Conselho de Ética do Senado não funciona há dois anos e meio

Mesmo com flexibilização das medidas sanitárias, conselho continua inativo; Pacheco fala em aguardar avanço da imunização

Última reunião do Conselho de Ética do Senado; ao centro, senador Jayme Campos | Foto: Marcos Oliveira / Agência Senado / Divulgação / CP

Mais de dois anos e meio sem realizar uma sessão, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado acumula 28 requerimentos de abertura de processos disciplinares pendentes de análise. Desde setembro do ano passado, o conselho sequer possui membros, já que a nova composição não foi definida. Mesmo com a Casa funcionando normalmente, inclusive com a não obrigatoriedade do uso de máscara, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ainda não definiu uma data para a reinstalação dos trabalhos da comissão que analisa denúncias contra os próprios parlamentares.

“Estamos ainda nessa retomada dos trabalhos em função da pandemia. Vamos aguardar um pouco o avanço da imunização e vamos fazer essas definições”, disse ao R7 no último dia 24. A última sessão da comissão foi no dia 25 de setembro de 2019, para definir sua composição, meses antes da pandemia de Covid-19. Com o início da urgência de saúde pública, em 2020, o Senado suspendeu os trabalhos das comissões permanentes até o retorno do sistema presencial e uma resolução da Mesa Diretora também interrompeu os trabalhos do conselho.

No fim de 2020, o então presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) afirmou que a retomada dos trabalhos nas comissões permanentes seria definida em 2021. Em fevereiro de 2021, já com Pacheco, foram escolhidos presidentes e vice-presidentes dessas comissões, mas o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar continuou de fora. As comissões passaram a funcionar em um sistema semipresencial, mas não o conselho. Hoje, mesmo com a flexibilização de medidas sanitárias, incluindo a não obrigatoriedade do uso de máscara, a discussão sobre o retorno do conselho é deixada de lado.

O último ex-presidente do conselho, senador Jayme Campos (União Brasil-MT) assumiu a função presencialmente em apenas uma sessão: a que foi instituído líder dos trabalhos. Precisou, no entanto, devolver o cargo ao fim do prazo regulamentar de dois anos, sem que nenhum dos pedidos fosse, de fato, julgado. “Todas as denúncias, representações eu encaminhei para a Advocacia-Geral do Senado e eu cumpri meu papel. Parte delas se encontra nas mãos da Mesa Diretora do Senado Federal. Regimentalmente, eu fiz a minha parte. Mas não sou dono do Senado”, afirmou ao R7.

O senador lembrou, ainda, do ato da Mesa Diretora que suspendeu a realização de sessões presenciais. “Compete ao presidente do Senado responder sobre a volta [do conselho], na medida em que já deveria ter nomeado um novo presidente em outubro, quando se encerrou a minha participação. Feito isso, o presidente, no momento oportuno, vai escolher um outro nome, acredito que de forma democrática, através do colegiado de líderes partidários”, completou Campos.

Durante o período em que foi presidente do conselho, houve um caso que movimentou o Senado, do senador Chico Rodrigues (União Brasil-RR), que foi pego em uma operação da Polícia Federal com R$ 33,1 mil na cueca. Chico, inclusive, era um dos integrantes do conselho.

Na época, em outubro de 2020, Jayme afirmou que pediria ao presidente Alcolumbre o retorno dos trabalhos do conselho para analisar o caso de Chico Rodrigues. No fim, não houve análise do caso, Chico Rodrigues tirou uma licença de 121 dias e retornou posteriormente à casa. O dinheiro, segundo ele, era lícito e seria usado para pagar funcionários.

O próprio senador Davi Alcolumbre poderia ter sido alvo do conselho, caso estivesse funcionando. Em outubro do ano passado, reportagem da revista Veja apontou a existência de “rachadinhas” (esquema ilícito no qual servidores devolvem parte do salário para o parlamentar) no gabinete do senador, o que ele negou veementemente. Uma investigação interna chegou a ser aberta, e informações foram encaminhadas à PGR (Procuradoria-Geral da República). Um pedido de abertura de procedimento disciplinar foi protocolado por um cidadão, mas até hoje aguarda designação de relator.

Dos 28 requerimentos, apenas um foi indeferido — um pedido de procedimento disciplinar feito por Romero Jucá (MDB-RR) contra o senador Telmário Mota (Pros-RR) por difamação e ameaça. Os demais estão pendentes de análise jurídica quanto à admissibilidade ou aguardando a nomeação dos membros para poder tramitar.

A maioria denuncia injúrias e difamações entre os parlamentares. Há, ainda, alegação de quebra de decoro parlamentar por suposto envolvimento em corrupção e por divulgação de informações sigilosas, grande parte protocolada durante à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Pandemia.

Há um requerimento geral contra os membros da CPI da Pandemia para apurar vazamento de dados. É a cúpula da CPI que mais aparece entre os alvos. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) tem contra ele três acusações, sendo uma relacionada à atuação na comissão. Outra alega que o parlamentar fez “rachadinha” ao receber doações de serviço de um assessor durante a campanha eleitoral. Já os senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL) entraram na lista pelas mãos do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

Flávio é autor de outros dois requerimentos. Por outro lado, também é denunciado em dois. Parlamentares da Rede, do PT e do PSol apresentaram um pedido de cassação do mandato do filho do presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), pelo caso das “rachadinhas”, de quando Flávio era deputado estadual pelo Rio de Janeiro.

Ao pedido foi acrescentada a denúncia feita pelo primeiro suplente do senador, Paulo Marinho (PSDB-RJ), que relatou que Flávio teria sido informado com antecedência sobre a operação Furna da Onça, da Polícia Federal, que investiga as denúncias de “rachadinha” na Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro). O senador sempre negou a prática.

O deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) também protocolou um pedido contra Flávio, acusando-o de intervir em investigações do MPRJ (Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro) sobre o mesmo caso.

Recordistas

Além de Randolfe, o ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre possui três representações contra ele. Uma delas, protocolada pelo PTB, denuncia o parlamentar pela demora em pautar a sabatina do agora ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) André Mendonça para discussão na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). O senador também é denunciado por dois cidadãos de cometer prevaricação, improbidade e de suposta prática de “rachadinha”.

O senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) é o recordista de requerimentos. São oito análises pendentes contra o parlamentar, a maioria alegando difamação, calúnia e injúria durante falas do senador em participação de entrevistas e pelas redes sociais. Ao R7, ele disse que o conselho “deve começar imediatamente”. “Estou 100% pronto para o que vier do Conselho de Ética”, disse.

O R7 também acionou as assessorias de imprensa dos senadores Davi Alcolumbre, Chico Rodrigues e Flávio Bolsonaro, mas não houve retorno.