Justiça condena pais de organizador de festa que culminou em morte de jovem negro em Porto Alegre

Só em danos moral, valor imposto é de R$ 200 mil

Foto: Arquivo Pessoal

O juiz Vanderlei Deolindo, do Foro Regional da Tristeza, condenou os pais de um dos adolescentes que organizaram uma festa, na zona Sul de Porto Alegre, que culminou com a morte do jovem negro Eduardo Vinicius Fosch dos Santos, de 17 anos, em abril de 2013. A pena estabelece o pagamento de danos morais, no valor de R$ 200 mil, e de danos materiais, referentes aos gastos hospitalares e funerários que os pais dele tiveram de arcar em função da morte do jovem. Os valores ainda devem ser corrigidos monetariamente. Cabe recurso da decisão.

Um dos réus era o proprietário da casa onde ocorreu a festa. Conforme os pais de Eduardo, um grupo de amigos e colegas de escola organizou o evento, no Condomínio Jardim do Sol, zona Sul da capital. O evento tinha cobrança de ingresso, com o objetivo de pagar um DJ e três seguranças, além de comprar bebida alcoólica, de consumo liberado naquele dia.

Segundo os pais de Eduardo, de 100 a 150 pessoas foram convidadas e tiveram os nomes colocado em uma lista deixada na portaria do condomínio. O processo cita, porém, que Eduardo, acompanhado de um amigo, não teve o nome incluído nessa lista. Ainda assim, ao chegar ao local, um dos organizadores autorizou a entrada dele. A festa se estendeu pela madrugada e, na manhã seguinte, uma vizinha encontrou o jovem caído no pátio ao lado da casa onde ocorreu a festa. Desacordado, Eduardo teve uma grave lesão no crânio e outras de menor porte, no abdome. A vizinha chamou o Samu, que levou o Hospital de Pronto Socorro. Depois de nove dias em coma, Eduardo morreu, em 6 de maio de 2013.

O juiz considerou, na sentença, que a festa ocorreu sem a guarda de responsáveis, e que a morte de Eduardo resultou de uma queda no terreno vizinho, em decorrência de um desnível na divisa entre as propriedades. Réu no processo, o pai do organizador afirmou ter feito exigências ao filho para a realização da festa, como a contratação de seguranças, mas admitiu que não participou do evento. O homem negou, contudo, ter permitido o consumo de bebida alcoolica e relatou, entre outras alegações, que a entrada no local onde ocorreu a queda de Eduardo havia sido vedada, já que ali havia uma horta, sem iluminação.

Com relação à responsabilidade do condomínio, o juiz afirmou que não ficou provado, nos autos, que se tinha ou não o dever de fazer rondas noturnas pelo terreno. Com base nos depoimentos, o juiz não aponta, contudo, indícios de que Eduardo tenha sido vítima de um crime de agressão durante o evento.

Em um outro processo, que deve ser julgado nos próximos meses, dois dos seguranças viraram réus sob a acusação de terem espancado Eduardo, o único jovem negro presente ao evento. A Justiça encerrou o prazo de instrução e, após as alegações finais da defesa e da acusação, o juiz Tadeu Trancoso de Souza decide, nas próximas semanas, se o caso vai ou não a júri popular.

Conforme a acusação do Ministério Público Estadual (MP-RS), um dos seguranças agrediu a vítima com golpes de instrumento contundente, chutes e socos, motivado por preconceito ao vê-lo no pátio da casa onde ocorria a festa. Conforme um laudo anexado ao processo, o adolescente morreu vítima de hemorragia encefálica por traumatismo cranioencefálico.

A Polícia Civil tratou o caso como acidente, mas o MP abriu investigação e, através do laudo de um perito particular contratado pela família da vítima, a promotora de Justiça Lúcia Helena Callegari concluiu que um dos seguranças espancou o jovem e o jogou para o terreno da casa vizinha.

A justiça determinou a reabertura do caso, que em dezembro de 2020 chegou a ser levado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, vinculada à Organização dos Estados Americanos (OEA). Para a família da vítima, a morte teve racismo como motivação, após ele ter sido confundido com um intruso pela segurança da festa.