Com inflação, brasileiro come menos e troca carne para garantir arroz e feijão

Consumidores reclamam de deixar todo salário no supermercado e relatam redução de, pelo menos, 50% do poder de compra

Inflação. Foto: EDU GARCIA/R7 - 19.07.2022

A alta dos preços tem obrigado os brasileiros a mudar os hábitos no supermercado para garantir o arroz e feijão. Sem conseguir comprar carne bovina, os consumidores passaram a trocar o produto pela proteína suína, frango ou ovos. Com o poder de compra reduzido pela inflação, o consumidor foi obrigado a comer menos e reclama ainda de ter que comprar marcas mais baratas e deixar quase todo salário no supermercado.

A inflação acumula nos últimos 12 meses aumento de 11,89%. Somente em junho, o índice acelerou 0,67%, maior taxa para o mês em quatro anos, segundo os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Itens de alimentação e bebidas lideraram a alta dos preços no mês (0,8%). Em um um ano, o aumento registrado pelo grupo é de 13,93%.

R7 foi até um supermercado de São Paulo ouvir consumidores para saber como os brasileiros têm feito para economizar nas compra da cesta básica.

Para comprar arroz e feijão, carne bovina e mais itens ficam de lado

A disparada dos preços tornou impossível para boa parte das pessoas consumir carne bovina. “É bem visível que tudo aumentou muito. Senti bastante a alta da carne, eu substituí pelo ovo, que também está caro. Deixei ainda de levar outras coisas, como ‘besteirinhas’, alguma proteína mais cara, para poder comprar arroz e feijão, que não tem como cortar”, conta Renata Vitoria, estudante de 20 anos, que trabalha como atendente em uma papelaria.

“Ficou quase impossível comprar carne de boi. Eu como carne de porco e frango, que é mais barata”, comenta a cuidadora de idosos Solange Matheus Andrade, de 60 anos.

Para Pial Santana, dono de restaurante, o aumento dos preços é persistinte e tem acontecido há bastante tempo. “Isso não é recente. Hoje, eu como frango, porque a carne bovina subiu muito. O contrafilé que era R$ 18,00 o quilo, eu pago hoje R$ 50,00. Até porque também deu para sentir bastante o aumento do arroz e feijão”, afirma. Além de ter que comprar alimentos para consumir em casa, Pial precisa dos produtos para seu restaurante, que sofre com os efeitos da inflação. “Não tenho como repassar todo esse aumento para o cliente. Se fizer isso não vendo mais. O meu lucro diminuiu bastante”, relata.

Segundos dados do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), em um ano, os cortes de carne bovina com maiores aumentos foram a picanha (9,21%), alcatra (9,20%), fígado (6,59%), filé-mignon (5,75%) e patinho (4,9%). Usados como alimentos substitutos, o frango em pedaços (22,14% ) e o ovo (18,86%) também tiveram elevação considerável no preço. Apesar de o arroz ter caído 10%, o feijão carioca disparou 29,61%.

Redução do poder de compra deixa todo salário no supermercado

Com a elevação da inflação, o poder de compra diminuiu e os consumidores reclamam de gastar todo o salário no supermercado. Para Renata, o dinheiro desvalorizou muito nos últimos anos. “Para mim que sou jovem, os preços dos alimentos pesam muito. É o pior começo. O que você faz com R$ 1.500,00 hoje em dia? Porquíssima coisa e esse é o valor que uma pessoa da minha idade ganha normalmente”, afirma.

“Boa parte do meu salário fica em no supermercado, porque a gente tem que ajudar em casa, se não ajudar o salário dos nossos pais não dá para pagar as contas com esses preços. Não tem mais  como sair da casa dos país, ficar independente está bem mais difícil”, completa a jovem.

Já Solange relata que, além de dividir pela metade o que conseguia comprar com o mesmo salário anteriormente, precisa usar o cartão de crédito para poder pagar depois. Já a aposentada Nanci Minguin, de 66 anos, acredita que a diminuição no poder de compra foi maior ainda. “Meu dinheiro com a inflação, com certeza, desvalorizou uns 60% no supermercado de uns anos pra cá”, afirma.

Segundo Orlandina, foi preciso cortar muita coisa da lista do supermercado. “Se der para levar, eu levo, se não der a gente fica só na vontade. Eu gasto mais do que o dobro na minha compra mensal do que há alguns anos atrás. O supermercado tem comido 100% da minha renda, praticamente tudo. Os salários estão incompatíveis com esses preços. Como uma pessoa que paga aluguel, conta de luz, água, vem ao supermercado pagar isso. Não tem como”, ressalta.

Redução do consumo e escolha de marcas mais baratas

Quando a troca por alimentos e marcas mais baratas não é suficiente, a saída é comer menos. “Faz dois meses que não faço a compra que eu fazia antes, não dá para fazer mais. Os preços estão um absurdo, é assustador, a gente teve que reduzir o consumo”, conta Solange.

A consumidora, que estava acompanhada do filho, de 32 anos, que trabalha como barbeiro, e dois netos, de cinco e um ano, conta ainda que lidar com a inflação fica ainda mais complicado nas férias escolares. “Quanto traz criança, a gente tenta comprar alguma coisa a mais, porque elas passam mais tempo em casa neste mês. Fica mais difícil”, destaca.

Sônia conta que primeiro procura por produtos semelhantes e marcas mais baratas, mas quando não encontra, ela relata que precisa “diminuir a quantidade de alguns produtos. “Eu passei a comprar menos”, garante.

Campeões de reclamação

A compra de alguns alimentos ficou mais difícil para os brasileiros. O leite é um dos mais citados. O produto subiu 37,61% no último ano, segundo o IPCA, calculado pelo IBGE. “Com R$ 10,00, hoje eu compro praticamente um litro de leite só”, afirma Pial, que também reclamou do valor de outros itens no supermercado,  “Sinto muita diferença no queijo e café. Dois anos atrás, eu pagava R$ 17,00 no quilo de muçarela, agora custa R$ 70,00”, completa. No mesmo período, o queijo subiu 19,18% e o café 61,83%.

O óleo e a manteiga estão com um preço “absurdo”, de acordo com Solonge. Em um ano, o IPCA aponta que o valor do óleo de soja cresceu 29,34% e a manteiga 14,29%.

Para Orlandina, ficou mais difícil comprar frutas, verduras e legumes. “Eu escolho aqueles de época para ficar mais barato”, relata. De acordo com o acumulado em 12 meses, esses itens estão entre os recordistas de aumento, como o pepino (95,81%) a cenoura (83,99%), a abobrinha (82,99%), o melão (78,37%), batata-inglesa (76,01%), morango (75,03%), mamão (74,55%), tomate (67,04%), cebola (60,39%).