Sequestros-relâmpago crescem 35% em SP com chegada do Pix

Especialistas apontam plataforma como uma das causas do aumento por tornar crime mais simples. Veja bairros com mais casos

Diversos flagrantes de extorsão via Pix foram gravados por câmeras de segurança no estado REPRODUÇÃO/ AGÊNCIA RECORD

A média mensal de sequestros-relâmpago cresceu 35,40% no estado de São Paulo desde a chegada do Pix — sistema de pagamentos instantâneos do BC (Banco Central) — e atingiu a taxa de 89 crimes do tipo por mês em 2021. Os dados, obtidos e analisados pelo R7 por meio da Lei de Acesso à Informação, constam em boletins de ocorrência registrados na SSP (Secretaria de Segurança Pública) entre os anos de 2020 e 2021.

A plataforma de pagamentos instantâneos anunciada pelo Banco Central passou a funcionar em novembro de 2020 e teve imensa adesão, revolucionando o sistema de pagamentos no Brasil. Até a criação da ferramenta, a média de sequestros-relâmpago era de 66 ocorrência por mês, de acordo com os dados de janeiro a outubro de 2020. Em números absolutos, foram 661 casos nesse período contra 895 nos primeiros dez meses de 2021, já com o Pix em vigor.

Para especialistas ouvidos pelo R7, a chegada de plataforma de pagamentos é a maior causa por trás do aumento do crime, que agora é praticado por quadrilhas especializadas.

“Antigamente se fazia o sequestro-relâmpago levando o sujeito até os caixas eletrônicos. Hoje em dia você não precisa levar no caixa eletrônico, basta você colocar num cativeiro, enquanto usa o celular. O celular virou o caixa eletrônico”, explica Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) e integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

“Estamos começando a ter uma ‘pandemia’ de sequestro-relâmpago em São Paulo que assusta muito porque as pessoas estão se sentindo muito inseguras. O telefone celular e o Pix, que eram coisas para facilitar nossa vida, acabam nos tornando reféns.”

Contas ‘laranjas’

Apesar das facilidades que o celular traz, a maioria dos crimes é praticado por pequenas quadrilhas, conta a desembargadora da Justiça de São Paulo Ivana David. Esses grupos dividem as funções dentro do sequestro, usam contas “laranjas” para distribuir o dinheiro e monitoram vítimas de maior potencial.

“Precisa de inteligência policial para buscar o cerne dessa organização criminosa. Atrás desse indivíduo que vem para a rua armado existe toda uma estrutura e essa estrutura que tem que ser combatida. Tirando essa estrutura, os que estão na rua dificilmente conseguem controlar isso”, explica.

Pelos processos e pedidos de habeas corpus que chegam ao tribunal, a desembargadora relata também ter percebido neste ano o aumento expressivo do sequestro-relâmpago e dos crimes de patrimônio em geral (como furtos e roubos).

“O fim do estado pandêmico trouxe as pessoas, as vítimas, para a rua. Todo mundo tentando retomar sua rotina. E o crime também voltou para a rua. Não houve nenhum combate ao crime, na verdade o crime diminuiu porque não tinha ninguém na rua para ser vítima”, completa.

Além do impacto nas estatísticas, o efeito na novidade foi flagrado em diversos casos em que bandidos foram gravados enquanto ameaçam vítimas pela senha do celular e do aplicativo do banco. Em janeiro desse ano, um idoso de 73 anos foi agredido por assaltantes e obrigado a entrar em um carro antes de ser extorquido.

No mesmo período, dois homens caíram em golpes por aplicativos de relacionamento e morreram ao tentarem fugir de sequestros-relâmpagos. Um mês antes, uma senhora de 75 anos foi raptada enquanto chegava em casa e teve um prejuízo de R$ 50 mil via Pix.

Na capital paulista, região mais afetada do estado, os bairros com o maior número desse crime estão em sua maioria na zona sul e oeste do município. Com 144 casos, o distrito de Rio Pequeno é o líder no período de 2020 a 2021, de acordo com a área de cobertura das delegacias a partir do endereço das ocorrências.

Para evitar golpes do tipo, a primeira recomendação é que os clientes sempre estabeleçam limite de transferência e horário através do Pix. As autoridades também aconselham que motoristas e pedestres não fiquem parados nas ruas com o celular e mostrem vulnerabilidade para sequestradores.

O pesquisador Rafael Alcadipani opina que os bancos deviam investir mais em inovações tecnológicas para evitar os roubos. Entre as principais, ele cita que o georreferenciamento dos aparelhos, permitindo apenas transferências em determinadas localizações, seria uma forma importante de diminuir os crimes.

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) afirma que em caso de roubo os clientes devem notificar imediatamente os provedores para adotar medidas de segurança. Em nota, o grupo também ressaltou que os aplicativos da instituições contam com o “máximo de segurança em todas as suas etapas”.