“Não pode ser algo emocional”, declara Queiroga sobre oferecer pelo SUS remédio de R$ 10,6 milhões

Medicamento, único capaz de neutralizar os efeitos da atrofia muscular espinhal (AME), é considerado um dos mais caros do mundo; incorporação está em discussão na Câmara Federal

Foto: Geraldo Magela / Agência Senado

O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse nesta terça-feira que, diante das dificuldades orçamentárias, vê no fortalecimento de centros de reabilitação a alternativa para o tratamento de algumas doenças raras no país.

A afirmação ocorreu durante sessão da Câmara dos Deputados que debate a incorporação do medicamento Zolgensma – para tratamento de crianças com atrofia muscular espinhal (AME) – no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

A doença é caracterizada por fraqueza muscular grave e progressiva e diminuição do tônus muscular resultante da degeneração e perda dos neurônios motores inferiores da medula espinhal e do núcleo do tronco cerebral. Na versão mais grave, costuma causar a morte de pacientes com menos de dois anos de idade.

Atualmente, o processo judicial é a única forma de tentar acesso ao medicamento. A situação é complexa porque o Zolgensma é um dos remédios mais caros do mundo. Tratamentos à base do medicamento podem custar até R$ 10,617 milhões por paciente.

“É óbvio que o ministro da Saúde não pode fazer tudo o que quer, até porque o orçamento público é finito. É aquela teoria do cobertor curto. Cobre o pé e descobre a cabeça. Temos de fazer justiça distributiva para promover equidade, conforme dispõe a Constituição Federal”, disse o ministro na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara.

Queiroga lembrou que, em 2021, a pasta usou R$ 2,2 bilhões do orçamento com ações judiciais para atender 6,6 mil pessoas. “Isso é quase o custo da Farmácia Popular no Brasil”, disse.

Avaliações
Queiroga afirmou que, ao longo dos anos, “notadamente depois de 2011”, o Brasil vem evoluindo na avaliação de tecnologia em saúde, e que a questão sobre incorporação ou não do Zolgensma ao SUS “não pode ser algo emocional”, mas sim baseada em “critérios técnicos diferenciados” por se tratar de doença rara.

“É impossível, no contexto de doença rara, fazermos grandes estudos aleatorizados, tampouco ter como meta análises com todos esses estudos para que tenhamos a evidência científica construída, como fazemos com as doenças prevalentes”, disse.

O primeiro medicamento para AME no Brasil, o Spinraza, da Biogen, teve o registro concedido pela Anvisa, em 2017, depois da mobilização de famílias que pediram ajuda do governo para custear o tratamento, de em torno de R$ 3 milhões na época. Desde o ano passado, o medicamento está disponível no SUS.

Tanto o Spinraza quanto o Zolgensma conseguem aumentar a produção da proteína SMN, mas somente o Zolgensma é capaz de neutralizar os efeitos da AME.

Indústria
O ministro chamou atenção para o fato de a indústria farmacêutica ser um dos setores mais lucrativos do planeta, e defendeu “filtros para garantir que as negociações aconteçam no âmbito da sustentabilidade do SUS, e que promovam o custo de oportunidade”. “Às vezes, a autoridade sanitária precisa ser dura para garantir que tenhamos a verdadeira ampliação de acesso”, argumentou.

Centros especializados
Enquanto não há definição sobre a adoção ou não do medicamento pelo SUS, Queiroga garante que o governo vai seguir adotado a estratégia de fortalecer os centros especializados de reabilitação.

“Neste caso, quem sabe, se tivermos atendimento adequado com a indústria, isso possa ser uma alternativa. Mas precisamos, em todas situações, avaliar o resultado do tratamento. Se essa medicação é administrada em uma fase inicial, e resulta no efeito desejado, com a recuperação motora da criança, maravilha. Mas deve ser considerada também a questão motora e da escala motora, para que consigamos fazer algo efetivamente benéfico para os pacientes”, disse Queiroga.