Especialistas dizem haver “ponto cego” na fiscalização do TSE

Para advogados de direito eleitoral, falta estrutura ao TSE para fiscalizar inserções de propagandas eleitorais no rádio e TV

Foto: Marcelo Camargo/ABr

Após um servidor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) relatar falhas na fiscalização das inserções de propagandas eleitorais por parte do tribunal, especialistas disseram ao portal R7 que existe um “ponto cego” na estrutura de fiscalização da Corte para garantir que as as propagandas eleitorais sejam veiculadas corretamente em emissoras de rádio e televisão.

Segundo o advogado especialista em Direito Eleitoral Cristiano Vilela, o episódio revela “alguma veracidade nos elementos trazidos pela coligação de Bolsonaro”. “Acredito, pelo depoimento desse servidor, que haveria um ‘ponto cego’ onde o TSE não teria como identificar eventuais omissões por parte de emissoras”, avaliou.

Para o advogado, é preciso analisar alguns elementos – “o primeiro é se houve uma concertação estratégica feita para prejudicar a campanha de Bolsonaro ou se é uma mera falha que tenha prejudicado as duas campanhas”. “É preciso apurar também se houve problemas nas inserções da candidatura de Lula,” explicou o especialista.

Ele considera ainda que no caso de as falhas terem ocorrido propositalmente, resta ainda apurar se houve participação da campanha adversária no intuito de gerar danos à campanha do presidente. “De pronto adianto que o fato não é suficiente para o adiamento das eleições, mas compromete a lisura do processo eleitoral, com um claro favorecimento a um candidato.”

Segundo Vilela, quanto às rádios que supostamente deixaram de veicular as inserções, a punição vai depender do que for apurado nas investigações. “Uma coisa é um equivoco de meia dúzia de inserções, com menor efeito e, portanto, menor reprimenda. Em casos mais graves onde fique identificado dolo, são adotadas medidas criminais mais duras, podendo, inclusive, haver a cassação da concessão da rádio,” esclarece o advogado.

“Impossível fiscalizar”
Para o especialista em direito eleitoral Alexandre Rollo, o episódio também evidencia a falta de estrutura do TSE para garantir que as inserções sejam veiculadas corretamente. “É impossível fiscalizar essas inserções, que, teoricamente, são veiculadas por milhares de rádios e TVs no Brasil inteiro. Que há uma falha, não tenho dúvida, e isso não é uma crítica ao tribunal, mas não dá para saber até que ponto o TSE consegue verificar se a veiculação é realizada corretamente”, avalia.

Ele salienta que o Código Eleitoral não é específico sobre quem deve fiscalizar inserções em rádios e televisão, mas que é possível que, após as denúncias, sejam discutidas formas mais eficazes de fiscalizar a propaganda eleitoral.

“Todo mundo tem que fiscalizar todo mundo, partidos fiscalizam, o eleitor fiscaliza, o Ministério Público pode e deve fiscalizar e a própria Justiça Eleitoral. Não existe um único ator para fiscalizar o processo eleitoral, isso deve ser feito por todos”, alega.

Para Rollo, uma opção para garantir que as propagandas eleitorais sejam veiculadas corretamente pode ser contar com a capilaridade dos cartórios eleitorais e com a ação dos juízes eleitorais nos municípios como forma de “descentralizar a fiscalização”.

“Interferência direta”
O jurista e advogado Ives Gandra Martins afirmou ao R7 que, caso a denúncia da campanha de Bolsonaro seja comprovada, o ideal é que as rádios sejam obrigadas a veicular as inserções eleitorais do presidente e candidato à reeleição.

“O que o TSE tinha que dar agora é o direito de 154.085 inserções no rádio para a campanha de Bolsonaro até o final da eleição. Essa seria a solução, de que todas as rádios que não veicularam a propaganda que imediatamente o façam”, entende.

Segundo o jurista, eventual irregularidade na inserção de propaganda eleitoral em rádio e na televisão pode caracterizar interferência no processo eleitoral. “Se for comprovado, passa a ser uma interferência direta”, completa.