acusados de envolvimento no crime já foram julgados anteriormente. Flávio dos Santos e Lucas dos Santos foram condenados por homicídio triplamente qualificado e outros crimes.

Já em abril desse ano, o Tribunal de Júri condenou por uso de documento falso Adriano dos Santos e mais duas pessoas sem parentesco com a família: o ex-policial militar Marcos Costa e a esposa Andrea Maia. No mesmo julgamento, o júri absolveu Carlos Ubiraci Silva da acusação de homicídio, mas o condenou por associação criminosa a uma pena de dois anos, dois meses e 20 dias. Como era preso desde agosto de 2020, ele obteve a liberdade condicional em maio.

Júri
As testemunhas ouvidas no primeiro dia do julgamento já sugeriam um julgamento longo. A delegada de polícia Bárbara Lomba, por exemplo, falou por mais de quatro horas. Ela presidiu a primeira fase das investigações que resultaram na prisão de Flávio dos Santos e Lucas dos Santos.

Inicialmente havia a expectativa de o julgamento se encerrar em três dias, mas ele vem se estendendo não apenas pelos longos depoimentos, mas também por um tumulto ocorrido ontem e por atrasos no início de algumas sessões. Além disso, em momentos distintos, Flordelis e Marzy passaram mal e demandaram paralisações para atendimento médico.

No atual ritmo, o veredito não deve sair antes de domingo. Com o fim dos depoimentos das testemunhas, serão realizados os interrogatórios individuais dos cinco réus e, em seguida, as falas finais da acusação e da defesa. Só então os jurados tomarão a decisão. Durante todo o julgamento, o grupo permanece isolado em um hotel e incomunicável, sem acesso a telefone.

A acusação é conduzida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), tendo como assistentes advogados da família do pastor. Eles reiteraram as conclusões do inquérito policial, no qual é apontada a motivação financeira do homicídio e a ocorrência de outras tentativas de assassinar o pastor, com a adição de veneno nas comidas e bebidas da vítima.

Entre os reús, Simone dos Santos Rodrigues chegou admitir no curso do processo que deu dinheiro a Marzy para matar Anderson. Ela disse que queria se livrar de abusos sexuais cometidos pelo pastor. Já Marzy alegou que teve sozinha a ideia de tirar a vida de Anderson e levou a proposta a Lucas, que segundo ela se recusou, impedindo o plano de seguir adiante. Ela se declarou inocente.

Flordelis também alega inocência. A defesa dela argumenta que o crime resultou da reação de Simone ao comportamento de cunho sexual da vítima. A advogada que representa a ex-deputada, Janira Rocha, busca mostrar aos jurados que Anderson tinha um perfil de abusador. Além disso, ontem ela chegou a pedir a exumação do corpo do pastor, para comprovar a alegação de que houve tentativas de envenenamento. A juíza Nearis dos Santos negou o pedido.