PF deflagra operação contra irregularidades envolvendo uso e distribuição de Proxalutamida

Ordens judiciais foram cumpridas em Porto Alegre e Brasília

Foto: Polícia Federal/Divulgação

A Polícia Federal deflagrou, nesta quinta-feira, uma operação que busca apurar os crimes de contrabando, distribuição e entrega de Proxalutamida. Conforme as investigações, a importação do medicamento chegou a ser aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para uma pesquisa relacionada à Covid-19, mas as formalidades para a execução do estudo científico entraram em desacordo com as normas da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), ligada ao Ministério da Saúde.

Além disso, a distribuição do remédio, da forma como se deu, segundo a PF, configura o crime de contrabando. Por conta disso, agentes cumpriram quatro mandados de busca e apreensão, na chamada Operação Duplo-Cego, em Porto Alegre e Brasília. As ordens judiciais foram expedidas pela Justiça Federal da capital gaúcha, a pedido do Ministério Público Federal (MPF).

Um dos alvos da ofensiva é o médico Flavio Cadegiani. Através do Twitter, ele, que tratou mais de 4 mil pessoas de Covid-19, disse estar “muito tranquilo” e complementou: “Quando você tem a verdade dos fatos e as vidas que você salvou e mostrou como salvar, e que eles sabem que você sabe que eles sabem, tratam-se somente de barreiras temporárias inerentes ao processo de avanço”.

Ação do MPF

Ontem, o Ministério Público Federal (MPF) do Rio Grande ajuizou ações civis públicas em que pede reparação por dano potencial à saúde e dano moral coletivo aos responsáveis por um estudo, considerado irregular, com o uso da Proxalutamida para o tratamento da Covid-19 realizado no Hospital da Brigada Militar de Porto Alegre e no Hospital Arcanjo São Miguel, em Gramado, em março de 2021.

As duas ações foram movidas contra a União (representando a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, órgão do Ministério da Saúde), e os pesquisadores Flávio Cadegiani e Ricardo Ariel Zimerman, que também se tornou alvo da investigação da Polícia Federal, nesta quinta. A reportagem tentou contato com o médico, mas, até o momento, não conseguiu retorno.

A ação do MPF que aponta dano potencial à vida ainda denuncia o Estado do Rio Grande do Sul e o ex-diretor do Departamento de Saúde da Brigada Militar Igor Wolwacz Júnior. Em contato com a reportagem, o governo gaúcho disse que a Procuradoria Geral do Estado (PGE-RS) “está avaliando a ação e apresentará manifestação oportunamente”.

Já a relacionada ao estudo em si também menciona como corresponsáveis o município de Gramado, além de Márcio Rafael Slaviero e Márcio Pinto Muller, respectivamente superintendente e diretor técnico do Hospital Arcanjo São Miguel. Se condenados, os réus podem ser multados em pelo menos R$ 10 milhões em cada uma das ações.

Sobre a ofensiva da PF desta quinta, o MPF confirmou que os alvos de buscas e apreensão foram um hospital (sem citar qual), um consultório e residências localizados em Porto Alegre e em Brasília. Ainda segundo a nota do órgão, as ordens judiciais buscaram “elementos de prova acerca da importação e do fornecimento irregular da substância proxalutamida a pacientes internados com covid-19”.

Apurações 

No dia 26 de fevereiro de 2021, Cadegiani assinou termo de cooperação técnico-científica com Márcio Rafael Slaviero e Márcio Pinto Muller, para incluir o Hospital Arcanjo São Miguel como participante da pesquisa – termo esse também assinado pelo prefeito municipal de Gramado. Durante aquele mês, mesmo sem autorização dos órgãos competentes, 63 pacientes do hospital completaram o tratamento com o uso de Proxalutamida.

Além desses dois hospitais (da Brigada Militar do RS e Arcanjo São Miguel), instituições de saúde de outras regiões do país, como em Manaus (AM) e Chapecó (SC), acabaram sendo utilizadas no estudo, apesar de não autorizadas pelas autoridades de saúde. No total, a pesquisa contou com 778 participantes, embora o projeto inicial aprovado pela Conep tenha previsto apenas 294 pacientes.

O estudo também passou a ser investigação pela Anvisa, que, após as denúncias, decidiu pela suspensão cautelar, em todo o território nacional, da importação e do uso de produtos contendo a proxalutamida para fins de pesquisa científica, a partir de 1º de setembro de 2021.