Em audiência na Comissão de Educação da Câmara, o ministro da Educação, Victor Godoy, afirmou nesta quarta-feira que participou de eventos com a presença dos pastores Arilton Mourão e Gilmar Santos a convite do ex-ministro Milton Ribeiro, mas apenas para compor a mesa de abertura. Prefeitos denunciaram à Comissão que os pastores agiam intermediando repasses de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) a municípios mediante solicitação de propina, em dinheiro e até em ouro.
“Todos os três eventos que participei nessa qualidade foram realizados no auditório do Ministério da Educação. Não participei de nenhum dos outros seis eventos realizados com a presença desses pastores. Não participava de agendas com os referidos pastores e os assuntos tratados entre eles e o ex-ministro da Educação [Milton Ribeiro] não eram de meu conhecimento”, afirmou Godoy.
A comissão convidou o ministro para falar sobre as denúncias envolvendo os pastores, a continuidade dos programas de Educação após troca de comando na pasta e a destinação de R$ 26 milhões para compra de kits de robótica em escolas sem estrutura, como banheiro, computadores ou conexão com a internet. Sobre o caso dos pastores, Godoy ainda disse que Ribeiro jamais solicitou ou impôs a ele, na posição de secretário-executivo da pasta, qualquer ato em desacordo com a legislação.
“Sempre manti com ele uma relação de cordialidade e respeito. Assim que tomei conhecimento das denúncias, sugeri ao ministro ações para que estas fossem investigadas pela CGU [Controladoria-Geral da União]. Eu pessoalmente reduzi a termo os relatos a mim declarados e encaminhei com autorização do ex-ministro para a CGU para investigação”, disse.
De acordo com ele, as reuniões com os prefeitos (no total, foram 68 eventos com 1,8 mil municípios) eram compostas pelo ex-ministro e por representantes do FNDE. “Eu não participava”, afirmou Godoy.
Na semana passada, reportagem do jornal Folha de S.Paulo divulgou um ofício que mostra que Godoy, quando era secretário, atuou para nomear o pastor Arilton a um cargo comissionado. Em nota, o MEC afirmou que a indicação do pastor coube ao ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, e que ele apenas assinou o documento na figura de secretário-executivo. A Casa Civil negou a indicação. Nesta quarta-feira, ele voltou a ressaltar que assinou o documento apenas como secretário-executivo, mas que a indicação partiu de Ribeiro.
Denúncias sugerem tráfico de influência
No início do mês passado, três prefeitos ouvidos pela Comissão de Educação do Senado afirmaram que houve pedido de dinheiro e até de ouro por parte do pastor Arilton Moura para a liberação de recursos da Educação. Os gestores relataram que apesar de não pedir expressamente, Gilmar esteve presente quando Arilton pediu valores.
O prefeito de Luís Domingues, no Maranhão, Gilberto Braga (PSDB), por exemplo, confirmou o pedido de 1 quilo de ouro por parte do pastor Arilton, em troca da liberação de recursos da Educação para o município, de 7 mil habitantes. A solicitação ocorreu durante almoço em Brasília, em 7 de abril do ano passado, após uma reunião no prédio do MEC.
Diante das denúncias e pressões inclusive da bancada evangélica, o ex-ministro Milton Ribeiro pediu demissão. Em carta, o ex-ministro justificou que após tomar conhecimento, em agosto de 2021, acerca de “uma pessoa” (que ele não cita o nome) que vinha cometendo irregularidades, ele denunciou à CGU. No entanto, o portal R7 mostrou que mesmo depois de ter denunciado os dois pastores, ele participou de um evento evangélico com ambos e os chamou de “amigos”.
A relação de pastores no MEC ocorre em um contexto maior de relação de Ribeiro com igrejas, uma vez que o ex-ministro também é pastor evangélico. Em janeiro do ano passado, durante um culto religioso em Santos (SP), ele disse que exercia no governo um papel “mais espiritual do que político”.
Kits de robótica
Sobre os kits de robótica, Godoy afirmou que o MEC não pode esperar que as escolas tenham estrutura básica para enviar os kits. Ele ainda afirmou que os equipamentos não dependem de conectividade ou computadores. “São materiais pedagógicos que levam aos estudantes a oportunidade de ver esse conteúdo. Não posso privar os estudantes. Seria como não mandar material didático porque a escola não tem banheiro”, justificou.
No mês passado, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Walton Alencar Rodrigues determinou que o FNDE suspenda a aquisição dos kits. A decisão do relator se deu no âmbito de uma representação feita pelo senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), após denúncias de supostas irregularidades envolvendo quantias milionárias para a aquisição desses kits.
Na decisão, o ministro lembra que a apuração envolve “indícios de irregularidades na destinação de R$ 26 milhões, pelo Ministério da Educação e pelo FNDE, para aquisição de kits de robótica por municípios de Alagoas, no valor individual de R$ 14 mil, tendo como fonte emendas de Relator do Orçamento da União (RP-9)”.